Luciano Potter: Uma vida de entretenimento

Ele nunca quis salvar o mundo com Jornalismo. O que busca até hoje é poder se divertir na profissão escolhida

Luciano Potter - Jefferson Botega

Ter outros profissionais com o mesmo nome levou seus colegas a inventarem um apelido para identifica-lo. O cabelo liso, a baixa estatura e um óculos arredondado foram a mistura perfeita para que Luciano da Silva Lopes passasse a ser o L. Potter - em referência ao protagonista da franquia Harry Potter. E para sumir o L da frente foi bem rápido. "Eu não gostei. Então, obviamente, pegou", diz, em uma mistura de tom conformado e irônico. Formado em Jornalismo pela PUC, cinco meses depois da colação de grau foi contratado pela rádio Atlântida - antes, porém, já havia estagiado durante seis meses no Esporte da Gaúcha. O Grupo RBS, então, passaria a ser a sua segunda casa desde então, há quase 20 anos.

O apelido já está devidamente incorporado no dia a dia, tanto que até nas suas redes sociais usa Luciano Potter. "Cheguei a pensar em incorporar o Potter, mas é um processo burocrático demais e ainda teria que mudar todos os meus documentos", conta. A esposa Marcella Lorezon - a quem conheceu, vejam só, na extinta TVCom -, porém, tratou de deixar registrado nos herdeiros. Os filhos do casal se chamam Federico Potter Lopes Lorezon, de um ano e oito meses, e o recém-nascido Santiago Potter Lopes Lorezon.

Muitas faces

Ele sabe da importância do programa Pretinho Básico na carreira, reconhece o divisor de águas que foi lá em 2007, quando a atração surgiu na Atlântida, já que faz parte da formação original do elenco. Por outro lado, é bastante correto afirmar que Potter é um profissional multimídia. Isso porque já foi possível assisti-lo na TV, lá nos primórdios, quando comandava o Papo Clip, ao lado da Rodaika, na TVCom. Um programa diário, onde recebiam bandas ao vivo e tudo podia acontecer. "Era bom demais fazer. Foi uma p*** escola", recorda. Algum tempo depois, ainda seria possível vê-lo em canal de maior alcance, a RBS TV, ao lado da colega de novo e também de Ico Thomaz, quando o trio apresentava o Patrola, a partir de 2009.

Na internet, Potter já teve coluna diária em zerohora.com, e na versão impressa do veículo manteve um espaço de escrita. Já o rádio, ainda que não fosse lá uma disciplina que prendesse a atenção do jovem estudante, esse sim pode ser chamado de habitat natural. Na Atlântida, já contaram com a voz do jornalista programas como Y, Na paz, Night Club, Barracão, Bola nas Costas e, claro, o Pretinho Básico. "Foi nessa emissora que me descobri com um microfone na frente. Comecei a falar e não parei mais", diz. Mais recentemente, a Gaúcha também é sua casa, ancorando o Timeline, ao lado de Kelly Matos e David Coimbra, e fazendo participações mais esporádicas no Sala de Redação.

Não bastassem todas essas vertentes, há pouco tempo ganhou mais uma: os podcasts. Um canal onde tem liberdade para abordar o tema que quiser, com o entrevistado que bem entender. Aliás, o principal objetivo nessa plataforma é deixar o interlocutor falar, sem muitas interrupções. "Nesses episódios, eu realmente quero saber o que a fonte tem a dizer, pois são sempre convidados interessantes", explica.

Hoje, sua rotina envolve, às 10h, o Timeline; às 11h, o Bola nas Costas; às 13h, o Pretinho; e às 18h, ele de novo. No meio-tempo, dedica-se aos podcasts, reuniões comerciais e textos que cria para "subir aos palcos com os guris" - expressão encontrada para não usar as palavras shows ou espetáculos, pois considera que seriam demais. Terminou? Não. Ele ainda tem percorrido várias regiões brasileiras com palestras. "Têm temas que estudo, que permeiam tecnologia, inovação, mudanças, conexões, enfim. É interessante poder desempenhar outro papel, em outros cenários, ainda que sempre leve um pouco de humor", avalia.

