As lições da greve que 'PARALIZOU' a inteligência de muitos

Estamos no meio da tal greve dos caminhoneiros, que completa, nesta quarta-feira exatos dez dias e poderá se alongar mais se até o momento da publicação desta coluna nada for alterado na negociação entre as partes. Não vou aqui entrar no mérito da greve porque como trabalhadora devo apoiar todo movimento de paralisação (alô, alô, a grafia correta é esta, não com z), mesmo que ele tenha um viés escondido de mobilização empresarial. Nem vou falar da amabilidade e gentileza das autoridades policiais com os grevistas, piquetes e estradas interrompidas e fazer qualquer tipo de relação com o tratamento recebido por professores (as) bancários (as) e demais categorias quando optam pela greve.

O que mais me chamou a atenção nesta greve foram três pontos específicos. O assassinato definitivo da Língua Portuguesa. Principalmente por aqueles que se dizem letrados e abarrotados de diplomas nas paredes (coisa mais cafona). A falta de determinados produtos e uma histeria da população com recursos financeiros disponíveis para uma corrida aos supermercados a fim de fazer um estoque de alimentos não perecíveis. E uma triste e irremediável constatação: somos totalmente dependentes de qualquer tipo de transporte, seja público ou privado.

No facebook o que mais se viu foi a morte da anciã Língua Portuguesa. Vejam bem: não defendo e isto não é por motivos particulares, que pessoas, objetos, histórias e crenças sejam defenestrados depois de uma certa idade, vivência, sabedoria ou experiência. Então, sou totalmente contra o assassinato da nossa língua. Por favor, não escrevam PARALIZAÇÃO. É feio. Bobo. Uma burrice. Um atestado de ignorância. Para explicar brevemente: verbos como paralisar e improvisar, por exemplo, possuem s porque os substantivos que os originaram também o possuem.

Mas ter dúvida é normal. Afinal, ninguém é o dono da verdade absoluta. Algumas palavras são muito traiçoeiras. E a Língua Portuguesa, já escreveu Olavo Bilac, desde a sua época (1865-1918), sempre foi inculta e bela. Portanto, se tiver um pingo de incerteza, pergunte ao colega do lado. Consulte o dicionário. Ou faça bom uso do Tio Google. E fico por aqui para não me estressar com as formas criativas que o povo decidiu grafar os motoristas de caminhão. Minha gente teve cada palavra esquisita. Mas nada mal se eu contar que um ministro do golpista Temer conjugou o verbo "sejer", numa entrevista sobre o assunto. Juro que ouvi.

E a corrida da classe média alta (ainda existe esta estratificação social?), já no meio da semana passada, aos supermercados com medo de que faltasse seus itens de consumo mais supérfluos. Que gente preocupada apenas com o seu umbigo! Assustada com tanta notícia de prateleira vazia, segui rumo ao pequeno supermercado do bairro no sábado à tarde, para umas comprinhas básicas. Em primeiro lugar, porque meu saldo bancário nem mais vermelho estava, e também porque não disponho de espaço suficiente no apartamento para fazer grandes estoques. Para meu espanto, não senti falta de nada e as prateleiras estavam repletas de mercadorias.

Agora, preciso concordar que é uma situação desagradável a nossa total dependência do transporte público ou privado. Quem tem carro, teve problemas para abastecer. Quem não tem (o meu caso) ficou rezando para que a lotação não passasse mega lotada e me deixasse com cara de paisagem quando eu levantasse a mão solicitando sua parada. Táxi eu já não uso há muito tempo. E os aplicativos nem respondiam aos chamados, de tanta procura. O jeito foi fazer a maior parte dos trajetos possíveis na caminhada, o que significou economia e um maneira obrigatória de apostar no modo de vida saudável.

Autor
Márcia Fernanda Peçanha Martins é jornalista, formada pela Escola de Comunicação, Artes e Design (Famecos) da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), militante de movimentos sociais e feminista. Trabalhou no Jornal do Comércio, onde iniciou sua carreira profissional, e teve passagens por Zero Hora, Correio do Povo, na reportagem das editorias de Economia e Geral, e em assessorias de Comunicação Social empresariais e governamentais. Escritora, com poesias publicadas em diversas antologias, ex-diretora do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Rio Grande do Sul (Sindjors) e presidenta do Conselho Municipal dos Direitos da Mulher de Porto Alegre (COMDIM/POA) na gestão 2019/2021. E-mail para contato: [email protected]

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