Roger Lerina: Do Bonfa para o mundo

Este seis de setembro marca o 35º aniversário de uma figura controvertida, o jornalista Roger Lerina, titular da contra-capa, uma das páginas mais lidas

Roger Lerina - Reprodução

Este seis de setembro marca o 35º aniversário de uma figura controvertida, o jornalista Roger Lerina, titular da contra-capa, uma das páginas mais lidas da Zero Hora. Guri de cidade grande, Roger Lerina Ferreira nasceu e cresceu em Porto Alegre. Criado no Bom Fim, da infância não tem grandes lembranças, além dos jogos de futebol e taco com os amigos da 'zona'. Desde pequeno, sempre gostou de circular pelas ruas e ir para a Redenção. Na juventude, o 'point' eram os bares da Osvaldo Aranha. "Não éramos bagunceiros, nem uma gang, mas sempre estávamos em turma", recorda. O interesse por coisas e pessoas transpareceu cedo. "Sempre pendi para a área de humanas. Não conseguiria fazer nada ligado a exatas. Para estas coisas, sou uma negação. Sempre gostei de história e literatura", destaca.

A escolha

Acredite se quiser, mas hoje Roger Lerina poderia ser um advogado, um historiador ou, até mesmo, um sociólogo. Teria sido mais feliz? Ele acredita que não. A escolha pelo jornalismo chegou aos 45 minutos do segundo tempo, quase na hora de marcar a opção profissional na ficha de inscrição da UFRGS, onde ingressou aos 16 anos de idade. "Pensei em fazer Direito, depois vi que ficaria muito preso à 'coisa técnica' e não era o que queria. Depois fiquei dividido entre História, Ciências Sociais e o Jornalismo. Fui eliminando até ficar com jornal e não me arrependo", conta. Nesta época, a mãe, pedagoga, trabalhava como professora do Estado. "Ela era a tia do SOE", brinca. O pai era militar. Ambos apoiaram desde o começo a escolha do filho.

Início sangrento

Cyro Silveira Martins Filho (hoje gerente geral do Diário Gaúcho) havia se transferido do curso de Direito para o de Jornalismo e estava procurando pessoas para trabalhar no semanário Metrô, do grupo editorial Guaíba, que circulava nas estações da Trensurb. Era 1986, Roger estava no segundo semestre, recebeu o convite do amigo e não hesitou. "Foi meu primeiro emprego", recorda, sem esconder a nostalgia. As matérias não eram vinculadas com o metrô e a equipe, formada por estudantes de jornalismo, entre eles Alexandre Bach e Delorgel Kaiser, fazia ronda nas delegacias de Canoas, Esteio e outras DP's para pegar o boletim de ocorrência e descobrir fatos que pudessem interessar aos leitores. "Pegávamos as histórias mais curiosas, ornamentávamos um pouco mais e fazíamos títulos canalhas", conta, dando gargalhadas.

Novas oportunidades

Depois de um ano, o semanário fechou e Roger foi trabalhar no jornal Repórter, que gerou o Metrô, onde ficou por seis meses. Em seguida, apareceu uma vaguinha no copidesque, da Zero Hora, e foi lá que Roger adquiriu grande experiência no jornalismo. "Ali recebemos todas as informações que vêm de fora da ZH, agências de notícias, tvs a cabo, satélites e telefotos. Tudo passa por ali. Você conhece pessoas e fica conhecido. Isso é importante", pensa ele. Depois de um ano nesta função, decidiu dar uma guinada na vida. Trancou a matrícula da faculdade e, com uma sócia, abriu dois salões de cabeleireiros em Porto Alegre, que inovaram pelo vanguardismo: o Barber Shop.

O ano era 1989 e o que existia eram barbearias para os homens e salões de beleza para mulheres. O diferencial do negócio fez o sucesso. "Estava no meio do curso e bastante desestimulado. Era uma época em que os salários da imprensa eram ruins. Aliás, ainda são, mas naquela época conseguiam ser pior. O clima era estranho e preferi me afastar", conta. A falta de proximidade do que era feito no jornal com o que era ensinado na UFRGS também incomodava Lerina. "Tenho boas lembranças das amizades que fiz, da camaradagem que rolava com colegas e professores. Mas era um horror. Havia uma distância muito grande entre o que era ensinado e o que era praticado, sem falar da falta de cobrança e do desinteresse, tanto de alunos, quanto de alguns professores. Voltei um tempo depois, para concluir o que já havia começado e em 1995 me formei, mas não deixei de lado o Barber Shop".

