Leandro Demori: "Imprensa brasileira trabalha para a elite intelectual"

Editor-executivo do The Intercept Brasil conversou com alunos da Famecos na noite desta quinta-feira, 6

Leandro Demori e Moreno Osório - Divulgação/Coletiva.net

Jornalismo político na era da pós-política foi o assunto central da conversa do editor-executivo do The Intercept Brasil com alunos da Famecos, da PUC, na noite desta quinta-feira, 6. Ao longo de pouco mais de uma hora e meia, o jornalista, que se formou nessa faculdade em 2005, falou sobre o que acredita ser a pós-política e como é possível fazer jornalismo neste momento em que o País enfrenta uma crise no setor. Ele também abordou o papel da imprensa e afirmou: "A imprensa brasileira trabalha para a elite intelectual e para a própria categoria".

A afirmação foi feita quando Demori se referia a como o The Intercept Brasil - criado em 2016 - procura se comunicar com o público. De acordo com o jornalista, o site, inicialmente fundado nos Estados Unidos pelo norte-americano Pierre Omidyar, do eBay, em 2014, busca trazer uma linguagem simplificada para o leitor. Clichês, bordões, texto burocrático e palavras usadas apenas por jornalistas não fazem parte das publicações. "A informação deve ser clara e o conteúdo deve ter impacto na sociedade", decretou, acrescentando que transparência também é fundamental. Outro detalhe é que os repórteres usam o mínimo possível de informação off the record (sem citar a fonte), e quando o fazem, explicam a razão disso.

Jornalismo fortalece a narrativa e o The Intercep Brasil busca ter consciência disso, conforme disse Demori. "Sempre avaliamos a pauta quando se trata de acusações ou algo que vá causar a demissão de alguém. Temos um compromisso social", pontuou, e disse que todos da equipe do site são livres para usar suas redes sociais, posicionando-se, inclusive, politicamente. "Essa história de que jornalismo é apresentar fatos não existe. A imparcialidade termina no momento em que um veículo escolhe as matérias que serão publicadas, as palavras que serão usadas no texto e o tempo que será dado a determinado assunto", analisou.

Questionado a respeito de jornalismo pago, Demori explicou que todas as matérias do site são públicas, pois o The Intercept acredita que a informação deve chegar a todos. "Não temos paywall e não cobramos acesso ao portal", avisou. O site é subsidiado, além da verba internacional, pelos leitores que contribuem livremente e, segundo ele, a página no Brasil tem mais de dois mil membros, que doam cerca de R$ 57 mil por mês, o que resulta em mais de meio milhão de reais por ano. Ainda, deu sua opinião sobre os serviços de checagem de fatos e a onda de notícias falsas: "Não acredito que o fact checking resolva a questão. Embora seja importante desmentir as fake news, essas análises chegam depois que a informação se espalhou e com muito menos força".

A pós-política, para ele, começou em 2013, com as manifestações públicas que tomaram as ruas do Brasil. Para explicar, Demori faz uma contextualização política da época e lembrou que as pessoas, naquele momento, deixaram de acreditar nas instituições, como Supremo Tribunal Federal e Imprensa, por exemplo, e passaram a criticar nominalmente. "A imprensa não era mais a grande inimiga, e sim, jornalistas específicos. Assim como no STF e nos próprios partidos políticos", exemplificou.

O convidado também falou sobre o presidente do País, Jair Bolsonaro, e como ele chegou ao cargo. "Foi o único político que percorreu o Brasil ao longo de 2018 e ouviu o que as pessoas queriam. Ele foi ao interior do Mato Grosso e percebeu que os fazendeiros queriam ter armas para se proteger dos sem-terra, e assim fez em todas as regiões. Bolsonaro enxergou uma oportunidade que ninguém mais viu, e levou isso para o seu discurso", analisou.

A publicação online The Intercept foi lançada em fevereiro de 2014 pela First Look Media, uma organização de notícias criada e financiada pelo fundador da eBay. A plataforma tem como editores Glenn Greenwald, Laura Poitras e Jeremy Scahill. No Brasil, o site entrou no ar em agosto de 2016. Além de Demori, a versão brasileira tem Betsy Reed, como editora-chefe, e a equipe é formada por outros 18 profissionais. Greenwald advogado e jornalista norte-americano, especialista em direito constitucional. Em junho de 2013, foi um dos jornalistas que, em parceria com Edward Snowden, levaram a público, através do jornal britânico The Guardian, a existência dos programas secretos de vigilância global dos Estados Unidos. Pela reportagem sobre espionagem da Agência de Segurança Nacional (NSA), ele ganhou o Prêmio Pulitzer de Jornalismo em 2014.

O bate-papo ocorreu no auditório da Famecos, da PUC, com a participação do professor Moreno Osório, que conduziu as perguntas ao convidado. Participaram cerca de 170 alunos da faculdade, que, após a apresentação, tiveram a oportunidade de fazer questionamentos a Demori. A iniciativa foi do curso de Jornalismo, em parceria com o Farol Jornalismo.

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