Diversidade e Comunicação: Tauana Jeffman e a voz que não pode ser silenciada

Articulista do dia em Coletiva.net, publicitária conversou com Luan Pires

Tauana Jeffman tem 38 anos e hoje atua como analista de Conversion Rate Optimization (CRO) no Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas do Rio Grande do Sul (Sebrae/RS). Como ela mesma define, basicamente analisa dados para ter resultados pensando na experiência do cliente de forma estratégica. Publicitária com um trajetória que inclui diversas áreas como Comunicação Institucional, performance, arquitetura da informação, branding e pesquisa de mercado e docência, ela conta que, mesmo com um currículo recheado de certificações e um doutorado, precisou, por ser mulher, gritar para ser ouvida por muitos homens. Mas, como ela mesma afirma, hoje em dia sabe do seu valor e destaca o apoio femino como pilar essencial para que todas as mulheres não precisem gritar para fazerem suas vozes serem consideradas.

Você acabou trabalhando em muitas áreas da Comunicação. Mesmo com alguns avanços, ser mulher em qualquer área exige enfrentar desafios. Como foi pra você essa jornada?

Eu quase sempre trabalhei, por casualidade, em lugares em que eu era praticamente a única mulher no grupo. Isso teve resultados positivos e negativos. Em um local que eu trabalhei algum tempo atrás, eu percebia que às vezes o fato de eu ser mulher influenciava. Eu era sempre o voto vencido, praticamente nada que eu falava era levado em consideração. Até achei que poderia ser uma questão pessoal, mas depois fui percebendo que não. Foram diversas vezes que eu voltei pra casa chorando de raiva porque no momento de tomar uma ação eu era ignorada, mas no momento de cobrança por resultados, os dedos encontravam a minha cara. Eu arcava com as consequências de decisões que não eram minhas. 

Teve alguma situação que a marcou mais?

Uma vez, ouvi de um dos meus chefes, que era conhecido por ser bem grosseiro,  que ele não ia ficar cuidando o que ele falava, pisando em ovos só porque eu era sensível demais, cheia de melindres, que o meu problema é que eu era mulher e mulheres geralmente eram sensíveis demais. E eu só queria ser tratada com respeito, apenas isso. Outro tipo de situação que me incomodava era nas reuniões com clientes, onde eu apresentava toda a estratégia e só depois que meu chefe finalizava com uma frase, o cliente concordava. Obviamente, saí deste lugar. Hoje, no Sebrae, eu percebi que as coisas podem ser diferentes. Lembro que em uma das primeiras reuniões que eu tive quando cheguei aqui, entrou na pauta uma demanda que eu estava executando. Então, um colega abriu o microfone e começou a explicar a demanda como se ele estivesse no comando. Lembro que a gerente abriu o microfone e disse: Fulano, essa demanda quem está executando é Tauana e ela está com a mão levantada pra falar. O que a gerente fez, não só pra mim, mas pra todos, foi dizer que ninguém ia se apropriar de uma demanda que uma mulher fez. Isso é significativo. Hoje, tenho a sorte de trabalhar com mulheres incríveis, minha coordenadora técnica, minha gerente, a gerente do Marketing que eu trabalho são todas mulheres que sabem que o meu crescimento é o crescimento delas também. Estão sempre me incentivando.  

E olhando para toda essa trajetória profissional, o que você tira disso?

Eu confesso que, após terapia, notei uma sensação de síndrome da devedora. Eu sempre sentia que não estava sendo o suficiente e isso acabou me incentivando a estudar muito. Quando a pessoa duvidava da minha capacidade, e eu queria mostrar que era capaz, então eu queria estudar mais, ter mais certificação, mais leituras, correr atrás de um currículo pra me dar poder de falar e argumentar, preocupação que um homem não precisaria ter. Era, em resumo, um pensamento de que "se tu não estás ouvindo o que eu estou te falando, vai ouvir meu currículo". Claro que estudar é ótimo, mas precisa ser porque tu queres e não pra provar nada a ninguém.

Você já viu melhoras em relação a equidade de gênero?

Acho que a gente avançou, mas tem muito mais para avançar, principalmente em relação a valorização do que a mulher fala. Eu vejo que às vezes a mulher é vista como sensível demais, aquela que não consegue racionalizar a situação como se fossemos um ser totalmente emocional que não tem capacidade para julgar uma decisão. Hoje, no meu trabalho, a questão de três lideranças mais próximas a mim serem mulheres é uma mudança significativa, mas precisamos  olhar quem está lá em cima também, ainda são os homens. No Sebrae tem muita roda de conversa, publicações educativas, mas sabemos que é uma mudança estrutural e cultural de longo prazo que estamos plantando para que nossas filhas e netas possam colher. 

E a Tauana criança imaginava chegar onde ela chegou? Mesmo com esses desafios?

Eu tive uma infância maravilhosa e fui criada com muito amor. Mas sendo uma menina que cresceu no interior, vivenciei situações complicadas. Claro que hoje eu entendo que naquela época o pensamento era bem antiquado. Eu lembro que queria muito saber mexer em ferramentas, minha família era de mecânicos e nunca nem cogitaram passar esse conhecimento pra mim porque não era habitual da mulher. Hoje eu não sei nem apertar um parafuso! Conversando com meu colega, ele falou que a família dele ensinou tudo, que trabalhava com o pai dele e com ferramentas... Então desde pequena vão nos condicionando para lugares. A gente deve escolher nossos lugares. Ninguém mais. Isso eu levo em tudo que eu faço.

O que é diversidade e inclusão para você?

Eu acho que é, neste caso, o crescimento conjunto desses grupos. Por isso, queria dizer pra todas as mulheres procurarem lugares que permitam ser quem elas são e quem elas querem ser. Existirão lugares que vão te massacrar e outros lugares e pessoas que vão te ajudar a crescer. Não te demores em locais que te querem pequena. Nós somos grandiosas.


Esta matéria faz parte de um conteúdo especial sobre diversidade e Comunicação, produzido por Luan Pires para Coletiva.net. Quinzenalmente, o jornalista publica uma entrevista exclusiva com o articulista do dia. Para conferir o artigo de hoje, assinado por Tauana Jeffman, clique aqui.

Autor
Luan Nascimento Pires é jornalista e pós-graduado em Comunicação Digital. Tem especialização em diversidade e inclusão, escrita criativa e antropologia digital, bem como em estratégia, estudos geracionais e comportamentos do consumidor. Trabalha com planejamento estratégico e pesquisa em Publicidade e Endomarketing, atuando com marcas como Unimed, Sicredi, Corsan, Coca-Cola, Auxiliadora Predial, Deezer, Feira do Livro, Museu do Festival de Cinema em Gramado, entre outras. Articulista e responsável pelo espaço de diversidade e inclusão na Coletiva.net, com projetos de grupos inclusivos em agências e ações afirmativas no mercado de Comunicação. E-mail para contato: [email protected]

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