Em um cenário em que vídeos falsos, vozes clonadas e textos gerados por Inteligência Artificial (IA) se misturam com produções humanas, uma pergunta ganhou urgência: como saber se o conteúdo que circula na internet é real? Na era da IA generativa, muito além de um valor simbólico, a autenticidade é uma infraestrutura tecnológica em construção.
Enquanto marcas e criadores buscam transparência para manter a confiança do público, a tecnologia começa a responder com ferramentas capazes de comprovar a origem de imagens, vídeos e áudios. A expressão da vez é a rastreabilidade digital, que cria um rastro de procedência para esses conteúdos. Também chamada de proveniência digital, ela consiste em documentar o histórico de um arquivo desde sua criação até a publicação. É por meio dos metadados de confiança que é possível registrar quem criou, quando, com qual ferramenta e se houve edições.
Ou seja, assim como um produto físico carrega uma etiqueta de origem, os conteúdos digitais também passam a ter uma espécie de rótulo de autenticidade que é visível e verificável. Contudo, vale ressaltar que esses metadados não definem se algo é verdadeiro ou falso. Eles apenas indicam quem é o autor, o que foi alterado e quando. É uma forma de dar contexto e transparência ao consumo de informação, especialmente em tempos em que a manipulação de mídia é praticamente indetectável a olho nu.
Coalizão para Proveniência e Autenticidade de Conteúdo (C2PA)
No centro dessa iniciativa está a Coalizão para Proveniência e Autenticidade de Conteúdo (C2PA), um protocolo aberto que começou com empresas como Adobe, Arm, Intel e Microsoft, e hoje conta com a adesão de mais de 1.500 organizações, incluindo Google, OpenAI, Leica e BBC. Na prática, esse padrão se materializa por meio das Content Credentials, que são uma espécie de assinatura digital que acompanha o arquivo e incluem informações como:
- Nome do criador e software utilizado;
- Data e local de captura;
- Histórico de edições;
- Uso de Inteligência Artificial no processo.
Além disso, a tecnologia permite adicionar selos de responsabilidade, como, por exemplo, se o autor autoriza ou não que seu conteúdo seja usado para treinar modelos de IA. Dessa forma, se o arquivo for alterado após a assinatura, o sistema sinalizará essa adulteração.
Quem já adota o C2PA
Uma das pioneiras do C2PA, a Adobe incluiu as Content Credentials em ferramentas como Photoshop, Lightroom e Firefly. A funcionalidade permite inserir a assinatura digital no momento da criação e verificar a autenticidade de imagens publicadas. Já a empresa óptica alemã Leica lançou a primeira câmera do mundo com certificação de procedência embutida: a M11-P gera arquivos com credenciais verificáveis.
O Google também anunciou suporte ao C2PA em seus produtos. Além disso, o YouTube iniciou testes para exibir um selo indicando se um vídeo foi capturado com equipamento real e se possui a certificação. Por sua vez, a Cloudflare integrou o recurso em seus serviços de hospedagem de imagens, permitindo que as credenciais sejam mantidas mesmo após o upload.
Desafios: adoção lenta e dilemas
Apesar do avanço, a adoção em larga escala ainda é limitada. A maior parte das plataformas sociais remove metadados dos arquivos por padrão, o que inviabiliza o rastreamento. Além disso, o C2PA precisa ser aceito de forma ampla por câmeras, softwares e redes para funcionar plenamente. Outro dilema diz respeito à privacidade, visto que registrar o local, o horário e o dispositivo de criação pode expor informações sensíveis do autor. É por esse motivo que o protocolo prevê níveis de granularidade, permitindo que o criador escolha o quanto quer revelar.
Para marcas, esta maior rastreabilidade pode ser a nova fronteira da reputação. Em um ambiente saturado por desinformação e conteúdo automatizado, adotar ferramentas de proveniência pode funcionar como um selo de transparência, demonstrando responsabilidade na criação e na distribuição. Empresas que produzem campanhas com IA, por exemplo, podem informar o que foi gerado por humanos e o que foi criado artificialmente ? gesto que, além de ético, reforça a credibilidade.
À medida que o conteúdo sintético se torna mais sofisticado, a capacidade de provar a origem será tão importante quanto o próprio conteúdo. Governos e entidades reguladoras já discutem políticas de rotulagem obrigatória de mídia gerada por IA e a rastreabilidade tende a se tornar requisito de confiança. Mais do que um avanço técnico, trata-se de uma mudança cultural: a credibilidade volta a ser algo que se demonstra, não apenas se declara. Em tempos de desconfiança digital, o desafio não é apenas criar mensagens autênticas, mas conseguir mostrar, tecnicamente, que elas realmente são.
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