João Pedro Vargas: Criação coletiva 

Apontado entre os melhores diretores de Arte do mundo, João Pedro Vargas acredita no valor do trabalho em conjunto  

João Pedro Vargas | Crédito: Claudio Lacerda
Em um apartamento na Avenida Protásio Alves, ainda menino, João Pedro Vargas criou o gosto pelo desenho, um passatempo que ganhou força e, aliado à atração pelo cinema e televisão, acabou por influenciar a escolha pela propaganda. Inquieto e perfeccionista, traçou uma trajetória ascendente, que vai de pequenas agências ao reconhecimento internacional que o colocou entre os melhores diretores de arte do mundo. Aos 42 anos e head of Art da Competence, defende que a direção de arte parte de um trabalho conjunto e, diante de um cenário que oferece cada vez mais formatos e possibilidades, a troca de ideias é o meio ideal para um resultado mais consistente. "Quanto mais pessoas se envolvem no processo criativo, mais qualidade, mais conteúdo vai ter o trabalho final", argumenta.
Antes de seguir pela direção de arte, ainda pensava em se tornar um designer, mas os primeiros cinco anos de experiência foram suficientes para obter certeza sobre o caminho escolhido. Na contramão da maioria dos criativos, começou a carreira abrindo o próprio negócio, no início da década de 1990. Ao lado de um colega da faculdade, cursada pela Ufrgs, investiu em um computador pessoal e, juntos, montaram uma pequena agência. "Sem ter experiência, sem saber como funcionava direito, só no peito e na raça. A gente nem sabia como era uma agência e queria ganhar clientes e montar uma estrutura só na teoria." Passou-se um ano e meio de trabalho e alguns jobs, e decidiram desfazer o negócio. "A gente descobriu que estava errado. Tinha que ter um pouco mais de experiência e tinha muita coisa pra aprender", recorda.
Várias escolas 
A história com a propaganda seguiu por agências como a Staff Overcom, com equipes menores e clientes de varejo, onde teve uma experiência multitarefa. Em seguida, foi para a RBA, de Novo Hamburgo, onde pôde trabalhar com marcas da indústria calçadista, como Via Marte, Via Uno e Luz da Lua. "A RBA tinha uma escola de direção de arte muito legal e clientes que investiam bastante em propaganda. Pude conhecer profissionais muito bons e aprender muita coisa, que fez meu trabalho amadurecer."
Com cinco anos de empresa e já com o sentimento de que concluía um ciclo, foi contratado pela DCS, que tinha como referência em direção de arte e criatividade. Lá, fez dupla com a escritora Claudia Tajes, conviveu e aprendeu com profissionais como Régis Montagna, então diretor de Criação; e Beto Callage, fundador e VP de Criação. "Trabalhei com pessoas que me ensinaram muita coisa. Roberto Callage, pra mim, é um deles, mestre até hoje. Me ensinou muito sobre como valorizar a ideia, não ficar na primeira camada de criação, porque, quanto mais profundo é o raciocínio, mais original e diferenciado é o resultado criativo", relata.
De diretor de Arte sênior a diretor de Criação, deixou a agência em 2011 para integrar a equipe que instalou a DM9Sul em Porto Alegre. O convite veio de Rafa Bohrer, quando a abertura da operação estava prestes a ser anunciada. O processo de montagem da agência, citado como uma grande experiência, começou em uma sala na Avenida Carlos Gomes, com algumas mesas, dois ou três notebooks e sete pessoas. "O projeto é um dos mais legais que participei, de uma agência mais enxuta, integrada, em um espaço horizontal e com outro jeito de pensar propaganda, valorizando ideia, o conteúdo - não o meio", explica. De lá, também saiu muita criação "sem frescura", como diz. "Não tinha melindre de onde surgia a ideia. Se a mídia dava uma ideia boa, era isso que valia e a gente colocava a ideia em pé", ressalta.
Para o mundo 
Dentre as referências profissionais que teve ao lado, está o redator Márcio Fritzen, que retornou ao Estado para o startup da DM9Sul, após período em São Paulo. "Trabalhamos juntos quase três anos e tivemos uma produção de ideias e trabalhos que valem por uma vida. Ele me ensinou muito, me trouxe muito da experiência de São Paulo e também a possibilidade de conhecer pessoas." Outro profissional que destaca é Marco Bezerra, vice-presidente de Criação da agência, a quem define como um cara de muita inteligência e cultura, que trouxe para a empresa muito das vivências no exterior. E para exemplificar, recorre à lição aprendida com outra de suas referências: "Quando a gente trabalha com propaganda - isso é uma coisa que Beto Callage me ensinou -, não pode só se alimentar de propaganda. O que acontece na vida é que vai possibilitar que se crie uma propaganda diferenciada".
