Zé Pedro Goulart: A bordo de um Zeppelin

Após uma temporada na faculdade de Geologia, Zé Pedro Goulart decidiu mudar de curso e matriculou-se em Jornalismo, profissão do pai

Zé Pedro Goulart - Reprodução

"É difícil ter 18 anos e precisar decidir todo nosso futuro", explica. O motivo que o levou a escolher o Jornalismo - gostava de escrever - parecia mais consistente do que o que o levou a optar pela Geologia - achava bacana. Mas esse ano que Zé Pedro passou no curso errado, lá pelo final dos anos 1970, não foi uma grande perda. Logo que iniciou a outra faculdade, conseguiu um estágio na TVE, emissora onde passaria quatro anos trabalhando e sairia formado, após ocupar o cargo de diretor de Produção e de Programação. "Eram outros tempos", lembra, "podíamos fazer uma série de experimentações, o que quiséssemos. A imagem era preto-e-branco, não tinha audiência nenhuma, as coisas eram muito amadoras". Então, Zé Pedro entendeu que acabara seu ciclo na emissora e foi fazer cinema.

Seu primeiro curta-metragem, 'O dia em que Dorival encarou a guarda', dirigido junto com Jorge Furtado, ganhou oito Kikitos, no Festival de Gramado de 1986. "O filme foi uma espécie de divisor de águas no cinema brasileiro da categoria", conta. Graças a essa repercussão, ele ficou bastante conhecido no Rio Grande do Sul e não lhe faltaram convites para novos trabalhos, tanto em outras emissoras de televisão como em propaganda. "Daí, as coisas começaram a evoluir e eu pude me dedicar aos filmes para o cinema e para publicidade. Foi bom, porque propaganda sempre paga melhor." Naquele ano, o Grupo RBS ainda tinha uma produtora interna de filmes publicitários, a RBS Vídeo.

Zé Pedro entrou para a equipe e ficou até o fechamento da produtora, em 1990. Lá, conheceu uma série de pessoas que tinham interesse em montar uma empresa própria. Surgiu, assim, a Zeppelin, que hoje é dividida em quatro sócios e duas sedes: Porto Alegre e São Paulo. "No início, o pessoal era o mesmo da RBS, era praticamente a mesma produtora, só tinha mudado o logotipo", brinca. Hoje, Zé Pedro dirige a Zeppelin, que é, sem dúvida, uma das principais produtoras do País.

Porém, no início era apenas mais uma, em meio a um mercado local bastante desenvolvido. A diferença, segundo ele, é que, na época, era preciso sair do Rio Grande do Sul para continuar crescendo. "A gente exportou muita gente boa, que hoje faz sucesso em empresas do eixo Rio-São Paulo.

Não sei o por quê, mas o Rio Grande do Sul produz bem e a Zeppelin se destacar nesse meio, sem sair de Porto Alegre, é muito bacana", diz. Ele lembra que, embora tenha uma sede paulista, a empresa funciona, fundamentalmente, aqui. E que também faz cinema, mas a principal receita vem mesmo da propaganda.

O momento crucial da trajetória da Zeppelin foi quando a Pepsi a convidou para produzir um de seus comerciais, que seria rodado no Estado e veiculado nacionalmente. A produtora já havia se destacado pelos filmes do Zaffari, mas estes tinham - e ainda têm - apenas veiculação local. A Pepsi gostou do trabalho e a parceria voltou a se repetir outras vezes, dando repercussão à Zeppelin em todo o País. É da produtora, inclusive, o filme que deixou Daniella Cicarelli famosa, no qual ela beijava um garoto que bebia Pepsi na praia. Outras campanhas que Zé Pedro considera importantes, além das do Zaffari e da Pepsi, são para: Universitário - a ação desenvolvida em meados dos anos 1990, mesmo sendo local, foi conhecida mundialmente de pois de ganhar o Clube de Criação de São Paulo e entrar para a short list do Festival de Cannes -, RBS, Volkswagen, Nokia e Skol. Zé Pedro lembra que este último foi eleito o Cliente Mais Desejado, numa pesquisa do Meio e Mensagem. "Se o cliente mais desejado é nosso cliente, então estamos bem", gaba-se o profissional, que também foi escolhido o Diretor mais Desejado, pela mesma pesquisa.

