Marcelo Leite: De malas prontas

Mudar de rumo e se adaptar tornaram-se uma constante na história do executivo de Marketing. O gosto pela gestão, no entanto, permanece o mesmo

Marcelo Leite - Jefferson Bottega

Um novo bairro, uma nova cidade, um novo país. Fazer as malas e enfrentar as mudanças são práticas com as quais o diretor-executivo de Marketing do Grupo RBS, Marcelo Leite, precisou acostumar-se desde cedo. Seja seguindo a família ou o próprio caminho, estiveram na rota Rio de Janeiro, Criciúma, Porto Alegre, São Paulo, Panamá e Estados Unidos. Tanto movimento, que teve início ainda guri, trouxe talvez consigo um prenúncio, já que, para ser bom gestor, é comum dizer que é preciso gastar sola de sapato.

A afinidade com as áreas de Marketing e Negócios foi evidenciada na infância. No Rio de Janeiro, onde viveu até os 11 anos, pequenos gestos, como a venda de sucos e sacolés, davam indícios da habilidade para a Administração. A escolha profissional, logo, foi feita com convicção, mantida mesmo durante os dois anos em que cursou, em paralelo, Publicidade e Propaganda. "Não tive dúvida de que gostava de gestão. Sempre me chamaram a atenção as questões de comportamento. Por que as pessoas compram o que compram? Por que as relações se estabelecem? Isso sempre foi apaixonante pra mim, assim como gerar negócios é muito interessante", explica.

Formado em Administração pela PUC e pós-graduado em Marketing pela Fundação Getúlio Vargas (FGV), acumula, hoje, cerca de duas décadas de profissão, período em que atuou no mercado de tecnologia, energia e comunicação, e também como docente em programa de pós-graduação e MBA.

Até a alma

A chegada ao Grupo RBS aconteceu em 1996, quando foi selecionado por meio do Programa de Trainees. Nessa primeira passagem, atuou na área de Marketing e Análise de Mercado por cerca de três anos em Zero Hora, até que fez o que hoje considera uma "grande bobagem": sair da empresa. Foi para a RGE a convite de um ex-gestor, que havia assumido o setor de Marketing da companhia, em um momento de privatização e profissionalização. "Sabe quando a gente entra naquela fase 'Preciso fazer coisas diferentes'? Foi isso", resume. A experiência durou 10 meses e, apesar de defini-la como interessante, ele conta que não se adaptou à cultura da empresa e ao setor. "Acho que a empresa não gostou muito de mim", completa, aos risos.

Insatisfeito, de lá saiu para retornar ao Grupo RBS, mais precisamente para a RBS Interativa, onde permaneceu até 2004, quando um novo convite o levou à Dell, que havia acabado de fincar raízes em solo brasileiro. "A Dell estava em um momento maravilhoso, havia chegado ao Brasil e estava se estabilizando. Muito pequena ainda em termos de market share, mas muito ambiciosa. Conseguimos fazer um trabalho muito legal, de levá-la à liderança em todos os segmentos que eram importantes e estratégicos para a empresa naquele momento", avalia.

Meta alcançada, responsabilidade redobrada! De gerente de Marketing da empresa no País, passou a responsável pelo segmento para a América Latina. Também vivenciou o ramo de vendas, antes de tornar-se gestor de Small & medium business para o Brasil e, em seguida, para a América Latina. Este último período, que descreve como muito rico, durou oito meses e teve como base a unidade de organização no Panamá. "Tive um gestor que me disse algo que nunca vou esquecer: 'Tu vais entender a vida inteira, mas nunca vai entender a alma de um vendedor enquanto tu não fores um deles'. Isso é muito verdadeiro, aprendi muito", sustenta.

Uma nova mudança profissional o aproximou novamente do Grupo RBS, em 2010, e veio na forma da uma proposta, feita por Geraldo Corrêa, para exercer a direção dos classificados digitais. Por um ano, o projeto teve a dedicação exclusiva de Leite. "Foi um projeto muito bem-sucedido nosso processo de entrada e liderança", analisa, ao citar os portais Pense Carros e Pense Imóveis, que foram vendidos em 2014. Após esse período, ele assumiu a gestão comercial dos impressos da companhia, a área de Marketing e Produto dos jornais e, por fim, no ano passado, a diretoria-executiva de Marketing do Grupo RBS.

Das paixões e saudades

Embora ainda guarde no sotaque os traços típicos do povo do Rio de Janeiro, Marcelo nasceu em território gaúcho, o que ele atribui a "uma questão de honra". Afora a brincadeira, a escolha pelo lugar foi influenciada pelo avô Paulo Aveline e pela mãe, Ângela, natural do Rio Grande do Sul, que desejava ter o primeiro filho em solo gaúcho. Ainda recém-nascido, retornou à capital carioca, onde, na infância, já demonstrava a vocação para a gestão, a paixão pelo esporte, e deixava claro o time do coração, o Grêmio.

O gosto pelo basquete é uma herança do pai, Paulo César (já falecido), engenheiro no setor público e jogador profissional, cuja carreira nos esportes acabou por inspirá-lo nas quadras. Uma das recordações remete ao tempo em que, entre o treino de basquete e de vôlei, sentava no campo e assistia ao time do Flamengo, de Zico, batendo bola. A prática do basquete se tornou menos constante com a mudança da família - que se completa com a irmã, Paola - para a cidade de Criciúma, em Santa Catarina, quando o pai, prestes a se aposentar, decidiu empreender. Mas a atração pelo esporte permanece viva: atualmente, joga duas vezes por semana, no time do Anchieta, como um hobby.

