Correio do Povo: Um jovem senhor
Centenário, o jornal não cansa de acompanhar as transformações e inovar para manter leitores (quase fãs)
Ao entrar no histórico prédio do Correio do Povo, localizado na Rua Caldas Júnior, há um misto de história e modernidade. Isso porque estão preservadas diversas características de um patrimônio, mas elas dividem espaço com móveis mais novos, catraca de acesso, entre outras tecnologias. Após passar a recepção, o elevador integra o primeiro grupo (dos itens históricos) e é ele quem leva a maior parte dos colaboradores até o segundo piso, para chegarem na redação - e ainda que a localização dela seja a mesma há muitos anos, a reforma recente dá um ar todo diferente para quem é apresentado ao espaço.
Os móveis mais modernos, a disposição de lugares, o fluxo de informações, o tráfego das notícias, cinco televisões ligadas em canais diferentes, e mais um sexto aparelho conectado à audiência do site do veículo em tempo real. Tudo isso ao mesmo tempo deixa o ânimo da equipe envolvente. A sala do diretor de Redação, Telmo Flor - que tem função de gestão há 26 anos -, fica anexa ao ambiente, e chama a atenção a sua porta aberta permanentemente, com um entra e sai de jornalistas que soa absolutamente natural.
São cerca de 100 colaboradores divididos nas áreas de Cidade, Diagramação, Economia, Ensino, Esportes, Finalização, Fotografia, Geral, Internacional, Multimídia, Online, Política, Rural e Variedade. E todos esses agentes estão focados no mesmo objetivo: entregar um jornal que fecha sua edição por volta das 22h, embora sempre tenha plantão na redação. Dentro desta grande turma, há quem diga que um dos diferenciais do Correio do Povo é ter uma equipe muito alegre e descontraída. E Telmo diz mais: "O fazer Jornalismo é algo bem complexo - produzir matéria, foto, pensar em título, nos recursos, ter deadline -, mas o jornal é feito por pessoas, com muitas habilidades. E isso tem muito mais lados bons".
Para começar o dia
Dependendo do horário, todos os detalhes do fazer jornalismo impresso e diário podem variar. A turma da manhã, por exemplo, é menor e muito mais silenciosa, concentrada e tranquila. E isso pode ser facilmente explicado pelo fato de terem um compromisso um pouco mais distante com o fechamento do jornal - mas não é como se os jornalistas desse turno tivessem menos trabalho, pois é visível que a pauta está sempre cheia (e sempre cheia de surpresas, claro!), apenas parece que a demanda é mais densa até a troca de equipe.
Na opinião da chefe de reportagem, Mauren Xavier, que está na casa há 12 anos e já trabalhou em todos os turnos, os horários têm suas vantagens e características. "A equipe da manhã não sente tanto a pressão do fechamento, enquanto o pessoal da tarde tem um ritmo mais frenético, pois estão sempre de olho no deadline." Quando chega, ela logo confere o que está previsto do dia anterior para que se façam as alterações necessárias, afinal, durante a madrugada, "sempre tem um temporal capaz de mudar tudo no dia seguinte".
Na largada do dia, também é de responsabilidade da jornalista verificar com o pessoal do site o que estão produzindo para saber as pautas que devem ser aproveitadas no impresso ou mesmo para não terem retrabalho no assunto. Ainda que as editorias sejam, de maneira geral, autogerenciáveis, o contato com os editores é frequente e é Mauren quem organiza a logística de delegar a equipe para suas respectivas pautas. "Pra mim, quanto mais vazia está a redação, melhor, pois significa que o pessoal está na rua, produzindo informação", observa.
Um ritmo mais frenético
O turno da tarde é comandado pela chefe de redação, Luciamen Winck, que está há 25 anos no veículo e, segundo as palavras de Telmo, "ao lado da Mauren, trabalha como um relógio na equipe". Não bastasse ter essa visão macro de tudo, ela confessa: "Não respiro sem pensar em notícia. Meu Whatsapp não para, são muitos e muitos grupos de informações. Tropeço em uma pedra e acho que dali pode sair uma pauta".
O pessoal da tarde, que chega aos poucos, ou seja, em horários diferentes, lota as estações de trabalho mais intensamente. São mais falantes, descontraídos e inquietos em suas cadeiras. Não raro, levantam-se para trocar ideias com os colegas de outras editorias, com os chefes ou com a turma da sala ao lado: fotografia, diagramação e finalização. Quanto mais se aproxima o horário de fechamento, maior é a movimentação na sala. Outro local bastante frequentado é a entrada do prédio - especialmente pelos fumantes -, e tem também o bar, que é onde se reúne a maioria dos colegas, e é de lá que surgem as melhores histórias.
