Isabel Ferrari: Ligada no 220v

Com uma gargalhada espontânea que preenche os ambientes que frequenta, a jornalista deixou sua marca no Telejornalismo

Isabel Ferrari - Mateus Bruxel

Tendo a infância marcada pelo estímulo à leitura e à produção textual, além do exemplo da carreira da mãe e também jornalista Mirtes Ferrari e do tio-avô Pedro Villas Boas, Isabel Ferrari conta que tinha diversos cadernos nos quais registrava as histórias que inventava aos sete anos. "Eu me criei vendo ela em frente à máquina de escrever e na Feira do Livro. Essa era minha realidade em casa." Mergulhada no universo das letras, a escolha profissional não poderia estar longe disso. Antes de se descobrir como repórter, ingressou no curso de Publicidade e Propaganda, no qual se graduou com o objetivo de ser redatora em agências. Ainda que tivesse buscado não seguir os mesmos passos dos familiares, a aptidão com a escrita e o gosto pelas pessoas conduziram-na ao Jornalismo.

"Nunca pensei em trabalhar com televisão, e sim com jornal impresso", diz, recordando que a primeira oportunidade de estágio surgiu na TVE, emissora da Fundação Piratini, onde foi apresentada aos bastidores da telinha e se apaixonou pela edição e pelo desafio de misturar texto com imagens. Naquele momento, deu-se conta de que poderia incrementar suas histórias com outros elementos que dariam mais vida aos acontecimentos que, mais adiante, passaria a registrar na RBS TV e na Rede Globo.

Encantada, buscou mais conhecimento, como o curso 'Jornalismo Aplicado' de Zero Hora, organizado pela jornalista Eunice Jacques, falecida em 1997. Após um ano de aulas de Artes, Administração, Direito e aspectos jornalísticos fundamentais ao exercício da profissão e prestes a ingressar na redação de ZH, inscreveu-se no projeto 'Caras Novas', também do Grupo RBS, que lhe deu noções de edição e de texto para TV. "Depois de oito anos estudando, é praticamente Medicina", fala, entre gargalhadas, que finalmente, estava naquilo que eu amava.

Fora do padrão

Natural de Porto Alegre, a irmã do veterinário Ricardo foi criada por uma família, considerada por ela, muito moderna. A característica é justificada pela relação que via entre sua mãe e seu pai, o engenheiro Carlos Alberto, e pela forma com a qual o empresário conduzia as tarefas da casa e as responsabilidades com os filhos. "Era ele quem ia às reuniões da escola, buscava-me na natação e fazia as compras no supermercado. Na época, acreditava que todos eram assim."

Também lembra que o patriarca dos Ferrari era um homem compreensivo com o exercício profissional da esposa e totalmente apaixonado, além de ser um grande incentivador e fã da filha. "Ele vibrava muito com o meu trabalho. Um fofo da minha vida", completa, comentando, com saudade, que perdeu o pai há nove anos, vítima de infarto. A ele e à mãe, deve a noção de masculino, que nada tem a ver com ser "machão", e o lado humanista e libertário que busca exercer suas funções de repórter, mãe, esposa e amiga.

Já a ausência de Mirtes, por causa da atuação na Prefeitura de Porto Alegre, refletiu-se na maternidade de Pedro, seu único filho, de sete anos. Quando decidiu engravidar, aos 38 anos, estava se despedindo de uma maratona frenética de viagens para o quadro Menina Fantástica, do programa Fantástico, da Rede Globo. Para gerar uma vida, Bel, como é conhecida pelos colegas e familiares, optou por puxar o freio de mão e dar atenção ao pequeno que estava a caminho.

Pedrinho, fruto do casamento com o engenheiro Joel Santos, tem a mesma energia e disposição que a jornalista. Como se tornou mãe com uma idade mais avançada, decidiu que a rotina giraria em torno do filho, fazendo com que todo tempo fora da redação fosse compartilhado com ele. Por isso, deixa de ir a espetáculos de Bossa Nova com gosto, e garante que o melhor show é o do filho com as músicas da Galinha Pintadinha. Fora do expediente, diverte-se com Pedro na piscina ou dando umas voltas de bicicleta para gastar energia. Mas o programa favorito do trio é ir para a praia, melhor ainda se for para Garopaba, em Santa Catarina. "Quando eu desacelerar, quero morar lá."