Um diferencial entre o trabalho da Zeppelin é que a produtora mantém sua identidade. "100% dos nossos comerciais são feitos na Região Sul e contam com atores locais", afirma Zé Pedro. Não é difícil, nos filmes da Zeppelin, mesmo em campanhas nacionais e premiadas - como a da Nokia -, encontrar amigos e cenários gaúchos. Para o produtor, isso tem um papel muito importante para a cultura brasileira: "É fundamental que haja outras regiões na televisão, além de Rio de Janeiro e São Paulo. O Brasil não se resume a esse eixo", explica. Na área de cinema e projetos especiais, a produtora também se destaca. Neste ano, ganhou, por unanimidade, o prêmio de Melhor Documentário, no Festival de Gramado, por 'O Cárcere e a Rua', de Liliana Sulzbach. "Esse filme é muito bacana e teve o patrocínio do Sundance [fundação de Robert Redford para o cinema independente]. Certamente ainda vai nos dar muitas alegrias", diz Zé Pedro animado. No seu currículo como diretor de cinema, está um episódio do longa-metragem 'Felicidade é?' e o premiado curta 'O Pulso'.

A Zeppelin também produz muitos videoclipes e está realizando agora dois grandes projetos em DVD: um com os personagens de 'Tangos e Tragédias' e outro sobre o escritor Erico Verissimo, que completaria 100 anos em 2005. Um reconhecimento ao seu trabalho se deu com a indicação de seu nome, pela quarta vez, a Publicitário do Ano, por parte do Conselho dos Publicitários do Ano. Zé Pedro lembra que o título nunca foi dado, no Rio Grande do Sul, para um profissional que atue na área de produção, apenas para publicitários de agências ou veículos. "Embora não seja um publicitário de formação, nem de agência, isso não me tira a pecha, afinal de conta eu trabalho com Publicidade e Propaganda." Mas ele esclarece que o fato de o mercado tê-lo indicado para concorrer já é um grande prêmio. "Não sou eu quem me candidato. Então, o fato de indicarem meu nome para Publicitário do Ano já está ótimo. Em todos os anos, as pessoas vêm me consolar depois da festa, como se eu fosse perdedor. Dizem: 'Poxa, que pena, o cara não merecia tanto quanto tu'", brinca. "O importante foi que representei uma gente legal, que é todo o pessoal de produção: fotógrafos, músicos, diretores", ressalta.

Ele também foi reconhecido como cronista. Seu livro, 'Confissões de um comedor de xis', coletânea de textos que escreve em Zero Hora, também foi indicado ao Prêmio Açorianos. Com a estrutura da qual dispõe hoje na Zeppelin, a rotina de trabalho de Zé Pedro e sua equipe foi muito facilitada. "Antes, tinha que ir para São Paulo para finalizar os filmes, ficava uns três ou quatro dias. Era um saco", recorda. "Ainda há coisas que precisam ser feitas fora, mas é pouco. Estamos muito mais independentes." Assim, sobra tempo para as coisas que gosta de fazer na sua vida pessoal: ir ao estádio torcer para seu time, o Grêmio, ler, ir ao cinema. Mas sua maior diversão é cuidar da filha de um ano e três meses, a Paris, "que é a coisa mais linda do mundo", diz o papai orgulhoso.

E agora ele tem mais tempo para isso, pois seleciona mais seus trabalhos. "Não quero ser pedante, mas ralei muito para chegar num ponto em que as agências querem trabalhar comigo. Então, me dou ao direito de escolher com quais agências quero trabalhar."

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