Rogério Soares: Foco na foto

O fotógrafo e professor conta o que o levou a escolher a profissão e avalia os mais de 30 anos de carreira

Rogério Soares - Divulgação

A fotografia entrou na vida de Rogério Soares ainda na adolescência, quando já admirava imagens, especialmente aquelas aliadas ao Jornalismo. Das lembranças da época, traz a primeira câmera que ganhou, presente da mãe, Anilce Soares, hoje com 90 anos. "Eu devo ter falado alguma vez que gostava de foto e ela investiu", recorda. E foi assim que a luz se acendeu. O equipamento já tinha; faltava, agora, saber usá-lo.

Dos profissionais da área que o inspiraram, lista o húngaro Robert Capa, com suas fotos documentais; o francês Cartier Bresson, que, segundo afirma, "está na vida de todo fotógrafo"; e o alemão Helmut Newton, com imagens montadas. Ainda na juventude, recorria às revistas e aos livros sobre o assunto na extinta Livraria Globo, no Centro de Porto Alegre, sua cidade natal. "Era difícil de encontrar as melhores fotos, e nem tinha a quantidade de portfólio que tem hoje", explica, e acrescenta que desde lá estava certo de que seguiria na profissão. E mais: ambicionava chegar no Correio do Povo e em Zero Hora.

Estudou Jornalismo na Unisinos, sempre com foco na fotografia. Conta que, de tanto "infernizar" e se dedicar à área, cerca de dois anos depois de se formar, foi convidado para lecionar na universidade. Em 1987, deu início à sua história como professor. Enquanto lecionava na instituição de ensino do Vale do Sinos, chegou, por fim, a trabalhar no Correio do Povo e fez alguns trabalhos como freelancer para Zero Hora, realizando, então, o sonho de atuar nas duas empresas.

De mala e cuia

A primeira experiência surgiu quando recém havia se graduado, época em que estava sendo fundado o jornal Diário Catarinense, em Santa Catarina. O recrutamento, porém, foi feito no Rio Grande do Sul. "Eu e mais um bilhão de candidatos nos inscrevemos. Mas deu a sorte de eu ser o único a ter interesse na fotografia", informa. No entanto, sua estada em Florianópolis foi breve, pois logo foi transferido para a sucursal do impresso em Joinville, onde trabalhou no laboratório.

Voltou a Porto Alegre para dar aula na Unisinos, onde ficou por 16 anos. A passagem pela universidade acabou, porém ele seguiu na docência, passando por outras nove instituições de ensino, como Universidade do Vale do Itajaí (Univale), Universidade de Santa Cruz do Sul (Unisc), Uniritter, Universidade de Caxias do Sul (UCS), Metodista IPA Porto Alegre e ESPM-Sul. Atualmente, integra o corpo docente da Faculdade São Francisco de Assis (Unifin).  

Quando estava no Correio do Povo, foi honrado com um Prêmio ARI, concedido pela Associação Riograndense de Imprensa. A distinção reconheceu uma fotografia referente a uma matéria da editoria de Polícia, sobre o assassinato de um policial da Brigada Militar. "Cheguei ao necrotério no mesmo momento que o pai do brigadiano. Como ser humano, é uma imagem muito triste, mas para a profissão, a cena merecia ser registrada", avalia. Rogério clicou o momento em que o pai abraçava o filho sem vida.

Outro momento marcante na profissão foi o caso do motim ocorrido em 1994, quando Dilonei Francisco Melara e Fernandinho fugiram do Presídio Central com outros criminosos e alguns reféns. A história, para ele, é, ainda, uma das mais emblemáticas.

Aprendizado e realização

Aprendeu a mexer na máquina que ganhou de presente da mãe em um curso do Senac. E o fusca, presente do pai, João Soares, atualmente com 92 anos, foi vendido para, com o dinheiro, montar seu primeiro laboratório. A fim de adquirir experiência e conhecimento, bateu na porta da agência Objetiva Press e pediu para trabalhar lá, mesmo sem receber salário. O pagamento seria o ensinamento. Durante cinco anos, também administrou a própria escola de fotografia Imago - imagem em Latim -, em Porto Alegre.   

Uma reviravolta na vida de Rogério aconteceu em 2014, quando foi diagnosticado com diverticulite e, assim, viu-se em uma situação complicada. Na época, era professor na Uniritter. Quando saiu do hospital, usando uma bolsa de colostomia, refletiu que era hora de tirar o pé do acelerador.

É realizado com a profissão e não saberia escolher outro ofício, se não fosse fotógrafo. "Sei que este mercado é difícil, é uma profissão complicada. Conheço, inclusive, muita gente que desiste na primeira tentativa. E é uma brincadeira cara. Mas sou realizado porque foi a fotografia que me sustentou. Vivi daquilo que eu sempre gostei de fazer", analisa.

