Carlos Abbud: Publicitário por acaso

Do alto de uma experiência internacional, Carlos Abbud sustenta que o publicitário precisa estudar mais

Por Juliana Freitas, em 03/09/2014
Com 28 anos de história na publicidade, Carlos Alberto Abbud, presidente da Up and Go, agência gaúcha de marketing e comunicação, admite que sua inserção na área foi um acidente. Mas quando sua trajetória é relembrada, fica claro que seu destino e sua competência só poderiam levá-lo a seguir para a área mais criativa da comunicação. Ex-diretor de Marketing de empresas importantes no Brasil, ele acredita que se destaca por já ter tido experiências também como anunciante, possibilitando uma visão diferenciada do mercado.
Abbud recorda com carinho do avô materno, Calisto, considerado seu grande mentor. Foi quem o auxiliou no primeiro trabalho publicitário e ensinou grandes lições de vida, mesmo tendo pouca escolaridade. "Sua sabedoria era fantástica", enfatiza, acrescentando que tem o avô sempre perto através de uma fotografia na mesa de seu escritório. Filho de uma dona de casa e de um comerciante, Carlos formou-se em administração em 1970, pela Fundação Getúlio Vargas, e fez especialização em Marketing pela americana Harvard University, concluída em 1979. Hoje relembra com carinho que o primeiro ano de publicitário foi o mais difícil por identificar reações preconceituosas por parte dos colegas. "Já iniciei como diretor e sentia que as pessoas me olhavam de forma diferente por não ser do 'mundo' deles", afirma.
Empresário na publicidade
Carlos ingressou na área publicitária com 40 anos, quando se tornou diretor de Marketing na holding Max Factor Cosméticos, rede que fabricava produtos de beleza. Após a venda da empresa para a Revlon, empreendimento também voltado para a beleza feminina, foi transferido para a agência McCann-Erickson. "Naquele momento, eles queriam renovar e procuravam alguém que não fosse publicitário. Queriam um profissional que tivesse trabalhado no outro lado, como anunciante", diz.
Como trabalhou por 20 anos em marketing, tendo passagens pela diretoria das empresas Unilever, São Paulo Alpargatas, Drury's & Smirnoff, Credicard e Laboratórios Abbott, a agência acreditou que seu conhecimento agregaria uma forma de trabalho diferenciada e com uma nova visão para o mercado. Daí as primeiras críticas pelo fato de não ser originalmente do ramo. "Recebi essa crítica de uma diretora da McCann. E me marcou, porque eu tinha que provar que tinha condições de ser do ramo. Existia muita vaidade entre os publicitários." Carlos ultrapassou barreiras e atuou durante 15 anos na McCann-Erickson, em São Paulo, até ser deslocado para o Rio Grande do Sul devido a uma crise com um de seus clientes.
Em 1998, após ele próprio ter encerrado as atividades da agência no Estado um ano antes, decidiu reabrir a empresa. Chegou com a missão de fazer a Coca-Cola retomar a liderança no mercado de bebidas, situação que havia perdido devido à boa atuação da Pepsi. Com o prazo de 12 meses para reverter o prejuízo da marca, a empresa voltou ao Estado, e Carlos conseguiu fazer com que a Coca se tornasse líder de vendas novamente.
Em 2003, solicitou seu desligamento da McCann-Erickson para investir em um negócio próprio. Em 30 setembro de 2004, a Up and Go Marketing e Comunicação começava as operações em Porto Alegre. Como sócios tinha seu filho, Carlos, e Alessandro Souza, diretor da ESPM, que deixou a sociedade tempos depois para poder se dedicar integralmente às aulas, como a faculdade exigia. Dez anos depois de criada a Up and Go e aos 68 de vida, Carlos admite que está pouco a pouco diminuindo o ritmo e sua participação na empresa. "Eu pensei em me aposentar faz tempo. Mas acredito que vou adoecer se fizer isso. Então, enquanto esse pessoal me aguentar, vou continuando."
Experiência que virou livro
Durante seu período na McCann-Erickson, observou como o publicitário se comportava na rotina de cada dia e nos momentos de convivência social. Destas observações saiu a matéria-prima para o livro 'O Publicitário', romance no qual relata o que seria a verdadeira realidade da área. Um sucesso que já vendeu 96 mil exemplares. "Eu descobri que o publicitário é muito 'caras e bocas'. Ele expressa um otimismo exagerado, sendo que sabe que, no fundo, o mundo não é tão rosa", acredita.
Carlos ainda teria várias experiências internacionais, que lhe proporcionariam momentos inesquecíveis, como a conquista da confiança do conde Gregório Rossi, proprietário da Martini Rossi. Morando em Paris, o empresário aceitava que apenas este publicitário-escritor fosse lhe apresentar as campanhas produzidas para a fabricante de bebidas. "Ele me perguntava 'você gostou?', e eu respondia 'sim'. 'Então está aprovado', ele respondia." Carlos recorda palavra por palavra destes diálogos, revelando orgulho pela confiança depositada nele. Entre os outros trabalhos pelo mundo estão os realizados em Connecticutt, Los Angeles, Barcelona, Frankfurt, Milão, Tóquio e Nova Iorque. Não é pouco coisa, como se vê.