Por influência dos homens de sua vida - pai, irmão e marido - é colorada, mas daquelas que não entende nada e nem vai ao estádio Beira-Rio para acompanhar as partidas do time. Prefere ficar em casa assistindo a filmes baseados em histórias reais, como o 'Lion: uma jornada para casa', de Garth Davis; ou saboreando um salmão com molho de maracujá com crosta de amêndoas, feito por Joel. Na cozinha, é quase proibida de entrar. O motivo? Tudo o que tenta fazer dá errado.

Pé no barro

Desde 1998 na RBS, expõe, em tom de brincadeira, que só não foi porteira. Passou pela produção, edição, reportagem e apresentação. Sem nunca ter tocado pautas no estilo hardnews, afirma que, inconscientemente, encontrou-se no modelo de trabalho cuja produção das matérias seria semanal e com abordagem mais aprofundada dos temas. Ela se refere às matérias sobre Comportamento e ao perfil de contadora de histórias que acredita ter. Bel aproveita a facilidade de dialogar com as pessoas e de se enturmar rapidamente para fazer com que os entrevistados se sintam confortáveis em "bater um papo com ela".

Sem titubear, afirma que a maior empolgação está em ir para a rua encontrar histórias bacanas e que não existe alguma favorita. Entre tantos fatos engraçados que passou durante as gravações, recorda de um idoso que havia procurado uma academia do amor e na entrevista acabou contando a ela algumas baixarias. "Sempre dou risada, mas aquela vez foi demais." As gargalhadas e o bom humor são, sem dúvida, seu cartão de visita.

Com duas décadas de empresa, passou pelos hoje extintos Teledomingo e Vida & Saúde, que apresentou ao lado da jornalista Laura Medina por 12 anos. Ela garante que o mais importante deste período foi a amizade que construiu com a colega de trabalho. "Éramos uma dupla de verdade e nosso diálogo era real." Atualmente, faz reportagens especiais para o Jornal do Almoço, além de integrar o núcleo da Rede Globo na Capital, ocasionando em conteúdos para as atrações Bem-estar e Fantástico. O programa de domingo era um sonho de infância que, com "muita trabalheira", tornou-se realidade.

Sem perder a agitação

Há quase 20 anos em sessões de terapia, onde procura ajuda para saber se relacionar com as pessoas, ser melhor no mundo e não incomodar ninguém com sua inquietude, encontra semanalmente uma psicóloga. Junto dela e para enfrentar o luto do pai, descobriu na Filosofia um entendimento para a finitude e para o comportamento humano. Não é por acaso que, atualmente, seu livro de cabeceira é do escritor israelense Yuval Harari, o Homo deus, que discorre sobre o futuro da humanidade na Terra. Também desse autor, destaca a obra Sapiens.

Porém, é de 'Bom dia, angústia', do filósofo Andre Comte-Sponville, que tirou seu lema de vida: Onda há vida, há angústia. "É um jeito de aprender a lidar com os problemas e isso está ligado ao meu bomhumor", observa, completando que vive o hoje sem antecipar o amanhã e que não remói o passado. Ela garante que são hábitos que tinha quando era mais jovem. A única característica que segue a mesma, desde quando era criança, é ser falante demais. "Não consigo ficar quieta, tenho bastante dificuldade", confessa. Outro desafio é acreditar em religiões, porque "ou você nasce com fé ou não a tem". Argumenta que crença, para ela, é fazer o bem aqui, ser generoso com as pessoas e não ter preconceitos.

A moradora do bairro Menino Deus, em Porto Alegre, acredita que sua agitação é para dar conta da agenda diária do trabalho, que se inicia às 8h30 na TV e se encerra às 20h, além dos compromissos com a família. Sempre a mil, lembra que um cinegrafista no Rio de Janeiro, quando começou a produzir as reportagens especiais para o Fantástico, a apelidou de 220v. "Às vezes, penso que estou muito lenta, mas o povo me garante que não. Meu giro é um pouco acima."

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