O Jornalismo perdeu a graça

Por Gilberto Jasper, para Coletiva.net

Está muito chato fazer Jornalismo. Qualquer trocadilho ou ironia é apagar incêndio com gasolina. Além do julgamento sumário - é "do bem" ou "do mal" de acordo com a concordância irrestrita ou não do ponto de vista do leitor/ouvinte/telespectador/internauta -, exercer o direito à opinião ou a simples informação é correr até risco de extinção do mercado de trabalho.

A liberdade de escrever colide com a incapacidade de tolerância que assola o mundo. Não existe espaço para o equilíbrio, o sopesar argumentos. Vale, na realidade atual, "quem" falou e não "o que se falou". Dependendo da fonte ninguém passa do lide. "Ah... é do fulano. Só pode estar apoiando o fulano". Simples assim.

O mais grave é que nós, profissionais da comunicação, temos parcela de culpa. Além do acovardamento de alguns, cada vez mais colegas vestem a camiseta de A ou B. Ignoram o preceito básico da imparcialidade. Esta postura não se restringe às redes sociais, onde se admite dar vazão a preferências pessoais. É de lamentar que a produção de conteúdo informativo careça de equilíbrio e espaço idêntico para ponto e contraponto.

Fico estarrecido com as paixões avassaladoras que tomaram conta do nosso mercado, notadamente a partir das eleições de 2018. De um lado, uma amnésia conveniente para deletar o passado recente que afundou o País. De outro, um messianismo doentio, de aprovação incondicional mesmo diante de inconfessáveis tropeços, inclusive éticos.

Já tivemos pleitos renhidos antes, mas nunca se registrou tamanha divisão que soa irreconciliável. As cobranças, comparações e críticas são preceito da prática democrática, mas o debate precisa ser elevado e ser pautado pelo respeito.

Ser um jornalista imparcial é um atestado de omissão. Trabalhar com coerência e maturidade soa como fraqueza e covardia. Perdeu-se a capacidade de abstração da paixão ideológica. A exceção, hoje, é fazer informação bem apurada, com equilíbrio nas tintas e amplo direito ao contraditório.

Os espaços de opinião são sagrados, enriquecem o debate, mas são argumento contundente para rotular sejam quem for. "Tu precisa te posicionar, ser mais enfático, claro nas tuas opiniões", cobra a legião de fanáticos, quase tangidos como gado por líderes despreparados, corruptos ou omissos.

Fazer Jornalismo sempre foi uma profissão de risco, inclusive físico, mas nossa atividade adernou, fazendo água neste mar de messianismo míope em que gritar e agredir vale mais que esgrimir argumentos.

Ser jornalista perdeu o charme comum das novelas da Globo nos anos 80. "Acolherar as pretinhas" gerava fama, belas histórias, a descoberta de personagens inspiradores. Apregoar o ódio soterrou o Jornalismo como instrumento de transformação social. Uma pena.

Gilberto Jasper é jornalista.

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