Praga televisiva
Por Flávio Dutra
O "este especialista" virou figurinha carimbada nos principais telejornais, verdadeira praga televisiva, embora batam ponto também nas rádios e jornais. Não é novo o expediente das editorias de apelar para um expert a fim de dar embasamento e credibilidade à determinada matéria, mais ainda se o tema tratado é de natureza técnica. O que mudou foi a intensidade com que o "este especialista" passou a ser acionado agora. Economia e finanças, educação, cultura, segurança pública, política internacional, logística e infraestrutura, sexo dos anjos, para todos os temas sempre existe um especialista de plantão, pronto para despejar suas verdades sobre nós.
Especialmente na Rede Globo, que está em guerra aberta contra o governo Bolsonaro, o "este especialista" aparece em uma matéria sim e em outra também quando se trata de questionar alguma política governamental. No caso, o "este especialista" acaba fazendo o papel de laranja do editorial da Globo. Não acredito que a maioria deles se preste conscientemente a esse papel, mas é assim que funciona. Penso mesmo que o governo Bolsonaro tem se mostrado tão errático, tão confuso, tão despreparado que nem precisaria do "este especialista" para desqualificar o que vem sendo anunciado como propostas de governo.
Recrutados na academia ou nas ONGs, o "este especialista", acostumado a longas dissertações, acaba vítima das edições nos telejornais, que reservam poucos segundos - preciosos segundos televisivos - para aquela solução que vai se contrapor à pauta oficial origem da reportagem. E o resultado é um festival de obviedades e de soluções inviáveis, pois os doutos senhores estão descompromissados com a realidade. Entre o pensar da academia e o fazer da vida real vai uma enorme distância, que os vaidosos opiniáticos não levam em conta.
Durante o período eleitoral, vários deles - cientistas políticos, sociólogos e afins - circularam nos espaços da mídia, tentando explicar o comportamento do eleitor com teses que não sobreviveram à abertura das urnas. O pior é quando passam a dar opiniões sobre coisas mais concretas, obras públicas por exemplo. O "este especialista" consultado sempre tem a solução mais fabulosa e arrojada para os problemas, não importando se existem recursos e viabilidade para a execução do faraônico projeto. Mas a ideia proposta passa a ser definitiva, inquestionável e ai de quem ouse pensar diferente. O nome desta postura chama-se desonestidade intelectual, pecado dos sectários e donos da verdade.
A responsabilidade primeira sobre esse processo, vale reprisar, não é dos tais consultores, mas de quem os contrata e aciona. A mídia parece envergonhada de assumir determinadas posições e busca respaldo na opinião do "este especialista" para reforçar o que, na verdade, pretende passar. Em outros casos, procura dar um verniz erudito a determinados temas, de forma a valorizá-los. E o que constatamos, na maioria das vezes, repito, é um festival de obviedades, o primado do achismo, nivelando-se aos piores debates esportivos. Nestes, pelo menos, permite-se o contraditório.