Imortalidade técnica e reforma da previdência

Por Flavio Paiva

Diversos cientistas, crentes e estudiosos consideram a morte como um problema técnico. Não morremos de morte, mas de problemas como ataque cardíaco, câncer, etc. Na medida em que possamos resolver estes "pequenos" problemas técnicos, poderemos estar na direção da imortalidade.

Recentemente, o Google nomeou Bill Maris, um verdadeiro crente na imortalidade, para presidir seu fundo de investimento Google Ventures. Em 2015, Marris afirma: "Se vocês me perguntarem hoje se é possível viver até os 500 anos, a resposta é sim". O Google Ventures está investindo 36% de sua carteira de 2 bilhões de dólares em startups na área de biociência, incluindo projetos de prorrogação da vida. O Google quer "resolver o problema da morte".

Apesar de parecer exótico e quase fora da realidade, a questão não é. Com os progressos da biotecnologia, da neurociência, com nanorrobôs passeando por seu corpo (e podendo identificar de que mal você está sofrendo ou que pode vir a sofrer), as coisas começam a se alinhar e fazer sentido.

Vamos assumir esta hipótese. Até porque não é só o Google que está empenhado nesta cruzada, são inúmeras outras empresas e mesmo forças governamentais. Ela parece inicialmente boa, mas traz alguns problemas. Entra aí o problema da reforma da previdência brasileira, por exemplo.

Com pessoas que não vão morrer ou vão morrer com 450 anos, como ficam a sua aposentadoria? A sua reinvenção profissional ao longo da vida, visto que a evolução tecnológica se dá em uma velocidade impressionante, o indivíduo teria que aprender e aprender e desempenhar novas e diferentes atividades, pois muita coisa muda em 450 anos, economicamente falando.

E nós, no Brasil, estamos discutindo se a reforma da previdência é necessária? Não é mais possível. Porque não são delirantes alucinados que estão trazendo o tema da imortalidade ou prorrogação da vida à tona. São megaempresas, cientistas, estudiosos. E, quanto mais tivermos indivíduos com mais idade, como será? Eles seguirão trabalhando, com condições físicas e mentais, dadas pelos progressos da ciência? Ou serão (aí que entra o cenário do caos) sustentados por trabalhadores da ativa?

Sim, porque um grande engano é o trabalhador pensar que ele vai contribuindo com o INSS ao longo da vida e o governo vai depositando este valor em uma conta individual, sua, da qual será sacado o dinheiro quando ele se aposentar. Não. O que ocorre é que esta conta com o depósito das contribuições não existe e quem sustenta os aposentados são os trabalhadores na ativa. A população brasileira está sabidamente em processo de envelhecimento. Se não dermos condições para as pessoas mais velhas de atingirem 450 ou 750 anos ou ainda a imortalidade, o caos já está instalado. O déficit é crescente e a bomba está pronta a explodir.

Então, vejamos: são duas questões (a da imortalidade e da reforma da previdência no Brasil) que se cruzam imediatamente. Será mesmo possível prorrogar a vida de seres humanos, com qualidade? Ou ainda atingir a imortalidade? Isto ocorrendo, como serão tratadas as questões ordinárias, como a da reforma da previdência?

Importante pensar, refletir, pesquisar e não descartar nenhuma hipótese. Atingiremos a imortalidade? Quem sabe? Isto não se daria em 10, 20 anos. Mas em 200. Porém, se quisermos ter um país equilibrado, não descartemos as hipóteses por acharmos que são coisas de lunáticos. Áreas como biotecnologia tem progredido de forma espantosa e a cura de doenças que eram totalmente fatais há poucas décadas é hoje uma realidade.

Façamos algo que não fizemos até hoje: pensemos e planejemos. Consideremos hipóteses e cenários.

Você deve estar se perguntando com quantos anos acho que morrerei (ou não). Não sei, pois mesmo com todas as notícias que surgem, é prematuro dizer, além de eu não ser um cientista. Mas se eu tiver minha vida prorrogada ou expandida para sempre, sei que quero viver em um país e um mundo melhor, que tenham pensado antes, considerado hipóteses. Vamos aguardar, estudar, observar e ver.

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