Direito de Resposta: o cidadão contra a hegemonia da imprensa

Por Marcelo Billes O jornal Zero Hora publicou no domingo passado, dia 22, um editorial com o título ‘Direito Desvirtuado’, no qual critica a …

Por Marcelo Billes
O jornal Zero Hora publicou no domingo passado, dia 22, um editorial com o título ?Direito Desvirtuado?, no qual critica a nova Lei do Direito de Resposta, argumentando que ela "já foi utilizada por um político para constranger a imprensa na tentativa de evitar a divulgação de uma notícia sobre seu envolvimento na Operação Lava-Jato".
Aberto à opinião dos leitores, o editorial teve, em minha opinião, impressionantes 70% de manifestações favoráveis, o que atesta a influência que as manifestações da imprensa provocam no público.
Em um mundo ideal, não haveria a necessidade de direito de resposta: a imprensa teria também um comportamento ideal, dentro do que preconiza a ética jornalística. Traria os fatos de forma totalmente isenta, precavendo-se de emitir sua própria opinião e permitindo assim ao leitor formar sua opinião com base apenas nos fatos.
Não é o que verificamos na imprensa brasileira. Mesmo que uma opinião não seja manifesta de modo explícito, ela transparece em recursos de edição como escolha de pautas, redação, seleção de fotos, na condução da reportagem como um todo.
Cabe lembrar, para ilustrar esta prática, o famoso e recente caso do ?podemos tirar, se achar melhor?. Com grande repercussão em veículos alternativos e ignorado pela grande imprensa, o caso refere-se a uma reportagem da Agência Reuters, datada de 23 de março do corrente ano, na qual o ex-gerente de Serviços da Petrobras Pedro Barusco afirma ter começado a receber propinas em 1997, ainda sob o governo FHC. Entre o sexto e o sétimo parágrafos, logo após a citação de Barusco, aparecia entre parênteses a observação "Podemos tirar, se achar melhor". Ou seja, o redator da matéria expõe de forma clara a liberdade do editor de manipular a informação a seu bel prazer.
Além da ilustração, a observação cotidiana mostra uma imprensa manipuladora, que abusa de sua capacidade de influência para condenar ou isentar cidadãos de acordo com seus próprios interesses, sejam eles comerciais, políticos ou empresariais.
O abuso da palavra ?suposto? no vocabulário dos jornalistas é mais um indicativo claro dos rumos distorcidos adotados pela imprensa, afastando-se da ética e da isenção. Ao classificar como ?suposto? culpado a uma pessoa, a imprensa salvaguarda-se juridicamente, pois tecnicamente não está condenando a pessoa que cita. Na prática, a condenação se verifica no tom geral do texto.
Abro um parágrafo para definir a palavra Hegemonia, que de acordo com o dicionário Aurélio, é sinônimo de Supremacia, a saber: 1 Primazia, superioridade (com relação aos da mesma espécie). 2 Poder ou autoridade suprema.
Como se percebe acima, no que se refere ao tema imprensa, estamos muito distantes de um mundo ideal. A observação cotidiana mostra uma imprensa brasileira que não pratica a isenção; que, pelo contrário, faz amplo uso de seus poderes de formação de opinião para praticar, ou buscar praticar, uma hegemonia da informação, que vai contra todos os princípios da prática democrática e, além disto, ofende aos direitos do cidadão ao qual se refere.
Pela via democrática, pouco há a fazer contra isto, posto que a imprensa baseia-se em concessões questionáveis mas legais, e seu poder hegemônico forma um sólido escudo contra qualquer forma de alterar esta situação. Qualquer reação política contra este fato revela-se quixotesca, levando seu autor à execração pública, sem qualquer isenção.
Por outro lado, no aspecto jurídico há ferramentas através das quais o cidadão pode se defender, e a mais importante delas é exatamente a Lei da Liberdade de Imprensa, que permite-lhe a defesa no próprio meio em que foi acusado.
Assim, se não há ética, há que existir meios de defesa, na mesma medida da acusação, o que é bem respondido pela lei que a imprensa critica, à maneira da raposa que pretende tomar conta do galinheiro.
Em suma, em um mundo imperfeito, onde a imprensa pratica a hegemonia da informação, é necessário que tenhamos uma Lei do Direito de Resposta ampla, rápida e de fácil acesso. Pretender questionar esta lei é pretender a utopia de um mundo perfeito.
Paradoxalmente, a hegemonia praticada pela imprensa é a causa maior que solapa seus próprios alicerces. O crescimento dos meios alternativos de informação, com disseminação do acesso à internet e desenvolvimento de meios alternativos como twitter, periscope, blogs, TV on demand, passa a ser o principal meio de se informar para um contingente cada vez maior de pessoas. A percepção da distorção da informação pela grande imprensa descredibiliza-a junto a este público, que não vê mais razão para comprar jornais e revistas, assistir noticiários em TV, buscar informação no rádio. Cabe citar como exemplo a recente atuação de organizações informais como a Imprensa Ninja, durante os protestos ocorridos no ano passado, que, ao mostrar o que a imprensa oficial decidiu ocultar, escancarou sua falta de isenção. O resultado é uma queda constante de níveis de audiência, circulação e vendas, que se refletem em perda de poder econômico.
Não seria a primeira vez que uma grande instituição é soterrada pela tecnologia. Empresas de porte gigante já ruíram. A imprensa, como a conhecemos hoje, parece estar na fila, se mantiver a rota em que se movimenta.
O mundo perfeito pode começar com a quebra da hegemonia da imprensa, provocado pela quebra da própria imprensa. E, quem sabe, este pode ser um mundo sem a necessidade da Lei de Direito de Resposta.
Marcelo Billes é publicitário.

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