Coletiva em amarelo: comunicadoras compartilham relatos sobre saúde mental

Portal conversou com as jornalistas Alexandra Zanela e Carolina Schubert, e a publicitária Patrícia Santejano

Coletiva.net ouviu relatos de profissionais da Comunicação - Arte Coletiva.net

Durante esta última semana de setembro, mês no qual levanta a bandeira de cor amarela em alusão à campanha de prevenção ao suicídio, o Coletiva.net realiza um especial para discutir as questões de saúde mental no setor da Comunicação gaúcha. A ansiedade se mostra como o transtorno que mais afeta os profissionais de todas as profissões, sobretudo no período de Covid-19, de acordo com o estudo feito pela The School of Life, em parceria com a Robert Half - empresa global de consultoria de recursos humanos com sede em Menlo Park, Califórnia.

Os dados divulgados recentemente mostram que este impacto na saúde mental é de 64,10% em diversas regiões do Brasil. Um estudo capitaneado pela Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), em 2020, mostrou que os profissionais convivem com aumento de estresse e ansiedade, número este de 61,25%. Na área da Comunicação, as mulheres lideram este ranking, 51,53% são mulheres e os outros 48,47% são homens. 

Por isso, hoje, a reportagem conversou com três mulheres da área, com histórias diferentes, porém, que compartilham do mesmo problema: a saúde mental. São elas: as jornalistas Alexandra Zanela, sócia-fundadora da Padrinho Conteúdo, e Carolina Schubert, sócia-fundadora da Porque Assessoria, além da publicitária Patrícia Santejano, profissional de atendimento na Hoc

"Eu tenho sindrome do pânico e ansiedade" - Alexandra Zanela

De acordo com a jornalista, tudo começou a mudar após a morte do pai, em 2011, figura representativa em sua vida. Porém, ela tentou ser forte e não viver aquele luto. "Tenho 40 anos, a minha geração sempre achou que sentir coisas diferentes eram normais, porém, os poucos comportamentos começaram  mudar." Em 2016, chegou um momento no qual achava que o que ela tinha era somente estresse, quando teve a primeira crise de ansiedade. "Teve um dia que meio que saí da realidade, quando fui vista andando pela rua, isso eu não lembro, me contaram", relatou. 

 

 

Ali, foi o primeiro momento, pois não se sentia mais normal. Quando foi ao médico, ainda acreditando que se tratava apenas de estresse e acúmulo de trabalho, o médico sugeriu um tratamento. "Eu disse ao médico que estava tudo bem e que em três semanas tiraria férias. O doutor me disse que neste tempo eu não sobreviveria: ou você para agora, ou você morre". A partir dali, iniciou um tratamento com medicações, até 2019, quando começou a diminuí-los.  

Hoje, ela ainda não se livrou dos problemas de saúde, mas continua fazendo tratamento e reconhece a doença, além de contar a sua história para as pessoas. "A minha relação com isso é essa, controlada, porém, sempre atenta às reações, que sempre podem acontecer", disse. 

Questionado se já pensou em se suicidar, a jornalista respirou e disse que a pergunta a fez refletir. "Não pensei em suicídio, mas não tive expectativa de mais nada, disse ao meu companheiro que não conseguiria superar os momentos de pânico, ai eu pensei em não existir mais", confessou. Apesar disso, agradece à família e ao marido, que estão sempre atentos. "Eu sempre falo que este assunto é delicado e por isso não acho que uma pessoa que tome essa atitude seja egoísta, pois ela já tentou de diversas formas superar aquela dor e não conseguiu." 

Alexandra acredita que em decorrência da pandemia, somente agora as empresas começaram a olhar com mais carinho para os problemas de saúde mental dos funcionários. "Falo isso por experiência, os líderes não estão prontos para isso, e mesmo sendo dona de uma empresa, também não estou, pois a gente ainda não sabe o certo para onde ir e o mercado no geral também, infelizmente não sabem", ressalta. 

Ela acredita que, como gestora, tem a responsabilidade de também ter empatia com os seus colaboradores. "Todos nós precisamos entender o comportamento, pois temos a responsabilidade por eles, e não somente observar os seus resultados, mas também a saúde mental de cada um e suas características pessoais", finalizou.  

"Eu tentei cortar os pulsos" - Carolina Schubert

A jornalista Carolina Schubert tinha 22 anos, acabava de se formar pela Universidade do Vale do Sinos (Unisinos), conquistado um emprego que sonhava na cidade São Paulo, quando tentou o suicídio. "Não deu certo. Eu tentei cortar os pulsos, mas a lâmina que peguei não tinha fio e, por isso, me machuquei bastante. Não sei o certo o porque fiz aquilo. Minha mente apagou e eu só queria desaparecer naquele momento. Não lembrei de mais nada e de mais ninguém", relatou. 

 

Ela contou ainda que a mente dela estava apagada e só queria parar de existir. Na época, ainda não fazia terapia, atitude que tomou após o ocorrido. "Minha vida era perfeita, minha família perfeita. Eu não sabia que tinha depressão. Fui entender tudo só depois quando busquei ajuda para passar pela tentativa", contou. Segundo ela, a busca por tratamento ainda demorou, só dois anos depois, quando realmente entendeu a importância de procurar por profissionais especializados. 

Recentemente, passado alguns anos do ocorrido, Carolina resolveu contar a história nas redes sociais. "Decidi falar sobre porque voltei a fazer terapia na pandemia. Antes eu falava do assunto para poucos amigos, pois sentia vergonha e medo de ser julgada", explicou. "Com o passar do tempo percebi que só estamos libertos de fato daquilo que conseguimos externar sem mais dor." 

