Um pouco de ideologia vai fazer bem para a propaganda

Por Marino Boeira

Roberto Pintaúde escreveu um artigo em Coletiva.net intitulado 'O Velório das Agências'. Falava, é lógico, em agências de propaganda. Quem conseguiu segui-lo naquele seu turbilhão de frases desconexas e citações de filósofos desconhecidos da maioria dos publicitários, chegou à conclusão que, do ponto de vista do autor, esse formato de agência agoniza ou já está morto.

Para o lugar das agências, imagino que ele pensa que a melhor alternativa seria a existência de consultores publicitários independentes nas áreas de pesquisa, planejamento e criação, principalmente nessa última.

Talvez ele não tenha expressado suas conclusões com essa forma tão direta, e que seja apenas uma conclusão minha.

Não importa quem seja o autor, mas o tema é interessante e como ex-publicitário ainda me motiva.

Como o Pintaúde é um publicitário em tempo integral, ele enxerga apenas uma parte da questão. Realmente, aquele modelo de agências de propaganda, que prosperou a partir da década de 70 no nosso mercado, com a disputa de contas na base do talento e da criatividade disponíveis em cada uma dessas agências, está moribundo ou já morreu.

É claro que, mesmo esses argumentos usados na época - eficiência, talento, criatividade -, às vezes, serviam apenas para disfarçar a força e o prestígio dos grandes falcões da nossa propaganda, no nosso caso, empresários como o Mafuz, o Faveco, o Hugo Hoffmann, o Salimen, o Ito Ferrari e o Daltro Franchini, que carregavam seus clientes como verdadeiros dotes matrimoniais.

Essa era a prática, mas na teoria se atribuía a conquista de uma conta ao talento de criadores como o do próprio Pintaúde, do Tom, do Stalimir, do Tiaraju, da Graça Craidy, da Nara Fogaça, do Beto Soares, do Sérgio Gonzales, do Callage, do Philomena ou, no caso da Standard, do planejamento de um Luiz Augusto Cama.

Isso ajudava a revestir as agências com uma capa, vamos dizer, cultural, e tornava seu profissionais, principalmente o pessoal da Criação, mais artistas do que eram realmente, ou seja, artesãos competentes na escrita e na ilustração de anúncios.

Os festivais publicitários - Cannes era a grande meta - e as premiações em concursos múltiplos espalhados pelo País inteiro, criaram uma áurea de genialidade para os profissionais das agências e enchiam as salas de aula dos cursos de Publicidade e Propaganda das nossas universidades de alunos interessados em repetir o caminho de seus modelos, muitos dos quais se tornaram professores para ensinar o tal "pulo do gato".

É isso que o Pintaúde apontou ou imagino que tenha querido apontar no seu texto.

Só que ele falou do milagre, mas não disse quem era o santo.

Tento eu dizer.

O santo é a lei maior do capitalismo, que acaba com a concorrência e vai gerando um monopólio.

O negócio da propaganda se globalizou e como em todos os setores da economia, vai ficando nas mãos de poucos.

O que já ocorre com os bancos e com outros setores da economia, acontece, também, na propaganda. Vão permanecer apenas meia dúzia de grandes empresas, principalmente as multinacionais.

Nesse ponto fico tentado a parafrasear Rosa Luxemburgo, que identificou o capitalismo industrial como um cadáver insepulto, dizendo que a agência de propaganda, na versão que o Pintaúde criticou, também está se tornando um e as pessoas não se dão conta que ele já começa a cheirar mal.

Como o capitalismo que Rosa Luxemburgo conheceu não morreu, e sim, se transformou em capitalismo financeiro e se globalizou, o negócio da propaganda vai seguir um caminho parecido, com as multinacionais tomando conta de todos os mercados.

Para essas, o velório ainda está muito longe, a menos que surja uma internacional de trabalhadores em publicidade para disputar esse poder.

Não creio, até porque a publicidade é inerente ao sistema capitalista, que, por definição, vive da exploração dos trabalhadores e os mantêm alienados da sua força.

Autor
Formado em História pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), foi jornalista nos veículos Última Hora, Revista Manchete, Jornal do Comércio e TV Piratini. Como publicitário, atuou nas agências Standard, Marca, Módulo, MPM e Símbolo. Acumula ainda experiência como professor universitário na área de Comunicação na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS) e na Universidade do Vale do Rio do Sinos (Unisinos). É autor dos livros 'Raul', 'Crime na Madrugada', 'De Quatro', 'Tudo que Você NÃO Deve Fazer para Ganhar Dinheiro na Propaganda', 'Tudo Começou em 1964', 'Brizola e Eu' e 'Aconteceu em...', que traz crônicas de viagens, publicadas originalmente em Coletiva.net. E-mail para contato: [email protected]

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