Conhecedor do mercado brasileiro e internacional, ele tem uma visão crítica sobre o comportamento do segmento. "Acho que o Brasil dá de 10 a 0 em qualquer país, nesse ramo. O que falta é vontade de trabalhar", enfatiza. Também lamenta a decisão de apenas professores com mestrado ou doutorado serem autorizados a darem aulas. Segundo Carlos, atualmente está faltando experiência prática para passar aos jovens, o que faz com que esteja sendo formada uma geração muito teórica. E outra crítica que faz aos profissionais é a resistência a leituras, especialmente porque acredita que os publicitários deveriam estudar sempre. "Tem muitos jovens que nunca pegaram um livro para ler", registra, decepcionado.
O empresário ainda relata que sua procura por jovens talentos é constante. Quando encontra uma raridade destas, trata de dar toda a estrutura para que a promessa possa permanecer em sua empresa. Conta, também orgulhoso: "Descobri em uma gráfica nosso diretor de Criação, o Alessandro Abel, que hoje é meu sócio. Outro talento que encontrei foi nossa diretora de Operações e sócia, Juliane Kneib, que vestiu a camiseta da empresa".
Referências para a vida
Durante sua trajetória, Carlos tem nomes que considera importantíssimos para sua formação profissional. Dois deles são Percival Caropreso, um dos grandes criativos do Brasil, e Roberto Dualibi, que será o presidente do próximo Festival da Propaganda de Gramado, em 2015. Mas tem uma pessoa em especial que foi muito mais que uma referência: Marcio Moreira, falecido há um mês, foi um grande amigo de Carlos, além de seu parceiro em diversos trabalhos. Um deles se tornou inesquecível não só para ele como para a história da propaganda brasileira.
Nos anos 1980, a General Motors desejava fortalecer a marca Chevrolet no Brasil. Como na época não havia tecnologias como as disponibilizadas nos dias de hoje, os storyboard eram produzidos em cartolinas, todos manualmente. Após muitos trabalhos reprovados, o então presidente da GM afirmou que procuraria outra agência caso eles não conseguissem, em 72 horas, produzir algo que convencesse.
Após uma madrugada inteira de trabalho, Carlos e Marcio compuseram uma música, junto com o compositor e arranjador Zé Rodrix, que emocionou o presidente e os diretores que acompanhavam o executivo da GM na reunião. Apresentada em um banquinho e um violão, a canção 'É no silêncio de um Chevrolet que meu coração bate mais alto' entrou para a história da propaganda, sendo vencedora de várias premiações pelo País. "Eu me emocionei com a música. No final o presidente da GM levantou e bateu palmas. E nós ficamos com a conta."
Hobbie: trabalho
Paulista nascido em 23 de janeiro de 1948, Carlos é casado há 33 anos com Soraya Maluf Abbud, com quem tem o filho Carlos, de 31 anos, seu sócio e diretor de Projetos Digitais na Up and Go. O pedido de casamento veio depois de um tempo em que se conheceram na piscina do clube que frequentavam, em São Paulo. Na época, Soraya tinha 18 anos e ele, 35. "Fiz o pedido de casamento pelo telefone. Ela ficou muda por uns cinco minutos, mas aceitou", conta, ainda hoje achando graça da situação.
Sua rotina se resume em ir para a agência e se divertir, afirmando que seu trabalho é seu hobby. "Meu filho é quem está começando a tomar frente nos negócios. Os clientes o adoram e ele está gostando do trabalho", registra o pai coruja. Amante de esportes, não deixa de ir à academia pelas manhãs e praticar seu esporte favorito, o tênis. Sempre atualizado com a sétima arte, tem um carinho especial pelo cineasta Steven Spielberg, que conheceu pessoalmente quando trabalhou em Los Angeles.
Considerando a leitura algo importante na vida de qualquer pessoa, admite que sempre carrega três livros com ele. Atualmente, está lendo uma ficção, uma biografia e um sobre filosofia, assunto que gosta e lamenta que os jovens não tenham mais a oportunidade de estudar nas escolas. "Ela é o início de tudo", afirma. Associado ao apreço pela literatura, também está o gosto pela gastronomia. "Adoro uma caipirinha de cachaça e um bacalhau", revela.
Para o futuro, desejaria que todos seus funcionários fossem seus sócios. Não por acaso, no seu romance o personagem principal faz uma agência perfeita, onde até a faxineira é sócia. Outra atitude que acredita ser o futuro da publicidade é os colaboradores em home office. Sua empresa tem 12 trabalhando nessa condição, fora os que o acompanham na agência. "A publicidade não precisa mais de agências com muita gente no meio física", afirma. Discorda da atual forma de trabalho que empresas publicitárias convencionais ainda praticam, e acredita que não se adaptaria se tivesse que voltar a uma agência convencional. "Não aceitaria mais nada", admite, ressaltando a tranquilidade que conquistou em sua agência. E que daqui a não muito tempo desfrutará na paz doméstica, longe do dia a dia profissional.
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