Labirintos

Por José Antônio Moraes de Oliveira

"Perder-se num labirinto é o que melhor

pode acontecer ao ser humano." 

Jorge Luis Borges.

 Construído em 1721 pela família Di Santo Stefano, o labirinto da Villa Pisani foi descrito por Gabriele D'Annunzio como o mais belo e inspirador da Itália. Sempre que ia a Veneza, o poeta percorria incontáveis vezes o labirinto da Villa Pisani, talvez em busca da sabedoria de Minerva, cuja estátua está em uma alta torre no centro do labirinto. Mais tarde, um outro poeta se encantaria pelos mistérios do labirinto - o argentino Jorge Luis Borges. Pelo que se sabe, teria tomado emprestado do inglês Gilbert Keith Chesterton a idéia do labirinto como fonte de inspiração para poemas e ensaios.

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 O labirinto era tema recorrente entre os gregos antigos. O historiador Herodoto menciona o mito de Ariadne, Teseu e Minotauro como a origem de um eterno desafio imposto pelos deuses aos humanos. Uma idéia recorrente na Idade Média cristã, segundo G. K. Chesterton, quando o labirinto assume plenamente a dimensão divina dos antigos. Lembrando que, no tempo das cruzadas, nem todos tinham recursos para atender o chamamento papal para empreender a penosa viagem até a Terra Santa.

 Foi quando o ato devocional de percorrer o labirinto desenhado no piso  de catedrais, passou a ser um aceitável substituto à longa peregrinação   a Jerusalém. Mas sem ser necessariamente um encontro marcado com a remissão, como o autor lembraria em "A Cabeça de César", quando seu protagonista, o detetive Padre Brown alerta: 

"Ficaremos secretamente apavorados no labirinto, presos como em uma teia de aranha, pois lá não existe um centro onde chegar".

 

 G.K.Chesterton era um dogmático e católico praticante. Ele explora as incompatibilidades do mundo exterior com o universo espiritual. Vai até   o mundo sombrio de Edgar Allan Poe - do qual era leitor assíduo - para criar seus desconcertantes e temerários paradoxos e sofismas sobre a existência humana diante do divino.

 Os estudiosos dizem que Chesterton representa uma ponte entre Poe e   o argentino Jorge Luis Borges. No entanto, para esse poeta, o labirinto assume simetrias e significados diferentes. Uma de suas estórias favoritas    quando criança era a do Labirinto de Creta que lia em "As Sete Maravilhas do Mundo". Mais tarde, ele lamentaria por não ter usado uma lente de aumento para encontrar o centro do labirinto e o Minotauro. Na lenda clássica, o encontro da Rainha de Creta com um touro branco gera o Minotauro, que é aprisionado pelo Rei Minos em um intrincado labirinto, do qual ninguém saía vivo. O Minotauro reinventado por Borges é um ser solitário, rejeitado e temido, que despreza a todos porque sabe que nasceu de ventre real. Enquanto para GKC o labirinto representa a peregrinação que busca o espiritual, para Borges, é um grande casarão onde as pessoas estão fadadas a se perder. Em Elogio da Sombra, ele explora a ideia que os labirintos representam os caminhos onde tantas gerações se perderam e onde nós permanecemos perdidos:

"Não há porta, nem entrada, nem saída".

 Em outro texto, o poeta compara o próprio Tempo a um labirinto. Nos conta como um velho chinês, que sente que vai morrer, sai à procura de um livro escrito por um sábio que construiu um labirinto. Mas o livro é confuso e não oferece saídas - o personagem morre em um capítulo e reaparece no capítulo seguinte. Um exército é derrotado no início, mas reaparece ao final, comemorando sua vitória.

 Assim é o labirinto borgiano - uma sequencia de tempos, com momentos divergentes e convergentes, que evocam Gabriele D'Annunzio no jardim de Villa Pisani:

"Nunca é tarde para tentar o desconhecido.

E nunca é tarde para ir mais além."

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Autor
José Antônio Moraes de Oliveira é formado em Jornalismo e Filosofia e tem passagens pelo Jornal A Hora, Jornal do Comércio e Correio do Povo. Trocou o Jornalismo pela Publicidade para produzir anúncios na MPM Propaganda para Ipiranga de Petróleo, Lojas Renner, Embratur e American Airlines. Foi também diretor de Comunicação do Grupo Iochpe e cofundador do CENP, que estabeleceu normas-padrão para as agências de Publicidade. Escreveu o livro 'Entre Dois Verões', com crônicas sobre sua infância e adolescência na fazenda dos avós e na Porto Alegre dos velhos tempos. E-mail para contato: [email protected]

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