A melhor homenagem que se pode prestar a alguém é em vida, e ao Ruy prestei-a dois anos atrás, quando completava 89 anos. Escrevi uma crônica que iniciava perguntando qual é o maior nome da crônica esportiva do Rio Grande do Sul, e um dos maiores do Brasil, logo trazendo a resposta óbvia: Ruy Carlos Ostermann, jornalista, filósofo, professor e político, um ser humano admirável por quem viveu ou conhece a história da comunicação no Rio Grande do Sul.
Estava então recebendo uma biografia à altura, orquestrada pelo jornalista e pesquisador Carlos Guimarães e uma jornalista que conhece Ruy como ninguém, sua filha Cristiane. Registrei que seria uma tarefa árdua, mas muito compensadora por poderem se deliciar ao ouvir depoimentos privilegiados das histórias que o Professor estaria resgatando para a posteridade. Embora estivesse afastado dos microfones há uns bons anos, Ruy conservava uma legião de admiradores em todo o Estado pela inteligência exuberante de seus comentários em rádio e televisão e a coluna em jornal.
Ruy iniciara a carreira vencedora na Rádio Guaíba e depois foi para a Gaúcha, com a missão de revolucionar o radiojornalismo, o que conseguiu com louvor. A Rádio Gaúcha achou ali no início dos anos 80 um caminho sem retorno, que faz dela há anos ser líder em audiência graças a sua fórmula que privilegia a informação. O programa Sala de Redação teve com ele um dos períodos mais criativos e atraentes, ainda hoje com milhares de ouvintes saudosos. E em outra atração diária que liderava, o Gaúcha Entrevista, mostrou uma capacidade invejável de entrevistar e cativar a admiração do entrevistado e da plateia.
Tenho certeza de que muito dessa habilidade para exercer o jornalismo Ruy aprimorou durante sua passagem marcante pela Folha da Manhã nos melhores momentos do diário, entre 1972 e 1975, quando foi diretor de Esportes e em seguida diretor de Redação. Sabia ouvir e era mestre na arte de contemporizar; as divergências entre os jornalistas ou a costura de estratégias para o jornal ele tratava com maestria em uma sacada da redação. Sim, o espaço ocupado pela Folha da Manhã no austero prédio da Companhia Jornalística Caldas Júnior era exíguo, e seu diretor, que dividia uma mesa de trabalho ao lado de diagramadores, repórteres e editores, fazia as reuniões mais reservadas em uma sacada com frente para a Rua 7 de Setembro.
Eu era editor de Cidade na Folhinha. Vem daí uma longa e agradável convivência com Ruy e sua família, proximidade enriquecida quando minha esposa Eliete passou a trabalhar no gabinete dele logo que assumiu como o primeiro secretário de Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul, em 1987, e um ano depois, como secretário de Educação. A esposa Nilse, falecida no início de 2021, e eu aniversariávamos no mesmo 20 de abril, e não foram poucas as datas em que comemoramos juntos. Em muitas destas vezes, Ruy era o sempre alegre churrasqueiro de plantão.
Mais tarde, no final de 1994, quando fui convidado pelo colega Antônio Britto para assumir a direção da TVE com o desafio de modernizar sua estrutura e pacificar o ambiente, Ruy foi um parceiro de primeira hora quando aceitou a intimação para ajudar a pensar o que poderia ser a nova Fundação TVE. Com a contribuição de outros três amigos, Flávio Dutra, Flávio Porcello e Pedro Macedo, idealizamos a criação de um Conselho Deliberativo que ajudaria a transformar a TVE em uma verdadeira emissora pública, a exemplo da fórmula bem-sucedida da TV Cultura, de São Paulo. Ele era o mais entusiasmado com a ideia, e ao natural acabou sendo eleito o primeiro presidente do organismo.
Sabia exercer um comando sensível e inteligente, estimulando o envolvimento dos demais conselheiros no esforço de zelar pela integridade e sucesso da TVE e da Rádio FM Cultura. Fazia questão de lembrar sempre que estavam ali não em nome de entidades que representavam, mas como representantes legítimos da sociedade.
Foi um sábio, como declararam mais de uma das pessoas que se manifestaram sobre sua morte. Foi um sábio e grande amigo, acrescento com muita honra, daqueles amigos com quem a gente quer conviver com a maior frequência possível. Agora não dá mais.