Ana Maria Rossi: Vida sob controle

Hoje psicóloga, ela atuou por muitos anos nas áreas da Comunicação e do Jornalismo

Ana Maria Rossi, jornalista e psicóloga - Crédito: Divulgação

Graduada em três faculdades, além de dois mestrados e um doutorado, Ana Maria Rossi não para. O trabalho, que chega a consumir 17 horas do seu tempo em momentos mais corridos, é a sua vida. Organizadora de livros e eventos de grande porte, o que não lhe falta são desafios e a necessidade de manter a calma para as mais diversas situações. E, para encarar tudo isso com serenidade, ela mesma é a sua principal paciente.

A filha de Luis Antão e Cecília cresceu ouvindo que era uma pessoa muito justa e, por isso, deveria ser advogada. Na época, como acreditava que não passaria em Direito, também fez vestibular para Jornalismo, porque escrevia poemas. A surpresa chegou em dobro: passou nos dois cursos na PUC, e acabou cursando um em cada turno - formando-se nos dois com um ano de diferença, em 1972 e 1973.

Após ingressar em um estágio em Zero Hora, logo foi contratada. Porém, na época, a função de repórter auxiliou a intensificar os sintomas de estresse e ansiedade que já carregava. Em um dado momento, chegou a fumar três maços de cigarro produzindo uma única matéria. Com o Regime Militar em vigência no Brasil, não era fácil trabalhar na imprensa. Após escrever duas folhas, o conteúdo era cortado - devido às normas da censura -, chegando a ser finalizado com seis linhas. Desgostosa, ela, que ainda fazia alguns trabalhos freelancers para revistas como Manchete, viu uma oportunidade de mudar de vida após uma viagem para os Estados Unidos, que se tornou a sua moradia pelos próximos anos.

Vivência norte-americana

Quando chegou em Tallahassee, capital do estado norte-americano Flórida, descobriu que o local possuía uma das três melhores televisões educativas do país. Como o Brasil estava iniciando esse processo na época, resolveu estudar sobre o assunto na universidade da cidade. Logo que ingressou no mestrado em Comunicação de Massas, passou a estagiar e se inteirar sobre a área.

Todavia, neste tempo, mal sabia se comunicar em inglês - e confessa que não sabe como conseguiu a vaga para estudar sem saber direito a língua nativa. "Lembro-me que, no primeiro dia de aula, só entendi quando o professor disse hello (oi) e depois goodbye (tchau)", recorda. A partir disso, matriculou-se em um junior college, um curso de línguas para iniciantes. Como nos Estados Unidos não havia curso de inglês, pois é o idioma nativo, fez aulas de espanhol e italiano. Então, quando o professor traduzia para o inglês, fazia o caminho inverso mentalmente. Para aprimorar, também ouvia muita música, rádio e assistia à televisão. Além disso, ter morado com uma egípcia a ajudou bastante a desenvolver a prática. Quando Ana Maria não compreendia o que a colega dizia, a amiga falava em francês - outra língua que ela entendia.

 Apesar dos desafios idiomáticos terem sido superados, a jornalista precisou lutar por outro embate. Sempre muito estressada e ansiosa, os sintomas físicos pioraram, como dores de cabeça e insônia. Preocupada, acabou indo no centro de saúde da universidade. Foi quando a médica lhe contou sobre um estudo que estava sendo feito para amenizar este problema, o qual era centrado em Biofeedback, processo que proporciona a um indivíduo a possibilidade de tomar consciência das relações fisiológicas, assim como desenvolver estratégias para alterá-las por meio de mecanismos de aprendizagem, treinamento e autorregulação.

Após procurar o responsável, ingressou no programa. "Não sou muito comprometida, mas quando me engajo de verdade, vou até o fim. Entrei no programa e ele mudou minha vida", comenta ela, ao dizer que foi convidada para ser uma das assistentes do médico no estudo. Encantada e apaixonada pela técnica, quando já estava terminando a tese na área da Comunicação, resolveu se aprimorar no campo que tanto a havia ajudado. Fez um segundo mestrado, desta vez, em Psicologia Clínica, e, após, um doutorado, em Psicologia Clínica e Comunicação Verbal, com o intuito de se especializar em tratamentos relacionados ao estresse e à ansiedade.

Por se dar muito bem com Lauro Schirmer, que dirigiu Zero Hora por 20 anos, escrevia notícias internacionais para o impresso do Grupo RBS. Como foi o caso de quando relatou aos leitores sobre o show dos Rolling Stones em que esteve. Em 1987, explicando para o colega de profissão sobre o que era Biofeedback, foi aconselhada por ele a regressar ao Brasil e ser pioneira da área em Porto Alegre.

Com o propósito de lecionar, descobriu que precisava ser bacharel em Psicologia e realizou, então, a terceira graduação. Quando voltou ao Brasil, não conseguiu atuar no ensino. Com isso, começou a fazer freelancer para revistas de comportamento como Marie Claire, para falar sobre estresse e ansiedade. Porém, no comando de uma clínica e presidente da International Stress Management Association no Brasil (ISMA-BR) e copresidente na Divisão de Saúde Ocupacional da Associação Mundial de Psiquiatria, hoje escreve eventualmente alguns artigos sobre a área.

Desafios

Voltando à Comunicação, o momento de maior satisfação da carreira no Jornalismo foi ter sido efetivada em ZH nos primeiros anos de faculdade, além de ter a assistência de profissionais com gabarito, como o Carlos Alberto Kolecza e o próprio Lauro Schirmer. Lá, também passou por um dos maiores sustos que teve na vida: um incêndio na redação a fez ficar do outro lado da rua vendo o prédio pegar fogo.  

