José Antonio Vieira da Cunha: Mais longe do que se imagina

Empreendedor nato, ele é graduado em Jornalismo e Direito, porém, foi a primeira profissão que fez o coração bater mais forte

Vieira da Cunha - Divulgação

Prestes a completar 20 anos, Coletiva.net dá início a uma série de ações comemorativas ao seu aniversário. Jornalistas por graduação, mas formadas (ou lapidadas, como ele gosta de dizer) por este que foi o fundador do portal, decidimos por registrar um pouco da trajetória de José Antonio Vieira da Cunha a quatro mãos. E é por isso que este Perfil, em especial, é assinado por duas profissionais que dão sequência à sua gestão.

Por Gabriela Boesel e Márcia Christofoli

Ele pode ser o Seu Vieira, o Vierinha, o Zeca para os mais íntimos, ou, simplesmente, o Vieira. Entre tantos apelidos, José Antonio Vieira da Cunha é o mesmo para amigos, familiares, colegas e tantos profissionais que trabalharam ao seu lado: um jornalista com uma trajetória respeitada. Não poderia ser diferente para alguém que começou como operador na técnica da Rádio Cachoeira, em 1965, em Cachoeira do Sul, e, 53 anos depois, está aposentado, após deixar a sociedade da Moove.

A paixão pelo Jornalismo e até "a coragem de cursar Direito" simultaneamente na PUC (inclusive, a formatura de ambos os cursos se deu no mesmo ano!) deram lugar a uma característica vivida intensamente, mesmo quando nem a percebia: o empreendedorismo. A habilidade para tal dava sinais ainda na pré-adolescência, quando ele e um colega de ginásio, Carlos Bacchin, criaram O Caçula, mimeografado. "Vale a pena ler, é um baita de um jornalzinho", conta, com sorriso de quem se orgulha do feito infantil.

Ainda no que se refere à veia empreendedora, fundou a Coojornal, o portal Coletiva.net e a agência Pública (a qual, mais tarde, se tornaria Moove). Chegou a deixar, inclusive, uma situação estável de secretário de Redação do Correio do Povo para ser sócio da Plural, ao lado de Jorge Polydoro, que criava a revista Amanhã, entre outras iniciativas. "Quando vendemos o Coletiva.net, muitos me questionaram por que eu estava deixando de ser jornalista para virar publicitário. Isso nunca aconteceu, pois sempre fui empreendedor", avalia.

Ao deixar claro que não quer ser pretensioso, Vieira admite que cursar a faculdade na área de Comunicação "foi barbada". Não por não ter o que aprender, mas porque a teoria veio três anos depois de ter iniciado a prática. Sem contar que cresceu em família de jornalistas e a primeira remuneração veio com 10 anos, quando, em troca de uma simbólica quantia, carregava pequenas barras de chumbo para linotipos do Jornal do Povo.

Vida de repórter

Para quem passou por todas as plataformas - jornal, rádio, TV e online -, o saudosismo fica mesmo por conta das redações de impresso. Isso porque tratava-se do que chamou de "um ambiente mais vibrante". Além disso, dos tempos de repórter guarda inúmeros feitos, como ter participado da primeira transmissão de TV a cores no Brasil, ter entrevistado o Nobel Albert Sabin e ter acompanhado as filmagens de 'Um Certo Capitão Rodrigo', em Santo Amaro do Sul.

As marcas foram deixadas quando da passagem pela Folha da Manhã. "Foi bom demais ter convivido com grandes nomes do Jornalismo, com Carlos Karnas, Carlos Urbim, Núbia Silveira, Valdomiro de Oliveira, entre outros tantos. Foi lá que vivi meus melhores momentos como repórter".

