Demissões na ESPN e a crise de identidade no jornalismo esportivo - Entre pranchetas e galhofas

Por Rodrigo Ramos, para Coletiva.net

Muita gente foi tomada de surpresa pela dispensa de mais de dez profissionais da ESPN Brasil. Surpreendeu ainda mais por afetar pessoas de diferentes gerações e com diferentes vínculos com a emissora. Houve dispensa de chefes, colaboradores regulares e eventuais.

Exceção ao comentarista Rafael Oliveira, todos com mais 40 anos. A grande ligação entre os profissionais 'de microfone' demitidos era a capacidade em ser óbvios. Não no sentido de falta de repertório ou pouco conhecimento do que estavam falando. Mas certos comportamentos eram esperados deles. Tais quais fossem mais personagens do que analistas ou comunicadores de fato.

Salvo raros momentos em que Juca Kfouri parecia ter acordado nos anos 1990 ou quando Arnaldo Ribeiro sentia vontade de virar meme, eram previsíveis. Por mais que profissionais empregados ou de grande renome em disponibilidade fiquem tateando sobre o que aconteceu com o jornalismo esportivo e o que o público realmente quer deles, o problema é que essa programação esportiva da televisão brasileira parece um grande replay com personagens diferentes.

Pouquíssimos profissionais fogem do seu comum, da sua área de conforto e dizem coisas que possam desagradar à linha editorial de seus veículos. Como exemplos positivos, cito Tim Vickery, Flávio Gomes, Ubirantan Leal, Ariel Palacios e Fábio Piperno. Todos por coincidência veem o futebol em camadas mais grossas que o típico 'jornalista futebolístico', inclusive por experiência em outros esportes ou por transitarem em outras editorias.

Alguns, ainda insistem em achar que o problema reside nos temas abordados nas discussões do futebol, ou que os comentaristas de veia quase humorística tirem espaço dos analistas táticos que transformam os esportes em economês. Ambos os estilos estão batidos e você adivinha o que muitos profissionais vão falar. Não é questão de forma, é de conteúdo e de possibilidade de existir fator surpresa ao assisti-los.

Pensando na televisão por assinatura apenas, temos quatro canais base: SporTV, ESPN, Fox Sports e BandSports, com programação ao vivo, basicamente entre 9h às 24h. Suas atrações são muito parecidas entre si. O telespectador menos atento não saberia distinguir um veículo do outro se lhe for negada a oportunidade de ver o logo na tela.

Apesar de ser um dos métodos mais baratos de produção de conteúdo para emissoras voltadas ao esporte essa 'mesa-redondização', ainda é custosa. E como aprendi com meu antigo coordenador de esportes na Rádio Guaíba, Rodrigo Koch, hoje professor universitário, o menos interessante dos eventos ao vivo é melhor, do ponto de vista do público consumidor, do que o mais bem produzido dos programas.

Assim vejo o caminho para as TV's pagas. Ao vivo ou reprises do dia anterior, para quem por questões de horário e rotina não pode ver certo jogo. Não é um cenário otimista para os comunicadores. Porém, é o remédio amargo para salvar os canais por assinatura.

Rodrigo Ramos é comunicador e escritor, com mais de uma década de atuação no rádio esportivo.

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