'Cavani's Day': como a imprensa esportiva gaúcha avalia o fenômeno do rumor?

No dia em que o Grêmio completou 117 anos, a torcida tinha a expectativa da apresentação de Edinson Cavani como novo reforço

O uruguaio Edinson Cavani - Reprodução

Nos últimos dias, a torcida do Grêmio viveu um sonho, um momento de euforia: a possível contratação de Edinson Cavani. E, entre rumores espalhados nas redes sociais, a expectativa chegou ao seu auge na noite desta terça-feira, 15, durante a live realizada para celebrar os 117 anos de história do clube tricolor. Na ocasião, os torcedores acreditavam que o jogador uruguaio seria apresentado, como uma espécie de presente de aniversário aos gremistas. O fato não ocorreu. Porém, como a imprensa gaúcha trabalhou com este fenômeno virtual? Coletiva.net buscou algumas respostas.

Para Leonardo Meneghetti, diretor-geral da Band RS, os profissionais de comunicação do Estado tiveram "um papel adequado, na maioria dos momentos, sobre este episódio". De acordo com ele, em entrevista ao portal, os jornalistas esportivos reverberaram o que o Grêmio disse publicamente. Sobre o rumor, ele garantiu que a emissora tratou de forma jornalística: investigando, buscando informações e evitando especular. "Interpretar os fatos, sim, mas com muita atenção. Surgiram muitas fake news nestes dias, especialmente em grupos de WhatsApp - e não demos espaço para isso", explicou.

Carlos Guimarães, comentarista esportivo da Rádio Guaíba, destacou ao portal justamente isso: a importância da apuração jornalística. Para ele, todo rumor deve ser tratado como tal e investigado até que se torne "algo próximo do fato". "A Guaíba emprega todos os procedimentos necessários em qualquer tipo de rumor lançado, especialmente no mundo do futebol", explicou. Ele ainda enfatizou o trabalho do setorista do Grêmio Rafael Pfeiffer, que "agiu como repórter e fez tudo direitinho para que não tenha nenhum tipo de fiasco da empresa". 

Vale lembrar que o boato surgiu justamente de um jornalista, mas não gaúcho. Um profissional da imprensa esportiva argentina garantiu a informação em sua conta no Twitter e, a partir daí, a notícia correu o mundo. Desde então, os gremistas dominaram as redes sociais, na ansiedade pelo anúncio de Cavani como novo reforço tricolor. E, obviamente, este movimento online gerou inúmeras matérias jornalísticas - muitas tentando desmanchar esta ilusão, mas sem eficácia. E, claro, houve memes, muitos memes. Inclusive, um deles questionava se Renato Borghetti tocando gaita na live de aniversário do time era, de fato, o músico ou o jogador disfarçado.

Justamente sobre as piadas na internet, Glauco Pasa, repórter e apresentador esportivo do SBT RS, destacou ao Coletiva.net que a emissora tem uma linguagem peculiar, "mais alegre, mais leve, e isso se ajusta muito ao futebol". Então, segundo ele, o tema foi tratado, em diversas vezes, como brincadeira, por conta dos boatos e das montagens da internet. "Por outro lado, quando chegou a hora de falar sério, a gente ponderou, destacando que as informações são de que existiram a cogitação e a sondagem por parte do Grêmio, mas deixando claro sempre que boato é boato. E a gente brincou com esse rumor, pois o esporte também é entretenimento", enfatizou.

Na mesma linha, Júnior Maicá, editor de O Bairrista, explicou ao Coletiva.net que, no seu portal, o assunto foi tratado com bom humor, "mas caçando a notícia através das nossas fontes". Segundo o comunicador, muitas pessoas andam se informando através de gifs e memes - "por mais doido que isso possa parecer". Para ele, a informação era muito forte e, por isso, o tema repercutiu tanto. "O Grêmio, de uma maneira até irresponsável, alimentou o rumor de que ele poderia ser apresentado na live de aniversário", afirmou.

Porém, para o vice-presidente do Grêmio, Paulo Luz, em entrevista à GaúchaZH, "criou-se uma expectativa em um vazio". Segundo ele, os dirigentes sabiam que a contratação não iria acontecer. "Infelizmente, criou-se esta possibilidade de anúncio no evento de aniversário. Qual clube não gostaria de ter o Cavani, seja na América do Sul ou na Europa?", explicou. Sobre isso, Meneghetti destacou que, na Band RS, foi reforçado que Cavani não seria apresentado no dia do aniversário do Grêmio: "Porque não daria tempo de elaborar um contrato tão detalhista e porque o Cavani segue na expectativa de fechar com algum clube da Europa".

