Sussurros

Por José Antônio Moraes de Oliveira

" As palavras que sussuramos

nos fazem ser o que somos". 

Patricia Highsmith.

 

Existem palavras e frases que ouvimos quando jovens que estão destinadas a permanecer conosco para sempre. Elas ficam là, à espera do momento certo para aparecerem em nosso caminho.  Como aquela frase que li uma vez, no chapéu de um velho que tocava violino em uma esquina de Porto Alegre:

" Sem música, a vida seria um êrro".

Durante algum tempo, a frase ficou comigo, como uma folha de outono, até que um amigo me diz que era um aforisma de Fredrich Nietzsche em "Crepúsculo dos Idolos". Lembro também outra frase antiga - talvez outro aforismo antigo - que o Irmão Ignácio, nosso professor no Colégio Rosário tinha em sua mesa, nos distantes anos 50:

"Os filhos não lembrarão o que você ensinou.

Mas não esquecerão o pai que você foi". 

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O inglês G.K.Chesterton, escreve em "Enormes minúcias" que nem sempre temos consciência da força e da influência que as palavras exercem em nossa vida. Muito do que fazemos, muitas decisões que tomamos são geradas - de uma forma misteriosa - em palavras ouvidas ou lidas no passado. Elas permanecem silenciosas em nosso subconsciente, nos acompanhando por todo o tempo.

O grande Charles Chaplin preservava fragmentos de sua infância pobre em Londres, que mais tarde voltaram nas falas de Carlitos. Ou como legendas de filmes mudos, como a frase que ouviu aos 19 anos, do produtor Fred Karno, quando se iniciava na carreira da slapstick comedy:

"Você nunca encontrará o arco-iris se estiver olhando para o chão".

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 Desde jovem, George Raymond Richard Martin (hoje famoso como George R.R. Martin) era leitor ávido de revistas em quadrinhos e livros de aventuras medievais, como A Guerra das Rosas e Ivanhoé de Walter Scott. Ele credita que sua vocação de escritor nasceu com os super-heróis da infância. Tenta ficção científica, mas não  dá certo - um de seus contos é rejeitado 42 vezes por diferentes revistas. A partir de 1980 produz roteiros para TV, até que, em 1991, escreve o primeiro dos sete volumes de As Crônicas de Gelo e Fogo, que a HBO transforma em A Guerra dos Tronos. Na abertura do primeiro volume, o escritor reproduz uma frase de um livro de aventuras de sua infância:

"Palavras são como flechas.

Uma vez disparadas, não podem ser recolhidas".

Algo semelhante aconteceu com o poeta alemão Rainer Maria Rilke. Quando jovem, ele lê um verso de Johann Wolfgang von Goethe que o marca fortemente, mas que é logo esquecido. O mesmo verso retornaria à sua consciência tardiamente, em um derradeiro poema, que escreve antes de morrer:

" Deixe tudo acontecer com você. Beleza e terror.

Siga em frente.

Nenhum sentimento é final".

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Autor
José Antônio Moraes de Oliveira é formado em Jornalismo e Filosofia e tem passagens pelo Jornal A Hora, Jornal do Comércio e Correio do Povo. Trocou o Jornalismo pela Publicidade para produzir anúncios na MPM Propaganda para Ipiranga de Petróleo, Lojas Renner, Embratur e American Airlines. Foi também diretor de Comunicação do Grupo Iochpe e cofundador do CENP, que estabeleceu normas-padrão para as agências de Publicidade. Escreveu o livro 'Entre Dois Verões', com crônicas sobre sua infância e adolescência na fazenda dos avós e na Porto Alegre dos velhos tempos. E-mail para contato: [email protected]

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