Também recorda que um dos principais desafios foi aprender a lidar com a censura. Isto porque se sentia tolhida por não saber o que escrever, bem como o que poderia ser publicado. "Eu fazia uma matéria inocente, sem crítica, e via ela ser depenada", relembra. Em dado momento, o colega da RBS TV Renato Pereira, que escrevia as notícias para os repórteres e âncoras do Jornal do Almoço, saiu de férias e chamou Ana Maria para substituí-lo. Ao redigir uma matéria que considerou muito boa e criativa, levou um puxão de orelha, pois foram repreendidos pelo censor. Além disso, ouviu um alerta de que, na próxima vez que errasse, estava fora da televisão. E houve uma próxima vez, segundo ela, em relação a algo banal, uma crítica que foi impensada. "Isso acabou me desgostando muito, porque sou muito envolvida com o que me comprometo a fazer", diz.

Outro momento que a marcou foi quando prometeu off a uma fonte, mas foi xingada, pois o chefe disse que nunca poderia prometer confidencialidade a menos que estivesse pronta a burlar. Logo após, deixou de trabalhar como repórter e passou a ser editora de texto - cargo então chamado de copy-desk. Outro motivo que a desestimulou mais ainda, pois gostava mesmo era de escrever.

Sempre muito ansiosa e estressada, algumas situações se agravavam no trabalho, como quando não conseguia redigir um texto sem ficar com um cigarro na mão. No entanto, nos Estados Unidos, conseguiu melhorar isso e, de acordo com ela, hoje faz parte da personalidade, mas está sob controle. Apesar disso, garante que a vida ficou mais leve não pela mudança profissional, mas com as técnicas aprendidas. "Se eu deixar de praticar, tudo volta. Hoje, consigo viver uma vida intensa, mas sem sequelas", compara.

Leveza

Com a atual jornada de trabalho entre 12 e 14 horas por dia, também coordena um congresso na área de biofeedback no Brasil e, em alguns momentos, chega a atuar 17 horas em um mesmo dia. Neste meio-tempo, continua a fazer as meditações transcendentais duas vezes por dia e cuida muito da alimentação.  "Fisicamente, sempre fui muito ativa. Na infância, participava de um time de vôlei e, nos Estados Unidos, era corredora de longa distância." Participou de 12 maratonas de 42 km e uma de 50 km. Porém, não pode mais correr devido a um problema nos joelhos. Por isso, hoje vai à academia duas vezes por semana, faz Pilates em outro dia e, nos demais, caminha. Há 29 anos, dá aula de ioga nos domingos, gratuitamente, no Parcão. Sempre teve o desejo de aprender a andar de skate, mas como o joelho não permite, acaba assistindo às competições da modalidade, juntamente com surfe, maratonas e mountain bike.

Apesar de viajar muito, não tira férias. Isto porque precisa visitar o exterior de quatro a cinco vezes por ano em viagens longas, por causa do trabalho, e tira apenas uns dias de descanso nessas ocasiões. No ano passado, foi a um congresso na Espanha e resolveu revisitar Portugal. Adora conhecer novas culturas e sempre tenta viver como um nativo, como ir à feira e conversar com as pessoas. Não tem noção de quantos países conhece, mas adianta que, na Ásia, só não conhece Mongólia, Filipinas e as duas Coreias, enquanto a Europa conhece quase toda. Já esteve em todos os estados dos Estados Unidos, a não ser Utah e Washington, e o Canadá já foi e voltou de leste a oeste. Cada país contribui a ela de alguma forma, e, conforme Ana Maria, sempre volta mais educada, em termos de cultura e comportamento. "Um dos países que mais me impressionou foi Taiwan, pela educação das pessoas", afirma ela, que ainda gostou de Myanmar, onde se hospedou perto de um mosteiro e aprendeu muito com o Budismo.

Por mais que tente, não consegue ler materiais que não estejam diretamente relacionados ao seu trabalho. Quando viaja, leva livros, revistas e palavras cruzadas, contudo, não consegue manter este hábito no dia a dia. Normalmente, aprecia obras de aventura e suspense. Da mesma forma, em relação ao cinema, gosta de filmes que não tenham muita violência ou terror. "No dia a dia, já temos razões demais para nos estressar, por que ainda vou pagar para isso?", questiona, ao revelar que a televisão não faz parte do seu repertório de lazer. Por isso, informa-se na internet, lendo portais como o MSN e assinando Zero Hora digital. Em relação a músicas, gosta de escutar jazz, blues, bossa nova e, eventualmente, Elvis Presley. Sem muito tempo para happy hours, o convívio social sofre um pouco. "Isso é algo que eu gostaria de melhorar", confessa.

Irmã de José Luis, obstinada e independente, ela faz aniversário justamente no Dia da Mulher, 8 de março (hoje!). Ainda, afirma que é intolerante com hipocrisia, mas muito comprometida. Considera-se alguém muito simples, sendo a fé o que de mais importante possui na vida. Apesar disso, não tem religião. "Minha religião é a natureza. A minha fonte de energia e referência espiritual." Então, seus lemas de vida refletem justamente isso. O primeiro é "Se a mãe-natureza está comigo, quem pode estar contra mim?", enquanto o segundo aponta pra ela que "isso também vai passar", por isso, não há motivos para se desesperar. E, assim sendo, vai mantendo a calma e paz de espírito.

 

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