Outro momento marcante foi quando atuou diretamente com o poder público. Primeiro, como secretário de Comunicação do governo Pedro Simon (MDB), em 1989, um período de intenso trabalho, e, também, claro, de muito aprendizado. Depois, retornou como presidente da TVE, já na gestão de Antonio Britto, em 1995, experiência pela qual guarda um carinho bastante especial, principalmente pelo trabalho feito de melhorias na emissora. É também dessa época que mantém amigos que se encontram até hoje, um grupo carinhosamente chamado de Confraria 1523.

Sempre de malas prontas

Herdeiro de Paulo Salzano, dono do Jornal do Povo, e Sulema, dona de casa, Vieira tem cidadania espanhola. O segundo filho de uma prole de seis - Paulo, Helena, Eládio, Sérgio e Liberato - vem de uma família de classe média baixa, mas com infância supertranquila, como ele mesmo caracteriza. Veio para Porto Alegre para terminar o ensino médio com 17 anos, no colégio Júlio de Castilhos, o Julinho. Sozinho, morou em uma pensão e, para se manter, trabalhou em uma empresa de representação de jornais. Além disso, fez um ano de CPOR, na Infantaria, experiência que proporcionou mais ensinamentos, especialmente no que se refere ao espírito de solidariedade e companheirismo.

Quem convive com ele, ou já teve o privilégio, sabe: na época do aniversário, comemorado em 20 de abril, sua ausência é quase certa na Capital. Isso porque este é o período do ano que mais gosta de viajar e, assim, une dois prazeres em um só, ou seja, festejar a data enquanto viaja sempre ao lado da esposa Eliete, com quem divide a vida há 46 anos. O próximo destino ainda está em avaliação, mas relata que tem vontade de conhecer os países nórdicos, ou, quem sabe, a Rússia?

Lugares como Veneza, Grécia, Machu Picchu, Canadá têm lugar no coração do jornalista, no entanto, a viagem mais inesquecível foi a que o casal fez a Nova Iorque, com os filhos, Bruno e Rodrigo, ainda adolescentes. "Vivemos os quatro intensamente oito dias juntos e isso deu uma liga especial na família, especialmente neles, que, até então, tinham lá suas diferenças. Foi quando criaram uma relação muito forte de profundo afeto, amor e amizade. Foi bonito de ver e é melhor ainda acompanharmos isso até hoje", conta, sem esconder o orgulho.

O momento de parar

Com quase 70 anos e mais de cinco décadas de profissão, escolher momentos marcantes é uma árdua tarefa e lista rapidamente quando se trata da vida pessoal: "Casamento, filhos e netos. Nesta ordem". Agora, quando o assunto é trajetória, fica mais difícil elencar. Após pensar um pouco, destaca a criação da Coojornal e do Coletiva.net, além do cargo de secretário de Comunicação do Governo do Estado. "Fiz muitas coisas importantes e me sinto realizado por ter deixado marca na imprensa nacional, inclusive", enaltece.

Há algum tempo, tinha decidido se aposentar quando completasse sete décadas de vida. O momento, porém, chegou um ano antes devido a diversos fatores que se sobrepuseram ao planejamento pessoal. Um deles foi a descoberta de um câncer, o qual está devidamente administrado. E, quando "trabalhava feito um maluco", resolveu tirar o pé do acelerador, dar uma parada e cuidar mais da própria vida, ou seja, conviver mais de perto com netos e filhos.

Dos 17 anos à frente da Moove, fica um carinho imenso, a torcida pelo sucesso dos que ficaram e, claro, a relação de mais de duas décadas com o agora ex-sócio José Luiz Fuscaldo. São 10 anos de diferença entre as idades e uma infinidade de características opostas, contudo, acredita que, talvez, foi isso que fez dar tão certo. "É como um casamento, que tem algumas divergências, mas um complementa o outro. A gente se entendia muito bem", assegura.

Empreendedorismo na veia

Lembra com carinho de quando criou a Cooperativa de Jornalistas (Coojornal). "Naquela época, éramos mais inquietos, rebeldes e ansiávamos muito por termos nosso próprio jornal". Inspirado por uma notícia lida em um impresso de São Paulo, levou a ideia para alguns profissionais que toparam seguir adiante. Ao lado de Rosvita Sauressig, estudou, informou-se, fez reuniões, tudo para esclarecer os caminhos possíveis para realizar o sonho.

