Da linha tênue entre ética e oportunidade

Por Flavio Paiva

Com as novidades que estão surgindo no universo da biotecnologia, da tecnologia em si, de apps, de apps disfarçados, algumas coisas estão entrando em jogo e em cena.

Porque se pegarmos, por exemplo, a manipulação de DNA nos seres humanos (durante um processo de fecundação assistida, que é uma das possibilidades), entramos, primeiro, no campo da ética. Até que ponto podemos editar o DNA de pessoas, transformando-as (ao menos em teoria) em cidadão superiores, por exemplo, com características como estarem blindados a certas doenças, ou, ainda, terão característica de biótipo todas como superiores? Em diversos lugares do mundo experiências já estão sendo desenvolvidas e postas em prática neste sentido, concretizando (ao menos em tese) a raça ariana ou amarela (muitas experiências neste sentido são na China) ou tanto faz a cor, a origem e o devaneio.

Afora isto, empresas como planos de saúde dariam preferência (e possivelmente uma vantagem econômica) a estas pessoas, gerando uma categoria de "cidadãos de segunda classe" àqueles que ficaram de fora. Isto é ético? Ou pensaremos unicamente numa suposta evolução da espécie (como já vimos em muitos casos em nossa história, ao longo de séculos)? Qual será a ideia mais "eficiente", neste momento?

Não estou nem entrando na questão de se esta manipulação de DNAs será realmente positiva ou se acabaremos por criar pessoas supostamente superiores, mas que terminarão (com o passar dos anos) por mostrarem-se seres humanos frágeis e defeituosos, visto que esta possibilidade com o DNA é bastante recente (para a ciência, que precisa no mínimo de décadas para comprovar - ou não - se uma ideia realmente funcionou e não causou danos).

A fonte da juventude sempre foi uma fantasia (que hoje é posta em prática por pessoas mais velhas, em geral, que vão modificando seus corpos e querem se sentir mais jovens, custe o que custar) de boa parte da humanidade. Histórias e até mesmo expedições foram feitas nesta busca alucinada. E agora, então, que os seres humanos estão podendo viver mais, dá-lhes a impressão de que estão próximos da fonte. E brincando de deuses, é claro, o que gera um ainda maior sentimento de onipotência.

Há oportunidades para o marketing explorar estes sentimentos e fatos que narrei acima. Mas as oportunidades vão até a linha tênue. Se forem adiante de um limite, está deixando de tratar de oportunidades e passando a ser oportunista. Porque em troca destas ideias de manipulação de DNA para criação de indivíduos superiores, as pessoas farão (quase) qualquer coisa. Não foi à toa que foi criado o Superman, superherói indestrutível (afora a kriptonita). As pessoas (boa parte delas) estão em um verdadeiro desespero na busca de uma superioridade ilusória, de uma vida longa, jovem e bela (as pessoas, não necessariamente as suas vidas).

Empresas éticas saberão posicionar-se de tal forma que ofereçam benefícios sem ultrapassar esta fronteira? Na realidade, é um grande debate: como aproveitar oportunidades sem deixar de ser ético? Repito: as pessoas entregam seus dados, seus corpos (o que é manipulação de DNA, senão isto? Ou os corpos de seus descendentes, inclusive) e já há diversas pessoas entregando seus pensamentos para obter supostas vantagens. Qual o limite disto? Da consciência dos cidadãos e do posicionamento de empresas e governos frente a estes fenômenos?

Os dados já foram entregues (ou você lê o contrato de um app antes de dar o "aceito"?), gostos (exemplos: Spotify, Netflix). Juntando Big Data, IA, aprendizado de máquina e neurociência, as empresas e governos podem ir MUITO mais longe. É algo assustador se não for bem utilizado. Pense nisto.

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