Pelo direito à dúvida

Por André Machado, para Coletiva.net

Estou pensando em fundar um movimento. Ele ainda não tem um manifesto escrito, mas tem um nome. Movimento Nove de Junho (9-J). A escolha é uma homenagem ao dia da publicação pelo The Intercept Brasil das conversas no Telegram entre o Sérgio Moro e o Deltan Dallagnol, que todos os leitores sabem quem são. Neste dia, foi colocada a gota d'água no meu limite com a estupidez humana que quer não apenas policiar, mas controlar o nosso pensamento via redes sociais.

A base do Movimento 9-J é o direito de não ter uma opinião definitiva sem um conjunto razoáveis de informações. É não ser contra ou a favor de algo de acordo apenas com os personagens envolvidos na trama. É nunca ter chamado o ministro de Super Moro, mas não avalizar a #MoroPreso. É poder ver o interesse público da reportagem, sem sair postando #LulaLivre ou #EuApoioaLavaJato, como um salvo conduto de práticas que não são adequadas de uma parte ou de outra. É saber que críticas pontuais à Lava Jato não constituem uma defesa da corrupção.

No dia seguinte, publiquei uma sequência de posts no meu twitter (@andrelmachado) que dizia o seguinte:

"A defesa cega da Lava Jato, neste momento, se aproxima da defesa cega de Lula. Todos sabem que fizeram cagada, mas é preciso manter uma posição para não perder o discurso. No mínimo, os diálogos não são éticos com um processo em andamento. Não pode um juiz trocar mensagens, orientando uma das partes ao longo de um processo, especialmente com a dimensão do caso em tela. Tratava-se de um ex-presidente da República. Juiz não pode auxiliar defesa ou acusação. As sentenças de Moro foram confirmadas em instâncias superiores, o que mostra que não são frágeis. O comportamento revelado nas mensagens, aliado à ida do ex-juiz ao ministério sob promessa de vaga no STF transforma o Super Moro em um homem normal. A força-tarefa da Lava Jato e o ministro dizem que são vítimas de um crime. É fato. Seus celulares foram invadidos. Mas a opinião pública não tinha o direito de saber detalhes de conversas não republicanas de figuras desta relevância?"

Transcrevendo o que escrevi, só vejo sensatez, prudência e senso de justiça. Não foi, no entanto, o que passaram a usar os internautas. Pelo lado da esquerda radical passei a ser tratado como "uma decepção" e como o "jornalista que está se afundando".  Por certo teriam outra visão se eu embarcasse na canoa fácil de que tem que tudo ser anulado e que "está comprovado" que nunca existiram provas. É importante lembrarmos que Lula é a principal figura presa na Lava Jato, mas não a única. Com seus erros e acertos fez muito mais bem do que mal ao País.

No sentido contrário fui chamado, pejorativamente, de "isentão". Como alguém que aproveitasse um passo em falso desta onda conservadora que julga vai moralizar o País para deixar transbordar a "esquerdopatia" que vive em cada um de nós.

Eu não aceito rótulos. O 9-J não aceita rótulos. O Movimento não é de esquerda, não é de direita e não é de amebas. Para participar do 9-J tem que duvidar, não acreditar em maniqueísmo, desejar o melhor para o futuro do Brasil sabendo que ninguém tem a receita certa. Tem que ser alguém interessado em buscar consensos. O 9-J é um movimento a favor da dúvida.

André Machado é jornalista.

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