O que ganhamos com a pandemia?

Por Elis Radmann

A máxima, "não há nada tão ruim, que não tenha algo de bom", serve para motivar a nossa reflexão em relação aos ganhos, aos ensinamentos trazidos pela pandemia.

Começamos pensando na expansão da solidariedade: o medo e a preocupação estão fazendo o individualismo diminuir. Há muita gente ajudando ao próximo, percebe-se a cooperação se ampliando e o sentimento de comunidade começando a ressurgir.

Moradores de edifícios, que antes mal se cumprimentavam, hoje auxiliam aos vizinhos do grupo de risco, oferecendo ajuda e realizado compras para que idosos ou pessoas com doenças crônicas não precisem sair de casa.

Muitos caminhoneiros passaram a ser recebidos nas entradas de cidades, com marmitas, materiais de higiene ou cestas básicas. Alguns deles, trabalham com a premissa de não retornar para sua casa durante a pandemia. E os grupos de apoio, presentes nas estradas, motivam esses profissionais a continuarem sua jornada para manter o abastecimento das cidades.

Os movimentos espontâneos de ajuda aos trabalhadores informais e a população mais vulnerável se multiplicam e buscam suprir as famílias com alimentos, roupas e materiais de higiene.

Costureiras voluntárias fazem máscaras para distribuir ou trocar por alimentos, enquanto pessoas procuram em seus armários matéria-prima para colaborar com essa ação.

Universidades passam a trabalhar na produção de todos os insumos necessários para a área da saúde. Os cientistas do mundo inteiro estão alinhados em torno de pesquisas para a cura do vírus e o discurso mundial apregoa que a vacina chegue para todos, de forma igualitária.

Ampliamos nossa relação utilitária com a tecnologia. Pessoas que antes utilizavam os celulares somente para ligações e como passa tempo, hoje o utilizam para solicitar o auxílio emergencial, buscar informações e até mesmo para pagamentos ou compras online (mesmo que com a relutância dos mais velhos).  

Os pequenos comércios (principalmente os de bairro) passaram a ser valorizados. Atendendo pela janela, entregando em casa ou até mesmo mantendo as suas portas abertas, vendem a um público que tem aderido ao isolamento.

A pandemia fez ressurgir os velhos ensinamentos de nossos pais: poupe! Tenha reservas de emergência, seja precavido. A maior parte das pessoas não trabalha com reservas financeiras e está aprendendo que a educação financeira é vital.

No campo dos sentimentos, ganhamos mais tempo para avaliarmos a nossa jornada de vida, hábitos de consumo e a relação com as pessoas que convivemos e amamos. Sem ter a possibilidade de consumir, muitas pessoas tiveram que resolver sua ansiedade ou angústia de outra forma. Quando temos que reavaliar conceitos, passamos a repensar o que realmente é importante e necessário para viver.

E a revisão de valores permite o resgate de: crenças (olhando para dentro de si), de nossa espiritualidade, de nossa história e de nossa identidade. E como ninguém sabe o dia de amanhã, o perdão vai ganhando mais espaço entre as pessoas e reaquecendo relações antes enfraquecidas.

A pandemia acaba sendo um gatilho, que propicia uma nova rotina e que pode resultar em novos hábitos. Isso não significa que o egoísmo, o oportunismo e o jeitinho brasileiro acabarão. Mas indica que a pandemia pode motivar a diminuição desses sentimentos perversos ampliados em uma sociedade que estava exacerbando seu individualismo.

Então, mesmo com todas as suas obscuridades, a pandemia pode trazer uma luz em um momento de tantas incertezas!

 

Autor
Elis Radmann é cientista social e política. Fundou o IPO - Instituto Pesquisas de Opinião em 1996 e tem a ciência como vocação e formação. Socióloga (MTB 721), obteve o Bacharel em Ciências Sociais na Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e tem especialização em Ciência Política pela mesma instituição. Mestre em Ciência Política pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), Elis é conselheira da Associação Brasileira de Pesquisadores de Mercado, Opinião e Mídia (ASBPM) e Conselheira de Desburocratização e Empreendedorismo no Governo do Rio Grande do Sul. Coordenou a execução da pesquisa EPICOVID-19 no Estado. Tem coluna publicada semanalmente em vários portais de notícias e jornais do RS. E-mail para contato: [email protected]

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