Débora de Oliveira: Ela é oito ou 80

Com 16 anos de profissão, Débora de Oliveira recorda a história com o futebol e o jornalismo

O futebol entrou para a vida de Débora de Oliveira ainda na infância. Filha de jogador - Leonel de Oliveira, com atuação na região do Vale do Sinos -, herdou do pai o gosto pelo esporte. A falta de um filho homem na família fez com que fosse Débora a companhia oficial do pai nos estádios. A vontade de trabalhar com futebol ajudou a levá-la ao jornalismo e, hoje, é a arte de contar histórias que a fascina. "O jornalismo esportivo tem vários nichos. Tem quem foca em investigação, quem busca o furo, e eu busco contar história. É isso que me realiza", enfatiza.
Apresentadora do SBT RS, onde atua desde julho do ano passado, comanda o programa SBT Esporte, ao lado de Ricardo Vidarte, e apresenta o quadro Débora Futebol Clube, no telejornal matutino da emissora. É um desafio diário, diz ela, lidar com um público formado por torcedores. "Tu precisas estar sempre à frente de um torcedor, à frente de um apaixonado, que hoje tem internet à disposição, rádio que fala 24 horas em futebol, amigos, conselheiros, que podem dar detalhes das negociações." Débora também atenta para a responsabilidade em trabalhar com jornalismo esportivo. "Às vezes, saber que o seu time ganhou é a única alegria que a pessoa tem em sua casa", ressalta.
"Amoreco" e "lindeza" são duas das expressões que se tornaram marcas de sua personalidade. É comum vê-la empregar os termos tanto para se referir àqueles com quem convive como aos que acompanham seu trabalho. Ela reconhece que até recebe críticas por este comportamento e garante que não se trata de marketing, mas sim de uma forma de retribuir a gentileza àqueles que demonstram carinho. "Quem me conhece sabe que eu chamo os meus amigos assim. Eu sou assim e não acho legal não ser eu com quem gosta de mim, gosta do meu trabalho. Levo a eles um tratamento que dou às pessoas que gosto, fora do vídeo, em qualquer lugar."
O início, aos 17
O Grupo Sinos foi a primeira casa de Débora, no aspecto profissional. Tinha apenas 17 anos quando a Rádio ABC 900 lançou um concurso para definir o elenco de um programa de debates esportivo, composto apenas por nomes femininos. Decidida a ser uma das escolhidas, atingiu o objetivo após enfrentar uma sabatina com os comunicadores da emissora. Sem qualquer experiência no rádio ou com o esporte, o começo, claro, não foi fácil. "Minhas colegas todas eram mais experientes, mais velhas, ou tinham trabalhado em rádio, ou tinham mais conhecimento técnico. Sabiam muita coisa e eu só sabia que queria trabalhar lá", recorda.
O jeito foi buscar o aperfeiçoamento e, para isso, traçou a tática de, semanalmente, anotar em um caderno todo o tipo de informações esportivas publicadas nos jornais durante a semana. Pouco a pouco, os resultados surgiram, passou a participar das jornadas esportivas da rádio, cobrindo a movimentação das torcidas. Foram sete anos de Grupo Sinos: "Ali foi minha base, minha escola, onde aprendi muito do que sei. É um lugar que visito muito ainda, vou lá e passo a tarde, é uma família".
Na Band, onde permaneceu por dois anos, teve oportunidade de conhecer de perto um novo meio, a televisão. Hoje reconhece que grande parte das noções de TV aprendeu com Ribeiro Neto e Paulo Pires. De repórter, tornou-se, em menos de um ano, debatedora fixa do programa Toque de Bola, ao lado de futebolistas experientes como Leonardo Meneghetti, Antônio Carlos Maineri, Luiz Fernando Záchia e Ribeiro. Em 2006, um convite a levou ao Gupo RBS para ser repórter, fazer transmissões e apresentar programas. Lá, figurou no vídeo durante seis anos.
Alicerce doméstico
Débora nasceu em Novo Hamburgo e, há cerca de sete anos, mudou-se para Porto Alegre, "vencida pela BR". Na Capital, tem a companhia do cachorro Kaká, um yorkshire de cinco anos. As ruas do bairro Jardim Mauá abrigam as recordações de infância da jornalista, filha de Leonel e Ivone de Oliveira, que hoje residem no Litoral. Foi lá que experimentou muitas das brincadeiras típicas da juventude, mas seu maior prazer estava mesmo em acompanhar o pai nos jogos de futebol.
À beira do campo, Débora também cometeu algumas traquinagens, ainda que não intencionais. Em uma delas, parou um jogo aos gritos, provocando a saída de todos os jogadores, enquanto chamava pelo pai. A razão? Apesar de orientada a permanecer dentro do carro, devido à baixa temperatura, resolveu deixar o veículo, mas esqueceu a chave dentro. A atitude da menina foi repreendida pelo pai, que ameaçou não levá-la mais aos jogos. "Passei a semana inteira doente, tive febre, porque achava que nunca mais iria ao jogo com ele. No domingo, me arrumei primeiro e fiquei na porta esperando. Ele não teve como não me levar", diverte-se.
Ao apoio e empenho dos pais, ela atribui muitas das conquistas da carreira. Lembra que, quando encarou uma dupla rotina de trabalho, não foram poucas as vezes em que a mãe a esperou retornar das jornadas esportivas às 3h30, com "pijama quentinho, passado a ferro", para que pudesse descansar e estar de pé novamente às 5h30. O pai também, por vezes, veio à Capital de trem para depois dirigir o carro até Novo Hamburgo, tudo para que a filha tivesse mais tempo de sono e não corresse o risco de dormir ao volante. "Eles são tudo nessa caminhada", resume.
