A guarda compartilhada do cão Quincas

Por Márcia Martins

No próximo final de semana, encerra-se um longo período superior a 15 dias de guarda compartilhada do cachorro Quincas Fernando Martins no apartamento da minha filha Gabriela e Laura, sua namorada, e, por consequência, minha nora. O vira-lata ou da raça SRD (Sem Raça Definida), que adotamos em 4 de fevereiro de 2018, após um luto sofrido pela morte prematura do cão de nome budista Dalai, o cachorro mais carinhoso que já conheci (e sou bem experiente em caninos), costuma intercalar uma semana na casa de cada uma. Desde que Gabriela decidiu viver definitivamente com a sua Laura, foi uma decisão pensada e madura desta que vos escreve e de sua filha amada que o Quincas teria seus dias amigavelmente divididos entre nós duas.

A guarda compartilhada não segue critérios rígidos, não tem cobranças, não tem regras. Não é resultado de uma separação judicial não amigável. Foi um acerto familiar e cheio de amor. Representa uma alternativa para que nós duas (agora nós três porque o vira-lata já se apaixonou também pela Laura) possamos experimentar as delícias de se ter um cão em casa. Assim, o cusco de pelagem marrom clara, de patas compridas, orelhas grandes e fuço rosa, foi agraciado com duas mães e uma avó, duas casas ou apartamentos, brinquedos diversos nas duas residências, duas praças diferentes para brincar e correr com os amiguinhos e ser paparicado por três mulheres que adoram cachorros.

Os dias da guarda costumam adequar-se aos compromissos de nós três, tudo a fim de que o cachorro não fique muito tempo sozinho dentro dos apartamentos. É claro que não deixamos de estudar, ir ao cinema, sair com as amigas e atender as nossas agendas em função do Quincas. Mas dentro do possível, até porque ele enfrentou uma fase de transformações (a mudança da Gabriela para outro lugar e a minha mudança para um apartamento menor e agora sem a presença da mãe do cusco), evitamos que ele fique muitas horas trancado sem as nossas companhias. Mas, normalmente, a tal guarda dificilmente na casa de cada uma não ultrapassa uma semana.

Entretanto, em decorrência de uma sucessão de agendas que iriam me exigir tempo demasiado fora de casa - aniversário do Sindicato dos Jornalistas, eleição do Conselho Municipal da Mulher e um trabalho de free jornalístico que peguei nesta semana - foi preciso que o Quincas ficasse um tempo mais longo que o costume na casa da Gabriela e Laura. Todos os dias ou noites, quando converso com minha filha, ou pelo whats ou pelo telefone, além de procurar saber da rotina das gurias (Gabriela e Laura), faço mil perguntas sobre as travessuras do cão. Quero saber se ele foi passear, se fez novos amiguinhos, se comeu direito, se já foi dormir, se enterrou seus ossos de brinquedos embaixo das cobertas e mais e mais e mais.

Ao olhar algumas fotos que elas me enviam com o fuço rosa do cão completamente acomodado na perna de uma delas, com uma das suas patas enormes estendidas no meio das pernas das gurias no sofá ou com ele dormindo sossegado no colo da minha nora, fico com medo que ele não queira mais voltar. Ou de quando ele vai passear, todo faceiro, pelas ruas do Jardim Botânico com a Laura. E meu coração - juro por tudo que é mais sagrado, pelo sangue de Jesus, por São Francisquinho, pelas barbas do profeta - começa a despedaçar e sangrar de tanta dor. Fico pensando que ele vai estranhar os meus hábitos quando voltar, que vai ficar olhando fixo para a porta achando que elas vão buscá-lo e que mostrará no seu olhar uma tristeza deprimente.

Preciso confessar mais uma vez para vocês. É muito animador não ter que limpar as necessidades do cão. É muito bom não precisar passar detergente no chão no espaço na área de serviço onde ele faz xixi. É delicioso poder dormir até tarde nos finais de semana e não ter o compromisso de levar o cachorro para a praça a fim de gastar sua energia. É tranquilizador sair sem as roupas claras coloridas de seus pelos grudados nos tecidos. Mas nada, absolutamente nada, pode ser comparado aos pulos que Quincas dá quando eu volto da rua, a felicidade que ele demonstra quando ouve o barulho da ração sendo despejado no seu pote de comida, a alegria que ele mostra quando lhe afago a cabeça e ao olhar de contentamento quando vê que estou indo em direção à sua corrente e coleira para o momento do passeio.

Autor
Márcia Fernanda Peçanha Martins é jornalista, formada pela Escola de Comunicação, Artes e Design (Famecos) da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), militante de movimentos sociais e feminista. Trabalhou no Jornal do Comércio, onde iniciou sua carreira profissional, e teve passagens por Zero Hora, Correio do Povo, na reportagem das editorias de Economia e Geral, e em assessorias de Comunicação Social empresariais e governamentais. Escritora, com poesias publicadas em diversas antologias, ex-diretora do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Rio Grande do Sul (Sindjors) e presidenta do Conselho Municipal dos Direitos da Mulher de Porto Alegre (COMDIM/POA) na gestão 2019/2021. E-mail para contato: [email protected]

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