Que venham logo as invernidades deste 2019 (*)

Por Márcia Martins

Não vou escrever sobre política na coluna desta semana. Juro por tudo que é mais sagrado. Nem vou dedicar algumas linhas, ainda que merecidas, à sobrevida que o The Intercept Brasil (TIB) e o colega de profissão Glenn Greenwald propiciaram ao jornalismo brasileiro, que respirava, há algum tempo, com a ajuda de aparelhos. Juro por São Francisco, que é um dos santos da Igreja Católica, que eu respeito. Resolvi ignorar todos os sinais do mundo externo e não falar sobre a necessidade urgente e atual de se debater o feminismo. Juro pelo sangue de Jesus que tem poder. E nem de longe vou me arriscar a comentar a gritante diferença de posturas e comportamentos entre as meninas e os meninos da seleção brasileira de futebol. Ainda que Marta e suas colegas de time sejam mais do que especiais. Juro que não farei isto porque Deus é Pai, não é padrasto.

Vou fugir de temas mais ásperos. Nada de política, Bolsonaro (eca), #VazaJato (#MoroMentiu), machismo e feminismo (#Neymar Júnior, #Marta).  Nem polêmicos. Sem futebol. Nem Grêmio (#FicaÉverton) e Internacional. Evitar a dureza da realidade (desigualdade social, injustiças, sorteios de boletos a pagar). Fingir que não vejo o crescimento geométrico da população de rua em Porto Alegre e da total falta de políticas públicas para atenuar este indicador. Cegar os olhos para as manchetes enviesadas dos jornais diários, com uma parcialidade que serviria de tese de mestrado para a disciplina de jornalismo comparado (ainda existe tal matéria?). Ignorar que no instante em que escrevo a coluna alguma mulher está sendo morta e engrossando os números preocupantes de feminicídio.

Por favor, respeitem a minha intenção de não entrar em temas polêmicos, controversos, de gosto duvidoso, de péssima ideia e do total descomprometimento com a realidade de 2019, em que o politicamente correto tem sido o principal protagonista de todas as histórias. Não! Não! E, pela última vez, não! Já disse que não devo, não posso, é perda de tempo, comentar a campanha (sic) da Prefeitura de Porto Alegre com o card publicado na página do face do Executivo Municipal no domingo, 23 de junho, com a capa de um disco do grupo É o Tchan, para anunciar as vagas de emprego do Sine da capital. Gente. Assim, sem comentários mesmo. Tudo que se escrever sobre este equívoco será pouco.

Então, para não tratar destes assuntos e, de quebra, saudar a chegada do Inverno, estação que eu amo (ok, nem tudo é unanimidade), assinalado no calendário do tempo de 2019 para começar, às 7h07 do dia 21 de junho, aproveito a coluna para dizer que "seja bem-vindo, seu lindo". Eu e algumas pessoas (confesso que seu opositor - e esta mania minha de politizar tudo - o verão tem mais apaixonados e apaixonadas) esperamos, com uma ansiedade afobada os dias frios, as noites geladas, os ventos minuanos, as quedas nas temperaturas. Torcendo para usar e abusar das canjas, das sopas, das pipocas, dos vinhos (muito regime depois, é claro) e de tardes e noites de filmes na Netflix.

Que venham logo as invernidades deste estranho 2019. Que escapem, definitivamente, das gavetas, dos armários, dos roupeiros, as echarpes, as pashminas, as toucas, as mantas, as luvas, os blusões de lã e os casacos e sobretudos. Que vistam, mesmo que de forma não tão elegante (como bem lembrou minha amiga Janine Souza com aquela sua foto de pijama, meia, pantufa misturando várias estampas no facebook), as pessoas tremendo de frio neste Inverno gaúcho. Que tomem seus lugares nas adegas e nas despensas os vinhos, os queijos, os ingredientes para os fondues, para as rapaduras, os pés de moleque e a sopas de capeletti para a estação fria. E que todos e todas façam uma sessão de desapego para doar agasalhos aos que nada têm (em breve, Marcinha fará um ato de desapego total em função da mudança de endereço, mas isto é assunto de outra coluna).

Porque sabiamente como já cantava o síndico Tim Maia, "quando o Inverno chegar, eu quero estar junto a ti, pode o Outono voltar, que eu quero estar junto a ti". Ou o Rei Roberto Carlos, "quero que você, me aqueça neste Inverno e que tudo mais vá pro inferno".

(*) sobre a coluna da semana anterior intitulada 'Se este fosse um País sério', cometi um erro e preciso me corrigir. A frase "jornalismo é publicar aquilo que alguém não quer que se publique, todo o resto é publicidade", não é de George Orwell, como eu informei. Ela é de autoria de William Randolph Hearts e agradeço a equipe do Coletiva.net pelo alerta.

Autor
Márcia Fernanda Peçanha Martins é jornalista, formada pela Escola de Comunicação, Artes e Design (Famecos) da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), militante de movimentos sociais e feminista. Trabalhou no Jornal do Comércio, onde iniciou sua carreira profissional, e teve passagens por Zero Hora, Correio do Povo, na reportagem das editorias de Economia e Geral, e em assessorias de Comunicação Social empresariais e governamentais. Escritora, com poesias publicadas em diversas antologias, ex-diretora do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Rio Grande do Sul (Sindjors) e presidenta do Conselho Municipal dos Direitos da Mulher de Porto Alegre (COMDIM/POA) na gestão 2019/2021. E-mail para contato: [email protected]

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