Vai, malandro!

Por Alexandre Assumpção para Coletiva.net

"Não vejo ninguém feliz em agências". Li esse título infeliz, dito por Alexandre Gama em uma entrevista para a MM, que diz ter preferido ver a Neogama encerrar suas atividades do que perder sua identidade criativa. Motivos e razões à parte, fiquei um pouco triste, pois a Neogama foi uma grande agência muito premiada pelo seu posicionamento criativo. Por outro lado, li e reli o texto pensando: será mesmo? Concordei com muitos pontos da entrevista, como, por exemplo, "Não gosto de jogos corporativos, nem da dinâmica da vida executiva. E não acredito na qualidade de governança da maioria das agências, que se tornaram corporações com múltiplos níveis hierárquicos e estrutura inchada, lenta e burocrática." Concordo. Tenho pavor disso.

Agências se tornaram excessivamente burocráticas acreditando que tais processos vão trazer mais lucro. Depois ele diz: "Vamos ser claros: não vejo ninguém feliz dentro das agências, principalmente nesse modelo de holding e grupos. As pessoas estão saindo em peso dessas estruturas. Poder-se-ia dizer que os grupos estão renovando, mas a verdade é que as lideranças de saída é que estão renovando sua visão de trabalho e não querendo mais operar de dentro de um modelo tão engessado e financeiramente restritivo." Concordo em parte. Acho que há uma revisão correta e natural de profissionais que "batem no teto" de seus mercados e suas carreiras. Eu mesmo já bati a cabeça nesse teto algumas vezes.

Mas é precisamente aí, na frase "não vejo ninguém feliz dentro das agências" que não concordo, por dois motivos:

1 - O mercado precisava amadurecer, como um todo. O nosso negócio é um negócio como qualquer outro negócio. Não vejo engenheiros dando pulos de felicidade, advogados virando estrelinha ao sair do Fórum, contadores jogando sinuca e tomando cerveja no intervalo de almoço dentro do escritório de contabilidade, bancários fazendo selfies com clientes, nem médicos se divertindo nas redes sociais enquanto tocam suas profissões. Pelo contrário, vejo trabalhadores onde a palavra "diversão" nem sequer é citada nos assuntos ligados a trabalho. Temos que dar lucro para a empresa, para o cliente, para a sociedade. Temos que dar lucro, trazer resultado.

"Se não vende, não é criativo" é uma frase antiga que falo há anos. Somos um mercado maduro, adulto e temos responsabilidades de adultos. Como Diretor de Criação, embora tenha ganhado mais de duas centenas de prêmios, muitos internacionais, nunca coloquei a ideia antes do resultado, e sempre fico abismado com homens adultos fazendo beicinho ou carinha de bravo, ou "infelizes", usando a expressão do Alexandre Gama, quando a ideia não é aprovada, ou modificada pelo cliente (aquele cara que trabalha duro 24 horas por dia há 30 anos no seu negócio) e não sabe reconhecer uma ideia do c* que o criativo fez. Daí, que realmente só posso ver no texto do Alex, um homem adulto de 50 e poucos anos meio imaturo, reclamando que não está "feliz". Felicidade no trabalho foi um luxo quase exclusivo de nossa profissão.

2 - Mas sim, eu vejo pessoas felizes e entusiasmadas em agências. Vejo pessoas assim todos os dias, dentro e fora do departamento de Criação. Entusiasmadas por terem criado ou encontrado a solução de um projeto ou um problema; felizes, por terem atingido um objetivo ou uma meta financeira ou por terem traçado uma estratégia inusitada para web, ou mesmo por uma ideia estratégica dentro de um contexto de campanha. Daí, é o ponto de inflexão do assunto todo.

A pessoa passa pelo anúncio no tablet, dá uma olhada na foto, lê o título e não entende. Ela vai parar e decifrar o anúncio? Não vai. Vai ficar refletindo sobre a ideia do spot? Não vai. A garotada assiste a televisão? Não assiste. Tenho dois filhos de 15 e 20 anos. Não veem TV nem como distração. Assistem a coisas no YouTube e, no meio tempo, assistem a um filme, a um comercial, falam no Whatsapp com quatro ou cinco amigos, checam o Facebook, tomam um suco e dão alguns likes aleatórios. Se não forem seduzidos em três segundos, passam para o próximo vídeo da Anitta ou sei lá o quê. A propaganda morreu? Não, apenas mudou do nosso ponto de vista para o ponto de vista do consumidor, que se distrai com uma infinidade de coisas mais interessantes do que a sua ideia.

Estamos no meio de uma revolução, que não é esta adoção frenética de novas ferramentas e sim, a adoção de novos hábitos, inclusive de consumo de comunicação. É preciso criar dentro de um contexto onde haja conexão e identificação natural e com as pessoas. Não vejo como um mau momento, vejo um momento de desaprender e reaprender e isso é felicidade SIM. Vejo maturidade, na verdade. A publicidade é adulta em um mundo que lhe cobra uma postura e uma visão adulta para existir. Como na vida, alguns vão espernear fazer bico, cara feia, bufar, bater pé. Como na vida, não vai adiantar nada e a comunicação, a publicidade, assim como a literatura, o cinema e a música comerciais, que já se reciclaram, vão seguir em movimento. Como diz o Nizan, em uma crise, alguns choram. Outros vendem lenços. Desaprender. Reaprender. Reciclar experiências. Vai, Malandro!

Alexandre Assumpção é diretor de Criação da agência Moove.

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