Cleber Benvegnú: Tudo é passageiro

Advogado e jornalista, ele vê na família o mundo real, na fé encontra seu porto seguro e prova que experiências sempre valem a pena

Cleber Benvegnú - Divulgação

Boa gente, descontraído e sincero, Cleber Benvegnú é assim mesmo, sem rodeios. Com sotaque ainda forte do Interior, dos tempos na pequena Casca, onde nasceu e cresceu, mostra que já está mais do que habituado à correria da Capital, que habita desde 1995. Vê-se à vontade na sala de trabalho, situada na Ala Residencial do Palácio Piratini, enquanto degusta um chá no dia chuvoso e fala sobre a carreira e os rumos que ela tomou. "Quando estava tudo ajeitado, veio a proposta", relembra, ao contar como foi convidado para assumir a Secretaria de Comunicação do Governo do Rio Grande do Sul, seis dias antes de o governador José Ivo Sartori assumir, em 1º de janeiro de 2015.

A comunicação sempre esteve presente na vida dele. Desde criança, gostava de ouvir programas de rádio e costumava brincar de ser apresentador de telejornal. Até hoje, guarda a máquina de escrever Olivetti, que pertencia ao pai, Artêmio, falecido quando Cleber tinha apenas quatro anos de idade. Apesar da morte do pai, o quinto dos cinco filhos recorda a infância de maneira carinhosa, com destaque para a mãe, Suely, que, viúva aos 36 anos, criou ele e os irmãos "de forma digna", como faz questão de frisar. "É um exemplo. Nunca reclamou da vida, mesmo tendo passado por perrengues gigantescos. Cuidou desses cinco machos, como ela diz, e deu tudo certo", emociona-se ao falar. "Nunca sobrou nada, mas também nunca faltou."

Mesmo com diploma de Direito e breve atuação como juiz de pequenas causas no foro da Restinga, nunca deixou de ser um comunicador. A vontade de escrever e a facilidade de colocar as ideias no papel o levaram a ter sua primeira experiência em jornal impresso aos 13 anos, quando publicou sua primeira coluna no Jornal Hoje, de sua cidade natal, e que tem guardada com o maior cuidado. Sobre a estreia precoce, diverte-se ao comentar que "naquele tempo, trabalho infantil era permitido".

Vocação X Influência

Com uma trajetória basicamente baseada em produção de conteúdo e assessoria de comunicação, Cleber teve algumas experiências em veículos, ainda na adolescência. Além do impresso de Casca, onde também trabalhou como repórter aos 14 anos, passou por emissoras de rádio da região, como a Rosário e a Odisseia, ambas de Serafina Corra, e a Vanguarda, de Marau. E, embora estivesse praticamente encaminhado para cursar Jornalismo na universidade, não se viu livre de dúvidas.   

"Tinha uma parte da família que achava que ser advogado era uma profissão mais consistente e uma carreira financeiramente segura. Além disso, eu gostava de assistir aos júris da cidade", revela. Por influência, então, escolheu Direito, e com 17 anos chegou à Região Metropolitana para estudar na Unisinos, em São Leopoldo, onde conquistou o título em 2000. Na sequência, fez a Escola Superior do Ministério Público e a Escola Superior da Magistratura da Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul (Ajuris).

Foi no exercício da atividade de juiz que teve certeza de que não era o que queria. "Para mim, aquele universo do Código de Processo e das leis estanques era meio limitador. Eu sentia que precisava de mais liberdade intelectual, de escrever, criar, roteirizar. O que a comunicação me dava", explica o motivo que o levou a alterar o rumo profissional.

Para textos e contextos

Ainda como juiz, abriu sua primeira empresa de comunicação. A ideia surgiu quando percebeu que os pequenos favores que fazia para amigos próximos, como escrever roteiro de comercial para TV e para propaganda política, até discursos, poderiam gerar receita. E colocou a ideia em prática com criação da Texto e Contexto ao lado do também jornalista e político Percival Puggina, com quem dividia a sociedade e a quem chama de "pai espiritual": "Ele teve uma influência muito forte na minha formação intelectual".

A ideia de voltar a estudar ganhou forma quando a atual esposa - na época, namorada -, Renata Souza, ingressou na faculdade de Farmácia, na PUC. Oito anos mais jovem, Renata convidou-o para voltar à universidade, dessa vez para estudar o que tinha vocação: Jornalismo. "Estávamos quase noivos e eu queria viver aquele mundo. Fui. Eu era meio tiozão, meus colegas eram mais novos e me olhavam como um bicho estranho", recorda, divertido, e completa: "Foi uma experiência muito legal". O diploma veio em 2007.

Com Puginna seguindo outros rumos, a Texto e Contexto saiu de cena para dar espaço à Critério - Inteligência em Conteúdo, fundada em 2011. O dono declara sua admiração pelos sócios Rafael Codonho, Soraia Hanna e Tomás Adam. Por conta do cargo no governo do Estado, está afastado da gestão da empresa, mas garante que sua cadeira permanece intacta. "Os planos são voltar para a Critério, viver a experiência de mais tranquilidade no cotidiano pessoal. Preparei-me para esses quatro anos, mas não estou fechado para nada" declara. Tanto que, como recorda, neste meio-tempo também trabalhou em parceria com a produtora de TV de Tânia Moreira, e alimentou o blog Senso incomum, no site de Zero Hora. "Foi minha única experiência em veículo depois de deixar o Interior", conta.

