O corpo é da mulher e de mais ninguém

Nos últimos dias, alguns debates virtuais e reais mais calorosos transitaram em torno de violências cometidas contra as mulheres. Sim, em pleno setembro de …

Nos últimos dias, alguns debates virtuais e reais mais calorosos transitaram em torno de violências cometidas contra as mulheres. Sim, em pleno setembro de 2017, ainda precisamos unir as nossas vozes em todos os cantos deste imenso Brasil para reafirmar que nosso corpo é só nosso e que qualquer decisão sobre ele pertence unicamente a nós mulheres. Sim, nestes dias iniciais de setembro de 2017, mais do que nunca, necessitamos berrar para sermos ouvidas que ninguém tem o direito de forçar qualquer tipo de abordagem sexual sem o nosso consentimento, porque isto é estupro, e para quem não sabe, estupro é crime. Enfim, o corpo é nosso e quem tem o poder decisório sobre ele somos nós mulheres.

E não existe nenhum segredo e mistério para definir e classificar a violência contra a mulher. Toda e qualquer mulher, independente de etnia, classe social e capacidade intelectual, tem o direito a fazer suas escolhas e suas permissões. Logo, todo e qualquer ato, sexual ou não, realizado no corpo da mulher, sem a sua a aquiescência, trata-se de violência contra a mulher, nas suas mais diversas e perversas esferas.

Ninguém pode usufruir do que é nosso sem que receba a devida autorização para isso. Ninguém pode beijar nossos lábios sem que receba a permissão e o aval para encostar na nossa boca. Ninguém pode passar a mão na nossa bunda sem que lhe seja dado assentimento para tal. Ninguém deve se roçar no nosso corpo, não só no transporte público, como em qualquer lugar, seja público ou privado, sem que lhe seja oferecida essa opção. Ninguém faz sexo com uma mulher sem que essa tenha concordado. Ninguém ejacula sobre o corpo da mulher sem que ela tenha tenha dado licença. Ninguém enfia os dedos no órgão genital da mulher sem que ela tenha manifestado essa vontade.

Se qualquer uma das ações descritas acima for desrespeitada, vamos lá mulherada. Precisamos cada dia mais denunciar a violência. Nada de calar, omitir ou minimizar a agressão. É hora de botar a boca no trombone. Nada de mentir que caiu da escada, que tinha uma porta no meio do caminho para disfarçar que foi empurrada ou apanhou do companheiro. Preste uma queixa em alguma Delegacia Especial para Mulheres e não se iniba com as desconfianças que os olhares preconceituosos podem sugerir. Nada de aceitar calmamente, e até com certo constrangimento em função do que os outros passageiros irão pensar, que um corpo estranho chegue muito perto do seu no ônibus. Aperte a campainha. Peça para o ônibus parar. Faça o maior escândalo.

Chega de macho escroto pensando que pode tudo com qualquer mulher, inclusive com aquela que se diz sua companheira. Chega de bad boy desfilando sua arrogância e prepotência nos bares e lançando olhares que desnudam qualquer mulher e, por isso, pensam que a inferiorizam. Chega de sujeitos nojentos, escondidos sobre uma suposta perturbação mental, perambular pelos ônibus de todas as cidades do País se achando no direito de se mastubar encostando no ombro da mulher, de fazer movimentos frenéticos roçando o corpo de uma mulher quando o ônibus tá lotado e de ejacular após uma destas situações. Chega de motorista babaca de aplicativo se aproveitar da fraqueza de uma mulher sozinha e estuprá-la dentro do seu carro. E, principalmente, chega de cantor/compositor/ator, enfim, figura pública, para o seu grande público, posar de defensor dos direitos iguais entre os sexos e bradar um discurso politicamente correto, e dentro de casa utilizar outro tipo de prática.

Para os que ainda não sabem ou fingem desconhecer, porque isto lhe é mais conveniente, nós mulheres precisamos estar alertas, atentas, propositivas e sempre dispostas a denunciar e registrar queixas. Porque o corpo é da mulher e de mais ninguém.

 

Autor
Márcia Fernanda Peçanha Martins é jornalista, formada pela Escola de Comunicação, Artes e Design (Famecos) da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), militante de movimentos sociais e feminista. Trabalhou no Jornal do Comércio, onde iniciou sua carreira profissional, e teve passagens por Zero Hora, Correio do Povo, na reportagem das editorias de Economia e Geral, e em assessorias de Comunicação Social empresariais e governamentais. Escritora, com poesias publicadas em diversas antologias, ex-diretora do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Rio Grande do Sul (Sindjors) e presidenta do Conselho Municipal dos Direitos da Mulher de Porto Alegre (COMDIM/POA) na gestão 2019/2021. E-mail para contato: [email protected]

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