Foram três anos de DM9Sul, que João Pedro compara a sete. Nesse período, focou o olhar no que é produzido no mundo, não mais apenas em São Paulo ou Porto Alegre. O resultado dessa mudança veio numa série de distinções, que incluem Leões em Cannes, Art Directors Club, Clio Awards, e trabalhos publicados na revista Archive, que lhe renderam a quarta posição no ranking de diretores de arte do mundo e o segundo do Brasil em 2014. O orgulho é grande, especialmente para quem, nos tempos de faculdade, era rato de anuário. "Via na biblioteca da faculdade a Archive e pensava um dia vou ter um trabalho aqui. Hoje, tenho mais de 20 peças e esse reconhecimento, mais internacional, veio com a DM9", reconhece.
Apesar de representar ascensão na carreira, diz que já sentia falta de um novo projeto. Neste ano, chegou à Competence para iniciar um novo projeto, que busca qualificar o produto criativo da agência, mudança que acontece depois de mais de um ano de tratativas com o presidente do grupo, João Satt, e o VP de Criação, Eduardo Axelrud. A primeira missão será focada em dar unidade à Direção de Arte da agência. "Depois, quero trabalhar uma comunicação  menos focada na mídia tradicional e mais no conteúdo, pensando no que a marca pode criar que tenha relevância para o consumidor", adianta.
Com os seus 
Natural de Porto Alegre, é o filho mais velho de Jorge Vargas e Maria Cristina Vieira, alfaiate e servidora pública aposentada, na família que se completa com as irmãs Maria Amélia Vargas, hoje jornalista, e Mariana Vargas, relações-públicas. Quando criança, o desenho foi o principal passatempo para distrair nos dias dentro do apartamento. A atividade recebia o incentivo do pai, que, ao voltar do trabalho, costumava trazer um caderno de desenho, e um dia era o suficiente para preencher todas as páginas. Logo, entrou para uma escola de arte, um projeto que era mantido pela Ufrgs.
Também entre as lembranças de infância está a mudança da família para uma casa no bairro Chácara das Pedras, quando tinha em torno de oito anos. A tranquilidade de uma rua sem saída, em região residencial, trouxe possibilidades de brincar na rua com uma turma de amigos. "A gente podia jogar bola, andar de bicicleta e até fazia corrida de papelão, deslizando no barranco da chácara. Foi aí que comecei a gostar de jogar futebol e conheci amigos que conservo até hoje."
Casado há 15 anos com a relações-públicas Simone Fridman, a quem conheceu na faculdade, é pai de Alexandre, 12 anos, e Eduardo, oito, que define como suas "melhores criações". É ao lado da família, sua inspiração de vida, que busca aproveitar os fins de semana. A programação é feita de atividades simples, como ir ao parque, à praia ou ao cinema, receber amigos, cozinhar ou ir ao futebol. "Coisas normais", como resume.
Também reserva um tempo para a atividade física, futebol ou academia, para gastar energia. Assume que não consegue ficar parado por muito tempo e acredita que talvez, por isso, tenha se encontrado na propaganda. "Tenho um ritmo forte de trabalho, estou sempre querendo fazer uma entrega melhor. Acho que meus filhos puxaram bem isso, porque eles têm uma energia infinita", compara.
De tudo um pouco 
Dos clássicos hambúrguer, pizza e churrasco à culinária mais sofisticada, é aberto a diferentes sabores, mas a preferência está mesmo na comida caseira e simples. Em casa, gosta de preparar filé assado, risoto  ou escolher uma receita e fazer as suas adaptações. Um prazer especial consiste em cozinhar para a família junto com a esposa. Em parceria, dois pratos já se tornaram tradicionais: feijoada e paella.
Com forte envolvimento com a arte, João Pedro é daqueles que gosta de descobrir novas referências em fotografia, cinema e ilustrações. Dos filmes e das séries de televisão, aprecia de tudo um pouco e vai do trash às produções com linguagem estética mais apurada. Com estilo musical eclético, Johnny Cash, Cartola e Natalie Merchant estão entre os músicos ouvidos recentemente pelo publicitário, que acompanha diferentes tipos de rock, jazz, eletrônico e MPB, entre outros gêneros. E a arte também está presente nas leituras atuais: ?Isso é Arte??, de Will Gompertz, e ?Art as Therapy?, de Alain de Botton.
Desenhar e praticar esportes são dois de seus hobbies. Diz que está sempre "rabiscando alguma coisa", em busca de conceitos que possam originar um projeto de arte. Também gosta de jogar futebol, praticar running, tênis e academia, embora admita estar distante das atividades há alguns meses. Colorado, garante que é um dos torcedores mais fanáticos do Internacional. "Vou ao estádio, levo o filho, sofro, tenho coleção de camisa do Inter. E estou contando os dias para a semifinal da Libertadores."

Comentários