Sindicato do Ódio

Por Gilberto Jasper, para Coletiva.net

Em 1968 meu pai foi eleito vereador em Arroio do Meio, município do Vale do Taquari. Era um período delicado, da ditadura, dualidade Arena x MDB, sem outros partidos, sem liberdade, diálogo ou possibilidade de contestar os governantes.

Pedro Simon, Paulo Brossard e outros líderes da oposição participavam com frequência de reuniões em minha casa. O encontro era quase sempre nos fundos, de luz apaga, voz baixa. Minha missão era sentar no muro dianteiro e observar o tráfego de veículos suspeitos de ligação com as forças de segurança.

Anos mais tarde, as eleições diretas se tornara realidade. Proscritos pela ditadura foram anistiados, novos partidos foram fundados. A democracia foi restabelecida. Desde então, de alguma forma mais efetiva, participo do processo político. Como jornalista de veículo ou assessor de comunicação.

Ao longo deste período, passamos do 'nada pode' para o 'tudo pode', com importância absurda das redes sociais. Ofensas, notícias falsas, crimes imputados injustamente a agente públicos ou a detentores de mandato, injustiças em geral. Esta é a rotina de boa parte do conteúdo veiculado no meio virtual.

"Quem se sentir ofendido... que recorra ao Judiciário!", costumo ouvir. Biografias inatacáveis são destruídas como resultado de decisões judicial que quase sempre morosas que soam injustiça.

A liberdade, pressuposto maior da redemocratização conquistada a duras penas, virou detalhe. É raridade a troca civilizada de ideias ou os diálogos respeitosos em busca de soluções baseadas na convergência.

A disputa pelo voto segue a mesma tendência. A radicalização - de 'direita' e 'esquerda' - é uma afronta da inteligência das pessoas. Parece haver uma contaminação generalizada pelo ódio. Independentemente da escolha que eclodir da urna eletrônica teremos um palco de beligerância sem precedentes no Brasil. O eleito, talvez, seja o presidente do Sindicato do Ódio.

Isto seria duplamente lamentável porque perderemos mais uma década, além de passar um atestado de total incapacidade de conviver em ambiente que não seja de opinião única.

Votar em branco, anular o voto ou votar com ódio é retrocesso, prova inequívoca do retrocesso que tomou conta do nosso país. A democracia, vilipendiada pela ditadura, merece mais respeito, inteligência e preservação. De todos nós.

Gilberto Jasper é jornalista e consultor em Comunicação.

 

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