Coopítulo 33 - A mulher

Por José Antonio Vieira da Cunha

A profissional que simboliza a participação da mulher na trajetória da Cooperativa dos Jornalistas chama-se Rosvita Saueressig Laux. Tinha pouco mais de 20 anos quando começou na Folha da Manhã como editora de esporte amador e em pouco tempo tornou-se uma das principais lideranças de um jornal que marcou época no Rio Grande do Sul, embora tenha tido um efêmero período de brilho.

Quando a redação da Coojornal cresceu, graças a uma bem montada estratégia de atração de clientes para a tomada de serviços de edição e publicação de jornais e revistas, Rosvita foi a pessoa convocada para coordenar a operação toda. Organizar e comandar ela sempre soube fazer como poucos. Com Elaine Lerner e Marina Wodke como fieis escudeiras a seu lado, liderou uma equipe composta em sua maioria por jovens jornalistas - Eduardo Bueno, o Peninha, hoje um reconhecido escritor, era um deles - que muito aprenderam com aquela convivência saudável e exemplar. Não por acaso, Rosvita, com seu pensamento claro e até didático quando necessário, foi também, mesmo que por breve período, professora na Faculdade de Comunicação da PUC. 

Sabe ser fria e distante, afetuosa e confidente, tudo dentro de um tempo certo. Quando foi presa, em julho de 1981, no episódio da publicação da reportagem sobre o combate do Exército à guerrilha do Araguaia, manteve-se tranquila e confiante. Foi hóspede involuntária no presídio Madre Pelletier, em Porto Alegre, junto com Elmar Bones, Osmar Trindade e Rafael Guimaraens, e sempre que os visitava encontrava-a equilibrada e serena. Elmar e Trindade tinham assinado a reportagem, e Rosvita e Rafael foram presos simplesmente porque o cabo acusado de entregar os documentos secretos ao Coojornal mencionara os nomes de ambos. Dentro da montagem fraudulenta da peça de acusação, teriam participado dos contatos realizados pelo militar para, outra acusação mentirosa, a compra dos documentos.

Rosvita foi protagonista de uma das mais insólitas situações enfrentadas pelo Coojornal naqueles anos pesados. A dificuldade de comunicação para fazer com que as reportagens e textos enviados de outro estado chegassem até nós era driblada por um expediente comum na época, ir ao aeroporto, escolher um passageiro que demonstrasse alguma confiabilidade e pedir a ele que levasse o envelope ao destino. No aeroporto local, alguém estaria à espera do emissário voluntário, devidamente descrito por telefone.

A reportagem sobre os cassados - o detalhado levantamento sobre o total de cassados desde o início do golpe de 64 até aquela data, junho de 1977 - foi enviada assim desde São Paulo, e coube a Rosvita ir ao aeroporto daquela vez. Ficou preocupada ao não encontrar ninguém com as características recebidas, até desconfiar da atitude de um cidadão encostado à parede. Ela se identificou, ouviu a resposta positiva ao declarar o nome dele, Luiz Abreu, e ouviu outra resposta, esta estarrecedora: o cidadão havia rasgado as laudas e abandonado tudo no lixo, ainda no avião. Era funcionário da Receita Federal, não resistiu a dar uma olhada no material que recebera, e se assustou com o conteúdo. "Vocês são loucos de fazer uma coisa destas", ainda disse para uma agora furiosa Rosvita. Neste episódio, salvou-nos o xerox da época, enviado em seguida da mesma forma - mas, desta vez, tendo como portador alguém que pareceu ainda mais confiável... O burocrata da Receita estava certo quanto ao potencial daquela reportagem. Acabou sendo o estopim para a repressão política infernizar nossa vida, constrangendo, assustando e afastando os assinantes do Coojornal.

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Foi Rosvita a mentora e inspiradora da Creche Pé de Pilão, criada para abrigar os filhos de jornalistas que tinham dificuldades para resolver isso devido aos horários das maternais convencionais. Ela ainda não tinha filhos, nem estava grávida, mas foi sensível para identificar aquela necessidade e provocar a mobilização das jovens mães que circulavam pela Coojornal. A líder impôs apenas uma condição - que a creche funcionasse nos moldes da cooperativa, com direitos iguais a todos e uma diretoria formada exclusivamente por mães e pais.

Depois que saiu da cooperativa, acabou trabalhando em Brasília e em São Paulo, onde reside hoje ao lado do Nei, companheiro de quase 50 anos. Competente e agregadora como a conhecemos, teve passagens brilhantes por Gazeta Mercantil e Valor Econômico, até se aposentar, uns poucos anos atrás. Devo uma visita ao casal, o que espero cumprir logo logo.

Rosvita no Pelletier: que tempos! - Crédito: Daniel Andrade

Autor
José Antonio Vieira da Cunha atuou e dirigiu os principais veículos de Comunicação do Estado, da extinta Folha da Manhã à Coletiva Comunicação e à agência Moove. Entre eles estão a RBS TV, o Coojornal e sua Cooperativa dos Jornalistas de Porto Alegre, da qual foi um dos fundadores e seu primeiro presidente, o Jornal do Povo, de Cachoeira do Sul, a Revista Amanhã e o Correio do Povo, onde foi editor e secretário de Redação. Ainda tem duas passagens importantes na área pública: foi secretário de Comunicação do governo do Estado (1987 a 1989) e presidente da TVE (1995 a 1999). Casado há 50 anos com Eliete Vieira da Cunha, é pai de Rodrigo e Bruno e tem quatro netos. E-mail para contato: [email protected]

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