Marcas de um jornalista

Escolher Jornalismo não foi difícil. Na época de escola, com aqueles famosos testes vocacionais, já conseguiu eliminar duas áreas importantes: saúde e exatas. Ao restar humanas, chegou a pensar em Direito, Publicidade ou Relações Internacionais, mas queria algo que o permitisse trabalhar com paixões que sempre teve, como futebol e música. "Era o plano de sobreviver economicamente me divertindo", comenta, admitindo que não escolheu a profissão pensando em ficar rico. Além disso, nunca sonhou com o chamado hard news, muito menos em salvar o mundo com Jornalismo, o queria mesmo era atuar de forma leve e dinâmica. Conseguiu.

Mesmo assim, Potter admite que o "Jornalismo real" entrou na sua vida imediatamente após o fim do Patrola, com a chegada do Timeline. E, para desempenhar esse papel, confessa que precisa sempre de uma boa preparação antes. Na atração da Gaúcha, teve muitos momentos marcantes, como entrevistas tensas e outras que conseguiram repercutir nacionalmente. E, na opinião dele, é interessante poder com conversar com personagens que vão desde o governador e prefeitos até o Mundo Bita - programa infantil.

O carinho especial pelo Pretinho Básico é evidente, oportunidade que chama de dádiva. Segundo o jornalista, ela chegou para marcar um novo patamar na carreira. Potter era a única figura mais fora daquela audiência, pois os demais vinham de outras emissoras. Quando começou a se soltar um pouco mais, apanhou um bocado virtualmente. Tanto que chegou a dizer a Alexandre Fetter - responsável por convidá-lo - que deveria sair. Seu gestor, porém, pediu calma, pois em dois meses aquilo passaria. E passou. "O Pretinho tem uma história fora do ar também, de baladas, teatro, vídeos. Nos divertimos demais!", enaltece ele.

Agora, falar do seu podcast - Potter Entrevista - faz visivelmente o olho brilhar mais. Especialmente a última série, intitulada 'Deus existe?', que é a de maior audiência até hoje, dentre as quatro já lançadas. Com quase 1,5 milhão de streamings, se tivesse que escolher um episódio marcante - e são muitos, ele garante -, a conversa com o médico cardiologista J.J. Camargo foi encantadora. Aliás, faz questão de contar que nunca há edição, salvo quando o entrevistado pede para cortar alguma parte.

Pai e filho (s)

O Luciano da Silva Lopes e o Potter são exatamente a mesma pessoa. É o que garante, explicando que já houve um tempo em que o segundo foi um personagem, mas hoje deu lugar a um sujeito apenas. "Sou um pai bobalhão, que se diverte na profissão", resume, para dizer que é apenas um cara que gosta de esporte, música, cinema, séries e livros. Adora receber pessoas em casa, tanto que sempre tem estrutura para isso - e uma companheira com o mesmo perfil. Depois de algum tempo "na farra" (já que, como brinca, o microfone melhora bastante as pessoas e ele soube aproveitar isso muito bem), encontrou alguém especial, com quem pode, e quer, criar a família - e isso dura mais de cinco anos.

Aos 39 anos (ou seja, há pouco mais de um ano), sua vida mudou. Nasceu Federico, assim, sem R. "É um problema que criamos para ele", afirma, em tom absolutamente natural. A explicação da escolha é porque o casal queria um nome que fosse latino e italiano ao mesmo tempo, e pesquisaram em sites de times argentinos, chegando ao Racing Club. Acharam um jogador com esse nome e depois ainda descobriram alguns Federicos importantes no mundo. Com o nascimento do caçula Santiago, o jornalista brinca: "Daí, poderemos montar uma dupla sertaneja: Federico & Santiago".

O Potter pai, então, surge percebendo que a vida mudou completamente. Que não se está sozinho no mundo e que filho é um vínculo eterno. "É um coraçãozinho que bate fora do corpo", resume. E por falar em vínculos afetivos e familiares, Potter é o primogênito do seu Luisnei e da dona Marlene. Nasceu em Livramento, mas andarilhou ainda por São Miguel do Araguaia, em Goiás; Canguçu, no Rio Grande do Sul; Ibicuí, na Bahia; até voltar para o Sul, dessa vez para Alegrete. "Em cada um desses lugares, nasceu um filho. Sou irmão do Fabrício, da Aline e da Priscila", conta.