Além de lecionar na Unifin, administra o Café do Avesso, na Rua da República, em Porto Alegre, empreendimento familiar que abriu há cerca de um ano e meio. A iniciativa surgiu em virtude do amor que ele e a esposa, a jornalista Cláudia Heinzelmann, têm por cafeterias. E divide as funções no espaço com os filhos Matheus, de 27 anos, e Luiza, de 20. A dupla, aliás, seguiu os passos dos pais e escolheu a área da Comunicação para se especializar. O primogênito se formou em Produção Audiovisual, e a caçula estuda Jornalismo. 

Rogério e Cláudia se conheceram ainda na faculdade, onde eram colegas, mas ele conta que nem se falavam nas aulas, pois "eu sentava em um lado da sala e ela em outro". A aproximação se deu quando, juntos, entregaram um trabalho de uma cadeira, pois eram os únicos que ainda não haviam completado a tarefa. "Começamos a conversar e estamos conversando até hoje", brinca, referindo-se à relação que já contabiliza 36 anos, 31 dos quais estão casados.

Entre um café e outro...

Vai todos os dias para o café, de domingo a domingo, logo, o tempo em casa é escasso. Nas horas vagas, quando não está trabalhando, gosta de ficar no computador, sempre mexendo nas tão preciosas fotos. Usa bastante o Facebook, onde posta diariamente algumas imagens antigas, como, por exemplo, da primeira montagem do tradicional espetáculo teatral Bailei na Curva.

Lê menos do que gostaria, mas tenta se atualizar especialmente no que se refere a biografias, seu gênero preferido. Dos que lembra, leu os dois exemplares do apresentador Jô Soares, a autobiografia da cantora Rita Lee e na mesa de cabeceira está a obra que conta a vida da falecida Hebe. "Essas histórias me fascinam", cita.

É fã da atriz norte-americana Marilyn Monroe e lamenta que ela tenha partido quando ele nasceu, em 1962. "Acho ela uma mulher linda e gostaria de tê-la fotografado. Quando fui no Museu de Cera Madame Tussauds, em Nova Iorque, tiveram que me arrancar da estátua dela", diverte-se.

Na música, gosta de Bossa Nova e MPB das antigas e é apaixonado pela extinta banda Os Almôndegas, de onde saíram Kleiton e Kledir. Na lista ainda está Kid Abelha, que, inclusive, fotografou shows da banda, quando ela passou pela capital gaúcha. Também registrou cantores como Marisa Monte e Nei Lisboa, e a apresentação de Bibi Ferreira como Piaf na reinauguração do Theatro São Pedro, em 1984.

O diretor cinematográfico Quentin Tarantino é seu predileto. "Ele sabe a que veio", comenta, dizendo que admira como ele trabalha a narrativa, a fotografia e o enquadramento em seus filmes. Aliás, recentemente, assistiu ao último lançamento do cineasta, 'Era uma vez em Hollywood', que entrou nos cinemas neste ano.

Crenças e contribuição

Não cozinha nada, mas se viu obrigado a aprender a fazer café. "Até faço comida, mas não recomendo ninguém a comer. Porém, modéstia à parte, meu café é muito bom", brinca. Mas quando o assunto é provar pratos alheios, a culinária italiana é sua predileta.

É avoado, nervoso e ansioso, características que julga como defeitos, mas que são tranquilamente explicadas devido à profissão. "Antigamente, demorava cerca de sete minutos para se ter uma imagem, que poderia nem ficar boa para ser usada no jornal", recorda. Sua maior qualidade, contudo, é facilmente revelada: gosta de pessoas. "Quando fotografamos, guardamos um pouquinho de cada um."

Diz-se um gremista fajuto, pois futebol é algo que não o prende. "Uma vez disseram que torço para o Grêmio e acreditei, mas se perguntarem quanto foi o jogo, não faço a menor ideia", confessa. Aliás, isso foi um problema quando tinha que fotografar partidas de futebol, pois precisava sempre perguntar para os colegas quem era o craque e quem devia ser fotografado, "senão, tirava foto do gandula".

Longe da profissão, também não é fã de esporte e se intitula um sedentário de carteirinha. Até gosta de caminhar, porém não o faz tanto quanto gostaria. O que ajuda é o café, que tem dois andares. "Estou craque em subir e descer escadas." É católico só no papel, pois não pratica nem frequenta a igreja. Entretanto, sem dúvida, tem suas crenças e simpatiza com o espiritismo. Crê em reencarnação e tem a certeza de que, um dia, reencontrará os irmãos Helena e João, já falecidos.

Gêmeo bivitelino do arquiteto Roberto, Rogério se diz um sujeito em paz com a vida. Além de ser realizado profissionalmente, acredita que alcançou seus objetivos porque, apesar de ter uma vida corrida como todos, sente-se feliz em ter criado bem seus filhos. "Acho que é a realização de todos os pais", define. "Fotografei muito, e isso é um prazer danado, pois eu vou embora, mas essas imagens vão ficar, graças a Deus. De certa forma, dei minha contribuição."

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