Até quando repórteres de torcida?

Por Rodrigo Ramos, para Coletiva.net

Mantemos a tradição do "fala, povo!" nas transmissões de futebol no rádio gaúcho. Para não exagerar, diria que 90% das intervenções nada acrescentam. Hoje, com as mídias sociais, é muito mais fácil filtrar boas opiniões de torcedores e mesmo causar impacto de RP através dessas ferramentas.

A verdade é que o exercício dessa função é uma grande loteria. Por vezes não há o devido tempo para selecionar um entrevistado e rezemos para que não se escolha um bêbado, alguém que não goste do meio de comunicação que estamos representando, etc. Se não falar nenhum palavrão ou não antagonizar os homens das cabines já é lucro.

Conheço dois profissionais que tiveram sucesso na função de repórter de torcida, João Garcia e Luciano Périco, no mais a maioria viveu suplícios. Nem mesmo destes dois eu tenho certeza de que gostavam de realizar a função. Garcia, logo alçou outros voos e Périco que mesmo era ser setorista, acompanhar treinos, dar informações e no fim virou narrador, graças à popularidade obtida nas arquibancadas. Mas são dois cases em uma centena de profissionais que passaram e ninguém recorda e eles preferem, de fato, que isso não seja lembrado.

Duas das minhas realizações mais importantes no rádio só ocorreram por eu ser, ou estar, repórter de torcida, a cobertura das quartas de final e da final da Copa Sul-Americana em 2008. Por causa do sucesso colorado conheci La Bombonera e estive em La Plata, com tudo que pode advir de passar mais de 24 horas em um ônibus cheio de torcedores. 

Houve justo destaque para as violências cometidas contra as repórteres Camila Diesel, Laura Gross e Renata de Medeiros. Mas a verdade é que a função é arriscada seja para quem for, mesmo para os identificados com os clubes. 

Dou um exemplo dessa violência. O hoje comentarista da Band e presidente da Aceg, Alex Bagé, foi hostilizado, agredido verbalmente e teve um boné roubado antes de uma partida do Grêmio no Olímpico, em 2008, quando atuava pela Guaíba. 

O motivo? O boné, em que pese fosse azul, era do Santos. Torcida com a qual integrantes da Geral se desentenderam em uma excursão ao litoral paulista. Lógico que o Bagé não sabia do ocorrido. Mas vá tentar racionalizar com a paixão dos "torcedores". E olha que para quem conhece o profissional pessoalmente sabe que ele é um armário de tão forte.

Fala aqui alguém que já quase apanhou nas arquibancadas do estádio do próprio time. Os profissionais poderiam ser usados em outras funções, para trazer informações que realmente acrescentassem. 

Aquela velha função do repórter que ficava grudado nos dirigentes e conselheiros importantes, durante os jogos, eventualmente intervindo se necessário fosse, é muito mais relevante, principalmente em momentos de crise do que o cara que ouve o torcedor. 

Pois, convenhamos, além do risco, boa parte das vezes, também em momentos turbulentos, há opiniões viciadas ali, que sofrem pelas parcialidades da vida política do clube. Não representando a maioria dos torcedores.

Enfim, até quando?

Rodrigo Ramos é comunicador e escritor, com mais de uma década de atuação no rádio esportivo.

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