Ouvir, ver, ler e comer

Sem preconceitos musicais, o que cai bem aos ouvidos é um jazz, mas ainda consegue apreciar do rap ao funk, passando pelo gênero sertanejo. Para assistir, não é muito diferente, pois lembra até de ir ao cinema sozinho para assistir comédia romântica. Então, não há um tipo de filme que se negue a ver - ainda que terror não o atraia tanto. Uma obra que marcou a memória, por exemplo, foi 'Em nome da rosa', mas também pode citar 'Antes do amanhecer'. Quando o assunto é série, confessa que viu as mais pops e, como todo casal contemporâneo, Potter e Marcella assistem a algumas produções juntos, daquelas que, se virem sozinhos, será considerado traição.

Admitindo que lê muito menos do que gostaria, explica que a falta de tempo é a inimiga dessa prática. Ainda assim, consegue achar algumas brechas para saborear páginas impressas. Recentemente, terminou 'Serotonina' e começou a prestigiar o colega de emissora, Eduardo Bueno, o Peninha. Recorda o título que marcou sua vida: 'Xisto no espaço', da coleção juvenil Vagalume. Parece bobo, mas o que o jornalista explica é que ele consegue recordar do sentimento, do local onde estava, do tempo dedicado e da emoção de terminar a leitura. "Foi o que me fez gostar de ler", resgata.

Recentemente, comprou uma Bíblia de estudo, a qual vez ou outra dá uma conferida, para entender melhor o livro que considera ter moldado a sociedade atual. Além disso, "como todo profissional de humanas, que teve um ensinamento mais de esquerda", ele tem reservado um certo tempo para consumir livros de grandes nomes da direita. "E, nesse caso, não me refiro a nada tempestivo, mas autores que têm algo a dizer. Isso está me fazendo muito bem", garante.

Comer também está entre as preferências de vida, e pouco importa se isso se refere a um restaurante caríssimo ou pobríssimo, ou receber amigos em casa, para um churrasco. A experiência gastronômica é o que vale. Prato especial: a lasanha da dona Marlene. Sem contar que teve o privilégio de comer o que dizem ser o melhor sushi do mundo, no restaurante Jiro, no Japão. "Não consigo explicar o quão maravilhosa é essa experiência." E por falar no Oriente, Potter é o tipo de pessoa que, literalmente, trabalha para viajar. Durante anos, não estudou inglês, então considera que teve uma defasagem que tentou recuperar. Por volta de 2008, começou a planejar as férias para algum lugar que proporcionasse estudar a língua (e fez isso sete vezes). Hoje, porém, já são férias mesmo, com família e tudo que tem direito.

Sobre a vida

Nunca foi religioso ou acreditou em algo específico, mas fazer a temporada 'Deus existe?' em seu podcast foi transformador. O resultado é continuar sem crer em algo, mas apenas por achar que não tem capacidade de comprovar nenhuma das opções. O que as entrevistas causaram em Potter foi perceber a religião com um olhar mais adulto. "Ou seja, maravilhosamente, me deu incertezas. E sou muito mais feliz assim", resume. Agora, se tem algo no qual acredita piamente, isto se chama Sport Club Internacional. Considerando que as seis pessoas do seu núcleo familiar de origem são coloradas, é possível afirmar que esta é uma paixão de herança.

Passá-la adiante? Com toda certeza. "Meus filhos serão colorados, caso queiram manter casa e comida", brinca, naturalmente sério. O torcedor explica que, na adolescência, sofreu muito pelo time, pois não bastava perder todas, o rival Grêmio ganhava tudo. Quando inverteu, já estava trabalhando, então, pôde curtir de outra forma. Por exemplo, estava no Beira-Rio recebendo os jogadores campeões do mundo, em 2006. "Torcer para um clube de futebol é reflexo da vida, causa sofrimento e todos sabem que não vão ganhar sempre, por maior que seja a potência. Esporte é formação de caráter", avalia.

Outro aspecto que faz toda diferença na formação de vida do jornalista é ter amigos. E eles podem vir, tranquilamente, do mercado de trabalho. "Nossa área como um todo paga pouco, é dolorida, mas muito divertida. Conhecemos pessoas, lidamos com outras realidades, tudo isso nos faz ter um olhar mais atento. Tenho grandes amigos de vida inteira no meu trabalho, muitos mesmo. E essa é uma dádiva da profissão", comemora. Potter não chega a ter um lema, mas garante que o que mais busca é tentar se divertir. Esse é um dos detalhes mais importantes para ele. E poder fazer isso no trabalho, então, é uma bênção, um presente. "É claro que eu gostaria de trabalhar a metade e ganhar o triplo, mas pesaria saber se vou me divertir, se farei amigos."

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