Clóvis Rezende: Um otimista convicto

Jornalista experiente, com passagem pelas editorias de esporte e política em rádio e TV, assume que ainda quer mais.

Clóvis Rezende da Silva não consegue esconder, nem com os óculos de grau no meio do nariz, os olhos esverdeados e a sinceridade que ultrapassa este olhar. Dono de uma paz contagiante e com uma sensibilidade visível, o jornalista vai logo estendendo a mão e questionando: "Posso começar a falar ou tu queres perguntar?". E sem provocação começa contando sua trajetória de 62 anos de vida, 37 de jornalismo e 22 de prática esportiva.

O filho do jornalista Adail Borges Fortes da Silva, o falecido ?seu Adail?, que marcou época como comandante do velho Correio do Povo, e da dona de casa Eunice Rezende da Silva, nasceu em Porto Alegre no dia 7 de março de 1947. Traz bem viva na memória a lembrança mais saudosa de sua infância: um veraneio em Imbé em que, enquanto jogava futebol com os quatro irmãos, podia sentir a chuva bater na grama. "Parecia o dia mais feliz das nossas vidas. Era uma coisa tão simples, mas ficou marcada eternamente na minha retina". Estes momentos passaram a ser cada vez mais raros, pois o "jornalismo 24 horas" que a profissão do pai exigia impossibilitava as viagens em família. Assim, o clã passou a enfrentar o calor com os banhos de piscina no Clube de Comércio, que ficava perto de casa, no Bairro Menino Deus.

Ainda criança, Clóvis já frequentava a redação do Correio acompanhando o pai, que era o poderoso secretário de redação do jornal. O menino também costumava ir aos estúdios da Rádio Guaíba, onde recorda ter vivido momentos mágicos e de sonho. Tantas visitas ao trabalho do pai o levaram a apaixonar-se pelo jornalismo. Decidido a abandonar a ideia de cursar a Escola Naval do Rio de Janeiro, prestou vestibular Faculdade dos Meios de Comunicação Social da PUC (Famecos). Logo que se formou, em 1972, foi trabalhar na Rádio Guaíba, na cobertura do esporte amador.
Com um empurrãozinho

A chance na rádio surgiu através de Pedro Carneiro Pereira e Flávio Alcaraz Gomes, que lhe deram uma oportunidade, "por causa da amizade que tinham com meu pai". O jovem, então com 25 anos, soube aproveitar a oportunidade e mostrou a que veio. Quando começou, passava as tardes de sábado e domingo com o plantão Francisco Vitorino no estúdio, acompanhando as jornadas esportivas e ouvindo os jogos de futebol do Rio de Janeiro e de São Paulo. Sempre com um pensamento positivo, tinha a certeza de que iria alçar voos maiores, o que não tardou a acontecer: após três anos na atividade, Clóvis já cobria os jogos da dupla Gre-Nal e viajava para todo o Brasil. "A paixão intensa pelo futebol, as viagens, a convivência com os jogadores e todo o mundo dos esportes foram algo fantástico que aconteceu na minha vida", diz.

Mas Clóvis também viveu uma grande provação em sua carreira, que quase o fez desistir. Seu chefe, na época, era Pedro Carneiro Pereira, que, além de narrador de futebol, era piloto automobilístico, e competia em Tarumã. "O Pedro era o nosso grande ídolo. Com ele, eu comecei a ganhar oportunidades", confessa. E foi numa destas chances, na tarde de domingo de 22 de outubro de 1973, enquanto cobria o Campeonato Brasileiro Divisão Turismo, em Tarumã, que o jovem-repórter presenciou o acidente automobilístico no qual Pedro Pereira foi vítima fatal. Clóvis, que se emociona ao recordar, precisou entrar ao vivo para noticiar o fato que, segundo ele, marcou sua vida profissional para sempre. "Registrar a morte da pessoa que me deu uma chance, e foi quem me levou para a Rádio Guaíba foi horrível, não gosto nem de lembrar". Como não conseguia falar devido à forte emoção, o jornalista foi substituído pelo colega João Carlos Belmonte. "O profissional foi superado pela fraqueza humana e felizmente eu nunca mais voltei a Tarumã", desabafa.
Conciliando esporte e política

Paralelamente à rádio Guaíba, ele também conciliava, desde sua formatura, o trabalho na Radiobrás, empresa pública criada em 1975 para gerir de maneira centralizada todas as emissoras de rádio e televisão do governo brasileiro espalhadas pelo país. Clóvis trabalhou até 2000 fazendo as coberturas políticas, como as vindas de ministros e presidentes da República ao Estado e aos países do Mercosul. Na Radiobrás, uma de suas atividades era fazer a sinopse empresarial com as principais notícias do Estado para apresentar ao Presidente. Cada repórter de sucursal enviava este material para Brasília, e lá uma equipe fazia um dossiê e entregava ao chefe do país no café da manhã, mas isto era muito trabalhoso e ele confessa que não sente saudade alguma.