Na visão de Luciamen, a equipe de Geral é como um time de futebol, já que, se outra editoria precisa de reforço, é dali que sai o suporte. "É o meu banco de reservas para quem precisar. Digo que é onde pulsa a redação", avalia. E por falar em futebol, a editoria de Esportes é considerada 'a turma do fundão', não apenas pela localização, mas por serem os mais despojados. É uma turma que, no momento, é composta somente de homens, de onde saem risadas, comentários e muita troca de opinião sobre esse ou aquele time - a TV mais próxima desta ilha, claro, fica ligada o tempo todo em canais de futebol.
O momento crucial para que o Correio do Povo chegue à casa dos leitores não acontece antes que seja feita uma reunião de pauta diária com todos os editores e o diretor de Redação, sempre às 17h. E é exatamente essa ocasião que a equipe de Coletiva.net acompanha, observando os cerca de 10 jornalistas, que, organizados em um círculo, compartilham suas manchetes do dia, trocam informações e andamentos de assuntos e, claro, se divertem entre uma brincadeira e outra - Telmo, por exemplo, havia acabado de retornar de férias, com muitas histórias a compartilhar. "É o momento de conversarmos, planejarmos os próximos passos, recolhermos ideias, nos atualizarmos de novidades pessoais. E até tratamos de matéria", brinca ele.
Uma equipe exclusiva
Embora se trate de um impresso com 123 anos e de jornalistas que integram a redação há 12 até 46 anos - como é o caso de muitos, os números não fazem o veículo ser conservador ou parar no tempo. Afinal, a busca por acompanhar as novidades na Comunicação, a forma e os meios pelos quais se consome notícia têm sido uma injeção de ânimo para os colaboradores. Investir no digital não significa apenas intensificar as publicações no site - que, aliás, tem equipe própria e com processos e demandas específicos -, é todo um comportamento que deve ser remodelado.
O responsável pelo portal é Márcio Gomes, que está na empresa há nove anos. Com uma rotina bem dinâmica, ele esclarece que a pauta do dia é preparada pela equipe da noite, mas é toda adaptada conforme os acontecimentos vão se desenrolando - qualquer semelhança com a sistemática do jornal não é mera coincidência, uma vez que eles trabalham em sintonia o tempo todo. Esta é uma área que não conta com editorias, pois todos escrevem sobre tudo, ainda que tenham pessoas mais afinadas com certos temas. "Somos mais generalistas mesmo", resume Márcio. São cerca de 15 pessoas dedicadas ao site, e elas preenchem diversos horários entre as 7h e as 2h da manhã do dia seguinte.
Espírito jovem
Um dos personagens desse novo momento mais digital do jornal é Jonathas Costa, que entrou como estagiário auxiliando na web, foi diagramador e, hoje, é quem lidera a editoria de Multimídia. Os envolvidos com esse setor na redação pensam em pautas possíveis de serem exploradas em diversos formatos. É o caso dos atuais vídeos, que podem ser produzidos de maneira mais elaborada ou em um estúdio, ainda provisório, que fica anexo à redação e, por uma janela de vidro, é possível acompanhar as transmissões.
Jonathas explica que as produções online e de vídeo já eram inerentes ao jornal, mas ainda não havia um fluxo organizado ou uma equipe exclusiva e um padrão de trabalho. Hoje, são diversos programetes, de assuntos e periodicidades diversos. E tem também o diário Direto da Redação, com um resumo das principais notícias do dia, com uma linguagem mais de web, com interação. "Começamos a desenhar tudo isso ainda neste ano, mas antecipamos a estreia com a greve dos caminhoneiros - e deu muito certo", afirma, visivelmente empolgado.
Na visão do jornalista, o prazer dos bastidores não está apenas no conteúdo de qualidade que se gera ali, mas todo um trabalho de ensinar os colaboradores, explicar que todos podem criar iniciativas diferenciadas neste ambiente. "É interessante este movimento de 'evangelizar' os colegas. Até já conseguimos gravar com todo mundo aqui, mesmo com pessoas que não gostam dessa área", comemora. Ele garante que a novidade é algo que está dando certo e sendo muito bem aceita. "E a gente vai fazendo, testando, pois não há nada que não arrisquemos. Internamente, gerou um clima de engajamento que dá outro ritmo ao Correio do Povo."