O menino que lia Érico
Por José Antônio Moraes de Oliveira


Lembro vagamente de minhas primeiras curiosidades sobre leituras. A mãe gostava de reservar um tempo nos fins de tarde para ler a revista Para Ti, que o pai comprava na banca da Praça da Alfândega. Era uma revista argentina ilustrada que contava com leitores fiéis em Porto Alegre. E enquanto ela lia sobre os cantantes de tango da época - Libertad Lamarque e Hugo del Carril - eu ficava por cima do ombro dela, tentando entender alguma coisa.
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Aquela curiosidade pela leitura não passou desapercebido do pai. E no Natal de 1944, ganho de presente dois albuns coloridos de historietas: "Aventuras do Avião Vermelho" e "O Urso com Música na Barriga". Lembro o pai mostrando na capa o nome do autor das estórias, que ele conhecia do Largo dos Medeiros. Um nome que ficou na memória afetiva - Érico Veríssimo.
Eu despertava para o mundo encantado dos sonhos e fantasias. Mal terminava as lições do dia, fechava os cadernos escolares e mergulhava nas páginas da revista O Tico-Tico com os novos heróis - Bolão, Reco-Reco e Azeitona.
E a cada ano que passava, crescia meu apetite por leituras. Logo chega a vez das tiras em quadrinhos dos gibis mensais. E de um dia para outro, a trinca Bolão, Reco-Reco e Azeitona cede lugar aos paladinos da justiça - Capitão Marvel, Mandrake, Tocha Humana e Centelha, Homem Borracha, sem esquecer do Fantasma, "O Espirito Que Anda" .
Mais de uma vez, fui repreendido por passar tempo demais com o nariz enfiado nas peripécias de Arséne Lupin, Ladrão de Casaca e do Tarzan, o Rei das Selvas. Mas no final do ano sou absolvido ao chegar em casa com nota cem em redação e um "Muito Bom" no boletim rabiscado por meu professor de Português. Obrigado, Irmão Lourenço.
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Tempos mais tarde, em visita à Livraria do Globo com a turma da faculdade de Jornalismo, o professor sugere "entrevistar" os redatores da Revista do Globo. Escolho um senhor grisalho na mesa ao fundo, mas em lugar de entrevistá-lo, falo que meu livro preferido era "Aventuras do Avião Vermelho". Foi quando ganhei um abraço do autor de "O Tempo e o Vento".
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