Com a fundação da TV Guaíba, em 1980, foi convidado por Armindo Antônio Ranzolin, que se tornou seu chefe na rádio após a morte de Pedro Pereira, a integrar a equipe, e lá trabalhou por sete anos. Com a mudança de governo, o presidente Fernando Collor exigiu dedicação exclusiva na Radiobrás, o que levou o jornalista a abrir mão do trabalho na TV. Após 13 anos, já no governo de Fernando Henrique Cardoso, Clóvis foi convidado para trabalhar em Brasília, mas disse não. A justificativa foi de que não iria para lá sozinho e deixar família sua em Porto Alegre. Preferiu sair da emissora e seguir sua vida na Capital.

Nesse tempo, Clóvis já tinha trabalhado na TV Guaíba, e apresentado um programa de esportes na TV Bandeirantes, ao lado do jornalista Carlos Frederico Matzembaker. Com tanta experiência, ao sair da Radiobrás Clóvis foi intimado pelo amigo e deputado Augusto Nardes a ajudar sua filha Cristiane Nardes na apresentação do programa Espaço Empreendedor, do canal 20 da Net. "Não tive como recusar e foi uma das melhores coisas que já fiz". O programa consistia em entrevistar um empresário de micro ou pequena empresa, que narrava suas histórias e mostrava sua trajetória de sucesso. Com a mudança da jornalista Cristiane Nardes para Brasília em 2004, o programa foi extinto.

Desde então, Clóvis dedica seu tempo às partidas de tênis no Clube doComércio, ao lazer e a família, mas diz que nada o impede de participar de algum projeto semelhante ao Espaço Empreendedor, só que ainda não surgiu algo deste tipo. "Às vezes sou convidado para participar de alguns programas e o faço com o maior prazer". Hoje, o que ele não faria mais é trabalhar com futebol, pois sábado e domingo passou a ser sagrado para estar com a família e os amigos. "O que eu mais sentia falta na época em que trabalhei com esporte era de ter tempo para curtir e aproveitar meus filhos". Com certo desconforto, desabafa que muitas vezes chegou em casa e a festa de aniversário das crianças já havia acabado e elas estavam dormindo. Isto o incomodava bastante. Mas, mesmo assim, destaca que considera o jornalismo esportivo uma profissão maravilhosa, que ensina muito e onde não existe rotina.
Um tenista assíduo

Na sua rotina atual está a dedicação ao tênis, esporte que já pratica há 22 anos no Clube do Comércio, e as caminhadas no Parque Marinha do Brasil. "Jogo todos os dias, com a turma da manhã e da tarde", diz orgulhoso. O tênis, em sua opinião, é um esporte de quem encara a vida numa boa. "É uma possibilidade de adquirir qualidade de vida, de ter um pouco de individualidade e de estar em paz", explica.

O jornalista é casado há 35 anos com Maria Beatriz Ribeiro. Moradores desde a infância do bairro Menino Deus, Clóvis conta que conheceu a companheira pelas redondezas do bairro. Na época, os encontros só podiam ser na quarta-feira, que era o dia do sofá, no sábado, nas reuniões dançantes, e aos domingos, pela manhã na missa e depois no almoço na casa dos pais dela. Após namorarem por oito anos, casaram-se e foram morar na Avenida Ganzo, no mesmo bairro. Da relação tiveram dois filhos, Cíntia, que hoje está com 32 anos, e Thiago, que tem 29 anos, ambos advogados. Assim como a mãe que cursou Direito, mas nunca exerceu a profissão, pois optou por ser mãe e cuidar dos filhos.

Considerando-se um homem caseiro, ele diz que gosta de ir para casa após o clube para conversar com o filho e com a esposa. Citando a música de Elis Regina, explica que "ainda somos os mesmos e vivemos como os nossos pais", e completa dizendo que tudo o que o pai o ensinava na época em que era adolescente, acaba repetindo hoje com os filhos.
Amigos feitos, amigos preservados

Os amigos de hoje são os mesmos da infância, e o Clube do Comércio continua sendo o grande referencial de todos. Clóvis destaca que voltaram a viver onde cresceram e que preservam isto com o churrasco da quinta-feira, que é realizado há mais de 30 anos, e com as partidas de tênis no sábado à tarde. A facilidade de fazer amigos e de conservá-los é, para ele, uma de suas principais qualidades. Já a emotividade e sensibilidade são apontadas como defeitos, que já tentou superar por muito tempo, mas hoje aprendeu conviver.

O gosto por filmes antigos, da década de 50, que trazem mensagens positivas, e as leituras de revistas e livros que falem de incentivo e autoajuda são algumas das coisas que fazem bem para sua alma. "Procuro fugir de tragédias e de coisas que não fazem bem", declara. Os planos para a próxima década são: continuar com a família reunida, jogando tênis e com a mesma garra que tem de viver.

Grato a tudo que conquistou na vida, ele confessa que ainda tem esperança de apresentar um programa de esportes na televisão para, assim, encerrar sua carreira com "chave de ouro". Para Clóvis, quem vence na vida é quem não desiste e luta pelo que quer: "Acreditar no teu sonho e tocar para frente já é meio caminho andado, pois a chave do sucesso é fazer qualquer atividade com amor".
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