O simples e especial
Dezesseis anos de profissão renderam à jornalista experiências boas e ruins. Ainda nos tempos de Rádio ABC, chegou a ser barrada no Estádio Olímpico, por seguranças que não acreditaram que a adolescente acompanhava o jogo do campo a trabalho. Pensavam que assistia à partida do local, embora ela utilizasse a credencial da Aceg (Associação de Cronistas Esportivos Gaúchos). "Hoje, volto no tempo e penso: tão legal que eles (profissionais da Rádio ABC) acreditaram em mim, num momento em que ninguém cogitava."
A oportunidade de viajar no ônibus da delegação de jogadores; o orgulho dos pais ao ver a filha em rede nacional pela primeira vez, na Band; entrar no ar ao vivo com Galvão Bueno no dia em que o Internacional jogou a final do Mundial Interclubes de 2006, pela RBS TV; não conseguir segurar as lágrimas em frente à câmera ao noticiar o acidente com o ônibus do Brasil de Pelotas, em 2009 - são muitas as lembranças que, embora simples, têm lugar especial na memória da jornalista.
"Essas coisas vão se renovando, no ano passado, minha matéria com o menino Willian (segundo lugar no Prêmio ARI de Jornalismo 2013), aqui no SBT, foi a coisa mais maravilhosa da minha carreira. Ver um guri cheio de problemas que vê a vida lindamente. Voltei de Venâncio Aires pensando no que tinha vivido naquele dia, na lição que aquele menino me passou", recorda. "Das pequenas coisas às mais grandiosas, valorizo todas", completa.
Na carreira, foram referências profissionais João Pedro Paes Leme, hoje diretor executivo da Central Globo de Esportes; o repórter Pedro Bassan; e o apresentador Alex Escobar. Mas aquele a quem se refere como um "grande ídolo" está no Rio Grande do Sul, é Paulo Pires, editor de Esportes da Band TV. "É uma pessoa que carrega um histórico excelente, é muito bem informado e me ajudou muito no meu ingresso na televisão", considera.
Para distrair
No trabalho, a rotina pode até ser intensa. Em casa, o momento atual é de tranquilidade. Sair com os amigos ou reuni-los em casa são programas nos períodos de lazer dessa jornalista, que afirma passar por uma fase de muita paz. Para ir a bares ou restaurantes à noite, o acordo com os amigos é optar por lugares ainda não frequentados pelo grupo. "Criei uma brincadeira no meu site, chamada "Porto Alegre que ainda não conheço", pedindo dicas de lugares. Recebi mais de 100 e-mails com sugestões. A combinação agora é: vamos a um lugar que nunca fomos."
A leitura diária, mais do que uma atividade para passar o tempo, constitui um objetivo. Desafia-se todo dia a ler ao menos um capítulo de um livro. No ano passado, foram 47 obras. A única condição para que um livro entre para a lista é que seja recheado de histórias. Se o momento for para música, o gênero preferido é o sertanejo, "o de raiz, não de modinha", como faz questão de esclarecer. E logo explica: cresceu ouvindo roda de viola, tipo de música de que aprecia desde criança, quando o sucesso do momento era Tonico e Tinoco. E há duplas atuais que também adora, como Jorge e Mateus.
Formada em Jornalismo pela Unisinos, segue se dedicando aos estudos, mas agora, como aluna na graduação de Psicologia. O diploma na área está entre as pretensões futuras. A ideia é utilizar o conhecimento no segmento de esporte, uma vez que não se imagina longe desse meio. A academia também a encanta por outro aspecto, a possibilidade de trocar conhecimentos e transmitir experiência: "Gosto muito de dar aula em cursos de extensão. Essa proximidade com alunos é algo que me atrai bastante".
Os opostos, juntos
Quem a vê segura e desinibida em frente às câmeras não imagina que Débora inclusive já fez curso para enfrentar a timidez. Até é agitada e extrovertida com as pessoas que conhece, mas assume que já teve medo do público e revela que, no início, o simples ato de dar o "boa noite" inicial em eventos era para ela "um desespero". Para finalizar o curso de desinibição, os alunos deviam fazer uma apresentação para toda a turma. Escolheu declamar um texto de Paulo Sant"Ana, foi aprovada e até presenteada com um livro como reconhecimento especial.
Certa vez, ao encontrar o colunista de Zero Hora, relatou que, de tudo que ele já havia escrito sobre futebol, nada havia chamado tanta sua atenção quanto a crônica "Competência do coração". Para lembrar Sant"Ana, declamou o texto, emocionando o jornalista. No dia seguinte, o assunto foi abordado pelo colunista. "Hoje, onde quer que ele me encontre, me faz declamar, dizendo: "ninguém sabe uma coluna do Tulio (Milman) ou do Lasier (Martins) de cor, mas a minha, sim"."
Débora considera-se uma pessoa muito amiga, mas admite que tem seus defeitos. Um deles está na procura pelo perfeccionismo, que resulta em um alto grau de exigência sobre si e para com os outros. Por aventurar-se no mundo esportivo, um mercado de trabalho restrito, onde a presença masculina predomina, diz que sempre se cobrou bastante para que tudo o que faz saísse o melhor possível. No trabalho em equipe, essa característica recai também sobre as demais pessoas. Outro diferencial dela estaria na facilidade em perdoar. "Se é bom ou ruim, não sei dizer", afirma. O fato é que Débora reúne em si caraterísticas distintas e até opostas. Que resume assim: "Sou eu, duas vezes. Calma e estressada. Perfeccionista e despreocupada. Tímida e extrovertida. Dá pra dizer que sou oito ou 80".
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