O mesmo reforçou Guimarães: "O papel da imprensa esportiva é simplesmente relatar fato e não alimentar nada". Segundo o profissional da Rádio Guaíba, existem muitos influenciadores que investem em especulações para que possam afirmar suas fontes. "Na minha opinião, a imprensa séria ainda tem o seu papel, a sua responsabilidade, mas a imprensa desses influencers, dessa galera que não tem muito a quem prestar contas, acaba alimentando o imaginário dos outros", ponderou.

Já o Grupo RBS emitiu uma nota ao Coletiva.net, afirmando que divulgação de informações sobre possíveis vindas de jogadores integra a cobertura esportiva de todos os veículos de comunicação. "No Grupo RBS, a produção de conteúdo está focada em dar espaço à informação, apurada e verificada para retratar o fato e o contexto em que está inserido, e também à opinião, sustentada na análise de comentaristas e colunistas", salientou a empresa.

Ao portal, todos os entrevistados sobre o tema responderam enfaticamente: não vale a pena alimentar rumores para gerar acessos ou para buscar audiência. Segundo eles, a investigação jornalística e a credibilidade do trabalho da imprensa devem estar sempre em primeiro lugar. A possível contratação do jogador, de fato, esteve presente nos bastidores do Grêmio, mas, sabendo da imensa dificuldade para a conclusão do negócio, o assunto acabou virando, pelo menos na imprensa gaúcha, um tema para brincadeiras e para espalhar bom humor. No fundo, os torcedores também sabiam disso, mas todos preferiram rir juntos.

Leia as respostas na íntegra:

Como que você avalia o fenômeno do rumor da chegada do Cavani no Grêmio?

Meneghetti: Era evidente, e nós falamos isso, que o Cavani não seria apresentado no dia do aniversário. Tanto porque não daria tempo de elaborar um contrato tão detalhista e porque o Cavani segue na expectativa de fechar com algum clube da Europa (a janela dos principais países encerra dia 5 de outubro).

Maicá: A gente tratou com bom humor, mas caçando a notícia através das nossas fontes. Muita gente anda se informando através de gifs e memes, por mais doido que isso possa parecer. É uma notícia muito forte e por isso repercute tanto. 

Glauco: Pela experiência que eu tenho, não foi a primeira e não vai ser a última vez que isso acontece. A tendência, inclusive, é que aconteça cada vez mais essa troca, digamos assim, entre o meio virtual e os meios convencionais, seja rádio, TV, jornal. Mas, também, vejo com certa preocupação, pois, às vezes, a versão se sobrepõe ao fato. E o fato o que que é: a gente não tem a chegada do Cavani. Não tem nenhuma confirmação por parte do Grêmio ou por parte do atleta de que ele realmente venha para o time. No entanto, as versões que se tem de que ele gostaria de jogar no clube acabam se sobrepondo. Estamos falando de esporte, o futebol, que lida com paixão, e isso facilmente acontece, da versão se sobrepor ao fato. 

Guimarães: Avalio como rumor e todo rumor tem a necessidade de apuração e essa apuração precisa ser responsável, precisa passar por diversas técnicas, que são jornalísticas, para que saia do rumor e se torne alguma coisa próxima do fato. Então, a Guaíba emprega todos os procedimentos necessários em qualquer tipo de rumor lançado, especialmente no mundo do futebol.

De que forma esse rumor foi tratado pela empresa?

Meneghetti: Tratamos de forma jornalística, investigando, buscando informações e evitando especular. Interpretar os fatos sim, mas com muita atenção. Surgiram muitas fake news nestes dias, especialmente em grupos de whatsapp, e não demos espaço para isso.

Maicá: A gente tratou como uma possibilidade e dentro dessa possibilidade espalhamos a notícia através dos nossos programas e redes sociais. 