O retorno

Roger Lerina sempre teve muitos amigos no meio, como o jornalista Tuio Becker - até pouco tempo atrás crítico de cinema da ZH. "Sempre gostei muito de cinema e estava sempre por lá. Quando ele saía de férias fazia um free-lancer, escrevendo comentários e fazendo apresentação de filmes". Foi aí que Roger começou a tomar gosto, novamente, pelo jornalismo. "Eu disse: estou a fim de voltar. Se pintar alguma coisa, me avisa". E pintou. Surgiu um free-lancer para trabalhar na página de TV, organizando as grades de programação das emissoras e as sinopses dos filmes. "Era braçal, mas tinha o lado bom: estava de volta, dentro da redação".

Em abril de 1999, surgiu a oportunidade que queria. Mariana Kalil, que na época fazia a contra-capa, aceitou uma proposta da revista Época e se mandou para São Paulo. As editoras do Segundo Caderno e do Caderno de Variedades sugeriram para o diretor de redação Marcelo Rech o nome de Roger Lerina, por acreditarem que tinha o perfil certo para assumir a página. "No início ele disse: vamos testar. Você assina por três meses como interino. Caso não se adapte ou não goste, não tem problema, não ficaremos trocando de nome toda hora", recorda. Mas deu tudo certo, tão certo e ele já é o 'cara' e a 'cara' da contra-capa há quatro anos. O resultado é que, depois de se firmar no jornal, deixou a sociedade do Barber Shop.

Jornalista de fato

Roger gosta de divergências. A contra-capa pode ter uma nota sobre uma banda punk, ao lado de outra sobre um espetáculo de tango, com uma mulher seminua e um livro infantil. "Não é preciso ser chato na hora de escrever. É legal saber o que está acontecendo dentro da Ospa, os projetos do MARGS, entre outras coisas. E isso não está restrito ao Caderno de Cultura. Me esforço para que as pessoas vejam que, por mais que brinque, faço com seriedade e conteúdo. Não falo levianamente". Hoje, mais seguro do que nunca das escolhas que fez, não pensa em fazer outra coisa.

Quando questionado sobre outra profissão que gostaria de ter diz: poderia ser algo ligado à criatividade, mas não tenho nenhuma; poderia ser alguma coisa relacionada com a música, mas não toco nada e nem tenho ouvido para isso; poderia ser com o cinema, mas não tenho talento para contar histórias, prefiro ouvir a dos outros. É difícil pensar em algo que me desse tanta vontade de fazer, além do jornalismo". É, e a rotina de Roger Lerina está completamente ligada à profissão. Ele acorda às 7h da manhã, sobe o Morro Santa Tereza, diariamente, para fazer um comentário de 5 minutos sobre: cultura, variedades, o que está acontecendo e o que vai acontecer no programa Talk Show, da 102 FM. Depois disso, a próxima parada é na Zero Hora, onde fica até à noite. Muitas vezes, pela manhã, participa da 'cabine', uma sessão de cinema especial apenas para a imprensa, onde assiste filmes que ainda não foram lançados. "Não existe uma rotina, o que se tem como certo é que se vai trabalhar muito. E, na verdade, é disso que gosto".

Bem família

Acredite se quiser, Roger Lerina não gosta de festa e badalação. Programa para o jornalista é uma boa mesa de bar com os amigos, cinema, teatro e jantar fora. Separado, com uma filha de 5 anos chamada Pilar, procura aproveitar seu tempo livre com a pequena. "Vejo-a, praticamente, todos os dias. Ela dorme na minha casa, no mínimo, duas vezes por semana, além de passarmos o sábado todo juntos", frisa. O superpai sabe da deficiência que existe no tempo que oferece para a filha e, para compensá-la, enforcou, até mesmo, o futebol de sábado com os amigos. Para ele, o nascimento de Pilar foi seu grande momento.

Roger Lerina é eclético nas preferências gastronômicas, nas artes plásticas, na literatura, na música, ou seja, em tudo. E, para ele, este é o segredo do sucesso. "É importante ser generoso com o mundo. Você tem que estar interessado, deixar as coisas chegarem e dar atenção para elas. Depois poderá julgar, descartar ou adotar. Me disponho a ver tudo, ouvir tudo, falar com as pessoas e tentar entender o que não conheço. Para um jornalista, isso é fundamental, pois, algum dia, este conhecimento servirá de subsídio para algum trabalho", afirma.

Crer ou não crer

Roger Lerina se considera um cético. Sem crenças, não acredita em filosofia de vida. Mas segue a ética de que quando se trabalha no que se gosta, não existe felicidade maior. "Tive muita sorte". Para o futuro diz que não tem planos, apenas deseja mais tranqüilidade profissional e emocional para vislumbrar as coisas com calma. "Gosto da movimentação, mas preciso disso. Não fico pensando no que vai ser amanhã. Vivo intensamente o meu presente".

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