Coopítulo 53 - De jornalistas e jornais

Por José Antonio Vieira da Cunha

Desde quando o Coojornal foi lançado, o que seria um despretensioso boletim para levar informações a seus associados acabou se tornando um rico e confiável registro da história da imprensa, não só do Rio Grande do Sul mas também do Brasil, incluindo alguns respiros do que se passava no jornalismo internacional. Enquanto um veículo de uma cooperativa de jornalistas, o Coojornal estava exatamente preocupado em acompanhar, narrar e registrar o que acontecia no cenário da comunicação. A primeira capa do veículo, em novembro de 1975, pouco mais de um ano após a fundação da cooperativa, já mostrava a que veio com a manchete "O jornalista entre a ética e os interesses da empresa". Seguiam-se entre os assuntos o título sobre a crise que levou um terço da redação da Folha da Manhã a pedir demissão - aliás, um registro de relevante significado histórico, a comprovar como são equivocadas as versões de que foi este episódio que levou à criação da cooperativa. 

A edição pioneira mostrava que a coluna de humor da Folha da Tarde, famosa graças ao talento do titular Carlos Nobre, não ficou órfã com sua morte. Coojornal registrou, com uma inevitável ironia para o caso, que o espaço na penúltima página do vespertino da Companhia Jornalística Caldas Júnior passou a ser assinado por "dois novos humoristas" da praça: Edmundo Soares, que era o secretário de Redação, e Adil Borges Fortes, autor da coluna diária na qual se assinava como Hilário Honório e onde expressava suas posições conservadoras e simpáticas ao regime militar.

A matéria sobre a Folha da Manhã, matutino da mesma CJCJ, trazia a relação de todos os profissionais que deixaram a redação na crise que teve como consequência uma profunda alteração na linha editorial. Sua causa imediata foi a demissão do secretário de Redação Osmar Trindade. Nas suas próprias palavras, o episódio se deu "por divergências em torno de uma matéria que o jornal publicou", sobre um incidente policial. Ali estão os nomes de todos os 21, a começar pelo diretor de Redação Ruy Carlos Ostermann. Além de Trindade, lá estavam, entre outros, Carlos Urbim, Telmo Zanini, Vera Costa, Caco Barcellos, Edgar Vasques, Luis Fernando Verissimo e Licínio Azevedo, que viria a ser ministro de Estado e cineasta em Moçambique.

Claro que o registro trazia também a modificação na direção do jornal, liderada por Francisco Antônio Caldas, tendo como secretário de Redação Walter Galvani e, entre os editores, Núbia Silveira, Helena Lemos, João Ferreira, Sérgio Tonielo e Iara Rech. Com a nova linha editorial, a FM voltou a ser mais próxima da orientação dada ao Correio do Povo e à Folha da Tarde, longe do perfil fortemente crítico que vinha caracterizando a Folhinha nos dois anos anteriores. O jornal ingressava assim em sua terceira e última fase. A origem estava em um caderno esportivo da FT que circulava às segundas-feiras; passou a ser diário com o nome de Folha da Manhã, sem deixar de manter um espaço generoso à editoria de esportes. A segunda fase tem início em 1972, com mais ênfase no noticiário geral e buscando atingir um público jovem. Participei destas duas fases iniciais, na primeira como repórter e redator e na segunda como editor de Cidades e Geral, e saí com aquele grupo dos 21.

O apresentador Ernani Behs conseguiu uma façanha, levar à TV Difusora, atual Band, o dono da Caldas Júnior, Breno Caldas, e seu filho Tonho para dar uma rara entrevista de 25 minutos. Refratários a falar com jornalistas, por paradoxal que seja, desta vez foi diferente porque tinham especial interesse em falar sobre o momento da empresa, então muito bem sucedida, e inevitavelmente sobre a Folha da Manhã. Behs fez questão de ressaltar que considerava-a diferenciada:

- É um jornal com o qual me identifico como um jovem de meia idade. O senhor sabe que a Folhinha é um jornal interessante, que vicia?

A resposta do velho e sábio Breno foi imediata:

- Até eu, que estou numa faixa de mais idade, me encontro na FM.

E Francisco Antônio filosofou, a seu modo muito pragmático:

- Na minha maneira de ver, eu entendo Jornalismo como serviço público. Isso é Jornalismo, preocupado com o bem comum, a comunidade. Mas é claro que seria um erro empresarial tremendo se nós publicássemos três jornais iguais. Nós podemos fazer três jornais diferentes, logicamente que dentro da mesma linha e dentro da mesma orientação.

(Continua)

Autor
José Antonio Vieira da Cunha atuou e dirigiu os principais veículos de Comunicação do Estado, da extinta Folha da Manhã à Coletiva Comunicação e à agência Moove. Entre eles estão a RBS TV, o Coojornal e sua Cooperativa dos Jornalistas de Porto Alegre, da qual foi um dos fundadores e seu primeiro presidente, o Jornal do Povo, de Cachoeira do Sul, a Revista Amanhã e o Correio do Povo, onde foi editor e secretário de Redação. Ainda tem duas passagens importantes na área pública: foi secretário de Comunicação do governo do Estado (1987 a 1989) e presidente da TVE (1995 a 1999). Casado há 50 anos com Eliete Vieira da Cunha, é pai de Rodrigo e Bruno e tem quatro netos. E-mail para contato: [email protected]

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