YouTube e Futebol: um caminho sem volta

Por Fernando Puhlmann, para Coletiva.net

13/07/2020 13:44 / Atualizado em 13/07/2020 13:42

De tempos em tempos, surgem revoluções na comunicação, e nós estamos vivendo uma agora, neste exato momento que eu escrevo e/ou você lê.

A revolução do YouTube!

Talvez não consigamos perceber o quanto ela é forte e o quanto está mudando o nosso dia a dia porque estamos imersos nela, fazemos parte da revolução. Nós somos os principais agentes desse movimento, mas, daqui a 20 ou 30 anos, vamos olhar para trás e falar: ?Eu ajudei a construir essa nova forma de consumir música, filme, notícia, conhecimento e futebol?. 

Sim, futebol. O YouTube chegou no futebol e agora não tem mais volta.

Ok, então tu acreditas que o YouTube vai tomar conta do futebol, que não vai mais existir TV aberta e nem fechada? Que cada clube vai transmitir o seu jogo e essa vai ser a salvação dos clubes?

Calma! Respira!

Não, não acho que as TVs vão parar de transmitir, mas acredito que tenhamos uma nova coexistência de transmissão por TVs e também por plataformas de streaming, sejam elas comerciais ou dos próprios clubes.

A medida provisória do Bolsonaro (não vou discutir aqui o motivo da criação, nem a sua seriedade) abriu uma porta e ela não vai fechar mais. Os clubes se deram conta de que podem transmitir seus jogos e, com isso, gerar uma receita até agora inédita nas suas tesourarias, e se tem uma coisa que todo mundo gosta (mas dirigente gosta mais ainda) é grana, dindin, bufunfa. E, se vier de uma receita inesperada, melhor ainda.

Porém, existem contratos a serem respeitados, MPs a serem aprovadas e o maior desafio de todos: a nossa banda de internet. Esses fatores farão com que os dirigentes, mesmo que empolgados com essa revolução, tenham que sentar, pensar, organizar e achar um caminho do meio, para não perderem os milhões que já recebem hoje das empresas de comunicação, não ficarem longe dos torcedores que não têm acesso a bandas maiores de internet, mas sem abrir mão dos novos milhões do streaming.

E tem como achar esse caminho do meio? Claro! Sempre existe um caminho do meio, ainda mais se isso envolve fortunas.

Eu aposto que:

A MP passa, todo deputado tem clube de futebol do seu coração e muitos do seu interesse eleitoral;

Os contratos de transmissão serão rediscutidos, as TVs pagarão menos do que pagam hoje, mas manterão TV aberta, TV fechada e Pay Per View e os clubes ficarão com os direitos sobre as plataformas de streaming;

 A banda de internet ficará cada vez mais ? barata? e aumentará a abrangência.

Mas, então, é final feliz para todos? Mais ou menos, e explico.

Os grupos de comunicação continuarão faturando, futebol é ouro em forma de suor na maioria dos países do planeta.

Os clubes grandes gerarão receitas até agora não percebidas e cada vez maiores. Poderão criar plataformas próprias e cobrar R$ 10,00 a mensalidade dos seus torcedores por conteúdo inédito de bastidores + os jogos ao vivo. Times como Grêmio e Inter poderão faturar perto de 60 MILHÕES a mais, anualmente, do que faturam hoje, se souberem criar estratégias inteligentes.

Porém, os clubes pequenos terão uma tarefa duríssima pela frente, pois os já tão desgastados estaduais, que são o trem pagador do ano da grande maioria destes pequenos lutadores, perderão praticamente toda a verba de TV, pois uma vez que os únicos clubes que geram grande audiência terão suas plataformas para seus torcedores, o interesse pelos direitos de transmissão perderá muito valor e eles não terão uma massa de torcida que possa compensar esse déficit.

Então, será o fim dos pequenos?

Não. Como tudo na vida, neste setor também existirão momentos de muito aperto, mas, com algumas adaptações, sobrevirão ?quase? todos.

Eu acredito que surgirão empresas terceirizadas, ou geridas pelas Federações (que também perderão receita neste formato), para coordenar as plataformas de streaming, próximo ao que acontece hoje com muitos canais de música. As empresas organizam as transmissões, bancam os custos para isso e ficam com uma parte do bolo, repassando aos clubes que pertencem à essa sociedade a outra parte arrecadada com patrocínios e mensalidades.

Só que para termos tudo isso que eu escrevo aqui, muita coisa precisa acontecer ainda, muita água vai passar por baixo da ponte do futebol brasileiro. São ajustes legais, financeiros e, principalmente, de relações humanas e comerciais que precisam acontecer, e isso são processos muitas vezes lentos e dolorosos, porém, na minha visão, sem volta.

O YouTube chegou, acenou com milhões e os clubes se apaixonaram pela possibilidade de serem donos de si mesmo.

Agora, basta ver se eles sabem realmente arrumar a casa e manter tudo limpo nessa nova relação, onde o clube produz conteúdo e entrega na palma da mão do seu apaixonado torcedor, literalmente.

Alguns vão espernear, mas o tempo é senhor da razão, já disse o poeta, muito antes dessa nossa revolução.

Avante!

Fernando Puhlmann é diretor da Cuentos y Circo.