Mundo real

Devido ao cargo público que ocupa, a vida social é intensa com eventos, palestras e premiações. No entanto, com a chancela do governador, Cleber abre mão de tudo isso - sempre que possível - para dedicar-se à família. Do relacionamento de 16 anos com Renata, nasceu o trio formado por Isabela, de cinco anos; Bento, de dois; e Teodora, de sete meses. "Nossa ideia era ter quatro filhos, mas acho que vamos ficar por aí. A pegada é forte", admite, aos risos.   

Os momentos junto aos pequenos são muito apreciados pelo jornalista, que se emociona ao falar do papel importante que têm em sua vida. "Eles são essenciais para eu me manter no rumo, porque o entorno do governo te tira da realidade, com poder e status. Vejo que as pessoas acham que isso é eterno, mas passa. Quem fica é a família. Ali é o mundo real, sabe?", reflete e complementa: "Saio aqui da loucura, com votação na Assembleia Legislativa, protesto na rua, crise. Chego em casa e é um mamá, uma fralda, um choro, uma vida real".

A paternidade, para ele, é uma bênção. Visivelmente comovido, fala sobre a experiência: "Tu te despes de ti mesmo a favor do outro com amor. Tu te esqueces de ti, te entregas para outra pessoa e aquilo volta. Felicidade", declara.

Além dos momentos em casa, o quinteto aproveita os finais de semana para passear e curtir ao ar livre. O casal também gosta de sair para jantar e de convidar amigos para o tradicional churrasco em casa. Aliás, carnes são sua especialidade na cozinha. Confessa não ter muitas habilidades, mas aprecia a experiência. "Culinária me faz bem e ter amigos em volta da mesa com vinho e cerveja é uma das coisas que mais gosto de fazer. Gosto de ver o lado engraçado da vida."

Movido pela fé

"A melhor parte de mim é a minha fé", afirma, convicto, o que combina muito bem com um criado-mudo repleto de crucifixos. Durante a conversa, tentei contar, mas me perdi quando passei de 10. "São 25", sua secretária me confirmaria depois. "Vejo um sentido bem forte na cruz de Cristo. Ao mesmo tempo em que ali está o sofrimento humano, está, também, uma redenção." Em casa, mais 10 destes símbolos religiosos complementam a decoração.

É, assim, um católico assumido, que vai à missa todos os domingos e costuma frequentar a Igreja Nossa Senhora de Mont'Serrat. Não acredita no ser humano sem uma dimensão metafísica e prega que as coisas do dia a dia são passageiras. "Tenho fé na vida eterna", declara. Orgulhoso, conta que Renata não era muito assídua, mas passou a acompanhá-lo na tradição, por entender a importância que isso tem em sua vida. Além da igreja, a reza o acompanha nos momentos de lazer. "Gosto de rezar e caminhar e, às vezes, faço as duas coisas ao mesmo tempo: caminho rezando."

Corrida faz parte da lista de exercícios físicos que aprecia, diferentemente de academia, local ao qual diz ter aversão e só frequenta em razão da saúde. Gremista, volta e meia acompanha os jogos na Arena, mas garante que não é fanático. Além da relação afetiva com o time, teve envolvimento profissional com o clube quando fez a campanha de retomada do ex-presidente Fabio Koff, contratado pela agência Capella. "Ficamos amigos e foi quando eu conheci o Grêmio na sua plenitude e me envolvi mais ainda com o time", relembra.

Das coisas boas e ruins

Indecisão é tida como um defeito, e um bom exemplo recente foi o convite para assumir a Comunicação no governo, que chegou a negar na primeira vez. Após muita reflexão e depois de ouvir diversas opiniões, aceitou em uma segunda chamada. "Sou muito reflexivo e sofro para decidir, pois quero achar a opção perfeita", alega. Também se caracteriza como uma pessoa desorganizada e atrapalhada, a ponto de, como reconhece, fazer bagunça em loja de cristais. À lista de defeitos, somam-se, ainda, indisciplina e preguiça, o que o leva a se considerar "longe de ser um exemplo". Para compensar o equilíbrio, declara-se um homem íntegro, diplomático, e, ao mesmo tempo, sincero. 

Cerca de 15 segundos foi o tempo que ficou em silêncio quando a questão 'autodefinição' entrou no jogo. Em seguida, revelou, mais uma vez, sua devoção a Deus e à família e, acima de tudo, à felicidade: "Ela se dá nessas duas dimensões. Busco esse sentimento como constância, não como momento. Ela está na caminhada". Ao final, confidencia que, embora não demonstre, é uma pessoa que se abala e sofre, no entanto procura sempre a importância das coisas mundanas. "Todos vamos morrer. Tenho muito presente essa questão da morte, mas tomara que não seja tão cedo, porque eu quero incomodar aqui por um bom tempo."

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