Enquanto o pai jogava para Vasco, Fluminense e Flamengo, possivelmente buscando uma forma de proteção, ele optou por torcer para o Grêmio, seguindo a escolha do lado materno da família. "Prefiro assistir a Grêmio e Lajeadense do que a final da Copa do Mundo. Hoje tem Real Madrid e Barcelona? Não me importa. Mas se a equipe juvenil do Grêmio jogou, sei quem fez todos os gols. Sou intenso nas coisas que faço, odeio coisa morna. Vou, choro, não brigo com os amigos... Futebol é para divertir."

Além da relação com os esportes, o ato de mudar é parte marcante da juventude, junto das consequências que traz. "Saudade é um sentimento com o qual eu convivo. Não são necessariamente ciclos que se encerram, mas que precisaram ser abandonados, porque não estão disponíveis no próximo lugar. O maratonista diz que convive com a dor. É esse sentimento. Não lembro a última vez que não tive saudade de coisas, pessoas, momentos?"

Nas horas vagas

Em Porto Alegre, um namoro de adolescência, iniciado no começo da década de 1990, deu origem a uma nova família, formada pela esposa, a odontologista Larissa Pawelski Leite, e pelos filhos Luiza, 18 anos, que segue os passos da mãe como acadêmica de Odonto, Isabela, 15, e Guilherme, 13, ambos estudantes do Anchieta. Anima-se ao listar as particularidades de cada um. Enquanto Luiza é tranquila, determinada, comprometida e disciplinada, Isabela é falante, alegre, faz amizade com todos, e Guilherme, perspicaz, irônico e brincalhão. "Uma coisa divertida na vida é acompanhar as diferentes fases deles. Fomos pais jovens e eles são muito companheiros e parceiros. A gente gosta que a casa seja QG das confusões deles", admite.

No tempo livre, corrida, cinema, televisão e Netflix são elementos que compõem os momentos de lazer. Assiste com assiduidade às partidas esportivas ao vivo e às atrações jornalísticas, mas também não abre mão dos programas de entretenimento, The Voice e Masterchef, que acompanha junto da família. A leitura também é uma atividade que aprecia e até confessa que adoraria ter sido escritor - durante a juventude, tinha na escrita de poesias e contos uma forma de se expressar. Hoje, gosta de livros técnicos, jornais, romances e revistas, e entre as obras que marcaram estão as biografias de Van Gogh, por Steve Naifeh e Gregory Smith; Renato Russo, por Carlos Marcelo; e The Beatles, por Bob Spitz.

É na música, aliás, que guarda o que assume como uma de suas maiores frustrações: não ter desenvolvido a habilidade de tocar um instrumento. De Renato Russo, é fã a ponto de defini-lo como uma espécie de irmão mais velho. Beatles, REM e U2 são outras referências musicais do executivo, que tem o estilo eclético. Já na cozinha, não se pode dizer o mesmo. O cardápio tem, sim, suas restrições, e os pratos preferidos incluem carnes, massas e arroz, como risotos, paella e arroz tailandês. "Não sou exatamente o cara mais habilidoso do mundo. Uso aquela estratégia de matar todos de fome. Seja lá o que vier, todo mundo adora."

Viajar também figura na lista de atividades que mais gosta, mas não ouse entregar a ele um roteiro pronto. Leite é daqueles que acredita que parte do prazer da viagem começa no planejamento. E o próximo destino já está definido e passa por Londres, na Inglaterra, e Edimburgo, na Escócia.

Propósito e leveza

Avesso a planos que exigem longos prazos, Leite entende que existem momentos em que não há como estruturar o futuro, já que não se conhecem os caminhos pelos quais a vida profissional indicar. Quando esteve na Dell, por exemplo, muitos colegas alimentavam a ambição de ter uma carreira internacional. O mesmo, entretanto, não se aplicava a ele. Ainda assim, revela a intenção de um dia retomar a experiência de lecionar, atividade que exerceu por sete anos, na ESPM. "Poucas coisas me deram mais prazer que isso. Ainda tenho uma trajetória longa de carreira e esse é um plano de aposentadoria. Quando puder me dedicar a isso com qualidade, tenho muita vontade de fazer."

Como consumidor ávido de notícia, esportes e entretenimento, se diz contente por trabalhar em uma empresa com propósito no qual acredita. "Quero um mundo melhor para os meus filhos e acho que isso passa por um jornalismo bem feito. Venho para cá todos os dias ajudar a construir isso", afirma, ressaltando ainda a troca com um mercado tão instigante e rico intelectualmente, "formado por gente inteligente e criativa". Em casa, os últimos planos são acompanhar o crescimento dos filhos e curtir os momentos.

Aos 44 anos, ele crê que ainda tem muito a realizar, a aprender e a conhecer o mundo. Leveza é uma das características que identifica em si e, nesse ponto, admite que sempre foi o "palhaço da turma". "Gosto de gente estar junto de gente, de me sentir à vontade - sou um pouco introspectivo em alguns momentos. Pode ser em um churrasco, uma festa, mas gosto que tenha gente feliz. Isso me mobiliza. Acho que sou alguém que veio ao mundo pra me divertir, pra fazer coisas legais. Não gosto de sofrer, de remoer as coisas, de olhar pra trás", sintetiza.

*Com colaboração de Karen Vidaleti

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