Mirem-se no exemplo destas mulheres de agora

Por Márcia Martins

Nós, mulheres lúcidas e engajadas, não precisamos mais seguir os exemplos de Amélia e tantas outras cantadas em verso e prosa na história da Música Popular Brasileira e retratadas em alguma etapa da vida real. Temos sim vaidade. Escancarada. Em excesso. Abusamos de cremes, fórmulas mágicas para não envelhecer e Botox. Mas tudo com o nosso dinheiro. Gastamos horas na frente do espelho. E ainda assim somos mulheres de verdade. Passar fome ao lado do companheiro ou até sozinha, nem pensar. Coisa de doida. E ainda assim somos mulheres de verdade. De arregaçar as mangas. Em qualquer ocasião.

Diferente da Amélia do passado, nós mulheres de agora fazemos exigências sim. E é simples. Se não gostar, a fila anda. Sabemos o que é consciência e este saber adquirido tem sido usado não só a nosso favor, mas em prol da humanidade. Com doses exageradas de consciência, conquistamos direitos antes adormecidos. E os estendemos até para aquelas que continuam com as consciências inertes. Seja qual for o motivo da fragilidade destas mulheres, ainda inconscientes. Haverá um dia em que elas também passarão a fazer exigências do coletivo feminista, como lutar por melhor qualidade de vida e salários iguais.

Pensamos em luxo e riqueza. E que mal existe em pensar em supérfluos de vez em quando? Mas não pensamos só nisso. Nosso pensamento é invadido todo o dia com administração de rotinas de mães solteiras, separadas ou que simplesmente optaram por viver sozinhas. E nem por isso são infelizes. Pensamos no almoço dos filhos, nas reuniões dos colégios, no pagamento da mensalidade da faculdade, na hora da terapia, na aula de pilates, na consulta médica, na visita aos familiares, na tarefa do trabalho com prazo vencido. Se sobrar algum tempo, ainda pensamos em luxo e riqueza. Qual crime cometemos?

E nada de silenciar os nossos medos só porque não ficamos paradas vendo o tempo passar. Não é porque hoje votamos, gritamos fora e dentro de casa, escolhemos quando parir e quantas vezes, decidimos com quem vamos fazer sexo que deixamos de ser humanas. Carregamos as angústias e os anseios de todes. Tememos pelo assalto, pelo sobressalto, pelo congestionamento, pela calmaria, pela fome no mundo, pelo excesso de comida, pela falta de espaço, pela impunidade, pela ausência de consciência.

O fato de reconhecermos as nossas conquistas não nos torna fúteis e nem acomodadas, como se nada mais tivéssemos de sonho ou utopia a buscar. Com a mesma delicadeza que costuramos o botão que falta na camisa do filho ou do companheiro, somos competentes para reivindicar melhores salários, jornadas iguais, creches para filhos e o cumprimento de outros direitos. Por isso, mirem-se no exemplo destas mulheres de agora.

Coluna publicada originalmente em 6 de março de 2013, com algumas adaptações pela passagem do Dia Internacional da Mulher.

Autor
Márcia Fernanda Peçanha Martins é jornalista, formada pela Escola de Comunicação, Artes e Design (Famecos) da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), militante de movimentos sociais e feminista. Trabalhou no Jornal do Comércio, onde iniciou sua carreira profissional, e teve passagens por Zero Hora, Correio do Povo, na reportagem das editorias de Economia e Geral, e em assessorias de Comunicação Social empresariais e governamentais. Escritora, com poesias publicadas em diversas antologias, ex-diretora do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Rio Grande do Sul (Sindjors) e presidenta do Conselho Municipal dos Direitos da Mulher de Porto Alegre (COMDIM/POA) na gestão 2019/2021. E-mail para contato: [email protected]

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