A ideia, segundo lembra, foi bem recebida no meio jornalístico, pois a empresa não teria um dono e todos teriam direitos. "Foi um apelo relevante para cativar. Criamos um estatuto, chamamos uma assembleia e apareceram 67 profissionais. Uma surpresa", recorda. Por todo seu esforço e envolvimento inicial, conquistou o título de primeiro presidente daquela cooperativa, a qual passou a editar um impresso homônimo e que viria a ser considerado "um dos cinco jornais mais importantes da imprensa alternativa do Brasil na opinião de Bernardo Kucinski".

Coletiva.net, por sua vez, faz parte da sua vida de maneira especial, já que foram 17 anos sob o comando do veículo online que está prestes a completar duas décadas. Ao lado de Fuscaldo e, também, de Luiz Fernando Moraes, Vieira criou o Guia da Imprensa e da Propaganda, embrião do que se tornaria o portal um ano depois. Enviado via fax a um mailing de aproximadamente 100 jornalistas, o informativo surgiu apenas como meio de divulgação da empresa que o trio criara, mas ele se sobrepôs e ficou mais conhecido que a pessoa jurídica então constituída.

"Começamos a interditar alguns canais de fax e vimos que isso era um problema." É dessa forma que explica o motivo do crescimento e da notoriedade do guia, o que levou a migrarem para internet. "Tudo o que se poderia atingir com o portal, nós alcançamos. Isso me deixa com sentimento de dever bem cumprido. Chegamos mais longe do que imaginávamos".

Na intimidade

Ele e Eliete se conheceram em Cachoeira do Sul - quando Vieira se mudou para Porto Alegre, ela veio um ano depois, após fugir de casa para encontrar o amado. Companheiros e com muitas afinidades, o carinho e cuidado que têm um com o outro saltam aos olhos ao contar que, quando ela sai de casa, deixa sempre um bilhetinho. "É uma relação de afeto e não deixamos que a rotina atrapalhe", resume. Da união, nasceram Rodrigo, 42 anos, que mora em São Paulo, é jornalista e pai dos três netos de Vieira - Augusto, Vicente e Flora -; e Bruno, 38, que estudou Cinema, trabalha com eventos e reside em Florianópolis, próximo lar do casal a partir de 2019.

Ir ao cinema está no topo da lista de preferências quando o assunto é lazer, e assiste de tudo, com exceção de Terror. O gosto, aliás, vem desde muito pequeno, quando o pai, dono de jornal, ganhava muitos ingressos, então, era esse o programa favorito todo santo dia. Também vê séries "até mais do que gostaria", pois tira um tempo que poderia ser dedicado à Literatura. Nesse quesito, prefere livros de Romance e dispensa ficção. Dentre os títulos memoráveis cita 'Vermelho e Negro', 'O Grande Gatsby', 'O Tempo e o Vento', 'Cem Anos de Solidão', 'Ninguém Escreve ao Coronel'. Gosta, também, de literatura latino-americana, como Gabriel García Marquez e Vargas Llosa. Aos ouvidos, faz bem jazz, blues, música clássica, samba e MPB. Ainda que o rock não integre a lista, gosta de Beatles, Elvis Presley e Creedence.

Estimulado pelo pai a praticar esportes, Vieira fazia Judô aos 10 anos e frequentava escolinha de Basquete. Inclusive, quando estudou no CPOR, era o craque do time. Há cerca de 30 anos, o esporte preferido é Tênis, mas apenas por diversão nos finais de semana e, de preferência, na companhia de amigos de longa data. Quando o assunto é time do coração, o torcedor colorado explica que não esquenta a cabeça com essa matéria e até assiste aos jogos do rival, já que os netos são gremistas. "Gosto, vejo jogo, ouço, mas é isso", resume.

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