Glauco: O SBT tem uma linguagem peculiar, mais alegre, mais leve, e isso se ajusta muito ao futebol. Nós tratamos como brincadeira o fato de boato aqui, boato ali, as montagens da internet, da rede social já dizendo, às vezes, que o Cavani já estava em Porto Alegre. Por outro lado, quando chegou a hora de falar sério, a gente ponderou, destacando que as informações são de que existe a cogitação do Grêmio, mas deixando claro sempre que boato é boato. E a gente brincou com esse boato, pois o esporte também é entretenimento.

Guimarães: A gente tem, praticamente fixo no Grêmio, o repórter Rafael Pfeiffer, que tratou da forma mais profissional, responsável e coerente possível, apurando os fatos e nunca dando a entender nada de diferente do que realmente aconteceu. E ele agiu como repórter e fez tudo direitinho para que não tenha nenhum tipo de fiasco da empresa. Tratamos de forma jornalística, com muita responsabilidade.

Qual é o papel da imprensa esportiva durante momentos como esse? Vale a pena alimentar rumores por conta da audiência?

Meneghetti: Nunca vale a pena alimentar rumores para ganhar audiência. A audiência se conquista com responsabilidade. E com bom conteúdo, com informação correta, com análise isenta. A imprensa tem o papel de apurar a informação e analisar suas consequências com isenção editorial. Observo que a imprensa do Rio Grande do Sul teve um papel adequado, na grande maioria dos momentos, sobre este episódio. A imprensa reverberou o que o Grêmio disse publicamente. Na última segunda-feira, o presidente Bolzan afirmou ter expectativa de acertar com Cavani. "Se tiver na cabeça dele de fazer um projeto que fique próximo do Uruguai, creio que aí ele poderá acertar conosco. Eu tenha esta expectativa", disse o presidente. E esta declaração é impactante.

Maicá: Com certeza, não vale alimentar nenhum rumor. No meu canal do YouTube, por exemplo, eu só falei de verdade sobre Cavani quando o assunto ganhou fontes e informações confiáveis. O que ocorreu foi que o Grêmio, de uma maneira até irresponsável, alimentou o rumor de que ele poderia ser apresentado na live de aniversário. E, não, não vale alimentar rumor por audiência.

Glauco: Neste caso, se impõe a imprensa esportiva verdadeiramente investigativa, que lida com fatos jornalísticos, de averiguar quais são as fontes, quais são os fatos que são verdadeiros realmente e designar ao seu leitor e espectador o que existe de oficial e o que existe de brincadeira, de entretenimento. Por quê? Porque nós temos também a questão de caçar cliques e nós estamos misturando muito o que é jornalismo esportivo, o que é entretenimento, o que é caça-clique, o que é informação. É claro que vale pelo clique para quem tem o seu canal individual, as emissoras convencionais também usam seus espaços virtuais para conseguir likes, isso é inegável, mas isso não pode se sobrepor ao fato em si. Estou falando dos meios oficiais, convencionais. Agora, estes jornalistas que têm seus canais próprios, que lidam com a passionalidade, logicamente que vão querer o clique e, para isso, um enredo é formado, uma história é criada, para que o torcedor vá lá e leia, assista ao vídeo e deixe lá o seu like. Não é o nosso objetivo primordial, falando aqui como o SBT. O nosso objetivo é brincar quando é possível brincar e informar sempre. Sempre é uma obsessão.

Guimarães: O papel da imprensa esportiva é simplesmente relatar fato e não alimentar nada. O problema é que tem muito influencer por aí, muito torcedor disposto a alimentar para que ele tenha o crédito, para que ele possa dizer que é fonte. O que alimenta, no final das contas, é o ego dele. Na minha opinião, a imprensa séria ainda tem o seu papel, a sua responsabilidade, mas a imprensa desses influencers, dessa galera que não tem muito a quem prestar contas, acaba alimentando o imaginário dos outros.

A nota divulgada pelo Grupo RBS:

A divulgação de informações sobre possíveis vindas de jogadores integra a cobertura esportiva de todos os veículos de comunicação. No Grupo RBS, a produção de conteúdo está focada em dar espaço à informação, apurada e verificada para retratar o fato e o contexto em que está inserido, e também à opinião, sustentada na análise de comentaristas e colunistas.

Vale destacar que, para esta matéria, Coletiva.net procurou ouvir a Rede Pampa de Comunicação, uma vez que o grupo possui uma emissora dedicada ao jornalismo esportivo, a Rádio Grenal. A empresa, através de sua assessoria de imprensa, informou que não participaria.

 

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