Confira o depoimento sobre a tentativa de suicídio no Instagram: 

A jornalista alertou sobre a importância de não romantizar o tema tristeza. De acordo com ela, a tentativa de suicidio  é algo muito sério. "Eu resetei minha vida ali, entendi demais a minha história, minha mãe biológica é suicida. Então, cada relato é um caso muito único. Eu não tive motivações claras na época. Hoje, eu olho para trás e consigo entender que eu precisei passar por isso", ressaltou. Ela enalteceu o fato de ter superado a situação, pois o desfecho de histórias como essa podem ser muito trágicos. 

A profissional acredita que qualquer pessoa, independentemente de profissão, deve fazer terapia, buscar por espiritualidade, trabalhar o autoconhecimento e praticar atividades físicas. "Se tiver a oportunidade de fazer constelação familiar, entender um pouco sobre sistêmica mudou a minha vida, também é importante", indica. 

Sobre os ambientes propícios da Comunicação, aptos para receber um profissional que está passando por depressão, a jornalista acredita que todos os setores podem estar atentos a seus profissionais. "Muitas pessoas demonstram traços de depressão e ou ansiedade. Então, acredito que é possível perceber por exemplo uma queda na produtividade do profissional com o qual lidamos todos os dias e tentar conversar, porém não sabemos se a pessoa vai se abrir, delicado!", disse. 

Ela contou ainda que talvez o melhor que as empresas possam fazer é falar sobre o  assunto, ter um psicólogo à disposição, o que acha ser complicado para todas as organizações. "Acredito que iniciativas como essa do Coletiva já são de imensa valia. O que não podemos é fingir que não existe." 

Para quem sente sintomas de depressão, pânico e ansiedade, Carolina sugere a busca por um profissional de saúde.  Ela aprendeu que dar conselhos e querer a resolver a vida de alguém não é uma forma legal de lidar com o próximo que está passando por algum problema. "Eu era o tipo da pessoa que tentando ajudar alguém, dava várias saídas, 'quem sabe você faz isso e aquilo outro'", narrando a forma que falava. Hoje, limita-se a dizer frases como: "tenho certeza que você vai encontrar a melhor forma de lidar com esse problema, e se precisar conversar estou aqui", destacou. 

"Minha família conseguiu me levar há tempo para o hospital" - Patrícia Santejano

Questionada se já tentou se suicidar, a publicitária Patrícia Santejano respondeu: "tentei em 2019, não havia desistido de fazer, mas ainda bem que não deu certo, pois minha família conseguiu me levar há tempo pro hospital", disse, preferindo não revelar detalhes do ocorrido. De acordo com ela, os fatores eram inúmeros. "Estava trabalhando em uma empresa onde tinha uma responsabilidade muito grande, era muito cobrada pelas entregas da equipe, que precisavam cada vez ser mais ágeis e mais assertivas", relatou. 

 

"Eu já estava em um processo inicial de depressão, mas achava que na realidade estava cansada e não sabendo administrar as cobranças do trabalho, então acabei não dando bola, mesmo tendo procurado um profissional da área", rememorou.

Segundo ela, o momento era de muita tristeza, desânimo, cansaço extremo, insônia e muito sentimento de culpa, fazendo com o que sempre estivesse na defensiva. Além disso, tinha o fato de se desvalorizar, pois acreditava que tudo que fazia estava aquém do esperado por sua gestora. "Nos últimos dias antes da tentativa de suicídio, meu marido me levava ao trabalho, e eu ia chorando o caminho inteiro e quando voltava só queria tomar um banho e me deitar. Os sinais estavam ali, mas a gente sempre reluta em assumir que está doente", relatou. Após a tentativa, ela foi diagnosticada com depressão grave e síndrome de burnout.

Para ela, o ambiente de Comunicação pode ser considerado propício para que os trabalhadores tenham a saúde mental prejudicada. "Lidamos totalmente com totalmente com as expectativas dos outros, geralmente com prazos apertados. Existem muitos gestores não capacitados para lidar com processos emocionais e principalmente por que as doenças psicológicas ainda são estigmatizadas e discriminadas, não somente no ambiente de trabalho, mas também na sociedade", disse.

No entanto, ela acredita que a maioria é de gestores mais humanizados, colegas e empresa que entendam e o amparem. "Claro que uma empresa com um Recursos Humanos preparado e capacitados é importante, mas acho que acima de tudo precisamos ter locais mais informados sobre essas doenças."

Ela ainda conta sobre o que ocorreu com ela após se recuperar e retornar à vida normal. "No meu caso eu fiquei afastada do meu trabalho por três meses, quando retornei a empresa para a qual trabalhava me desligou", contou. Contudo, em menos de dois dias, outra empresa a chamou". Eu ainda estava em processo de recuperação e tratamento, e na entrevista deixei isso claro para a pessoa que seria minha gestora. Mas ela foi super receptiva comigo e disse que sabia que eu era uma boa profissional e que tinha boas recomendações", relatou, ao completar que a líder a deixou à vontade para falar quando algo não estivesse legal. 

Como recado, ela diz para que não subestimem os sinais corporais, pois é tempo de procurar ajuda de um profissional da área para e auxiliar na busca do melhor tratamento. "A depressão não é uma doença que desaparece rapidamente. Muitas vezes, ainda teremos momentos ruins, onde o apoio da família, amigos e colegas de trabalho são importantes. Por isso, não podemos ter receio e nem vergonha de falar que estamos doentes", finalizou. 

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