Reputação e inovação: aliados para o crescimento de marcas

População acredita mais nas empresas do que em suas invenções

A reputação como um elemento de extrema importância para as marcas é uma ideia consolidada e cada vez mais reforçada no mercado, mas o quanto ela pode influenciar a inovação? Uma pesquisa da Edelman Trust Barometer, agência global de Comunicação, revelou, na 24ª edição, que as pessoas estão mais dispostas a confiar nas empresas do que em suas inovações. Por exemplo, 79% dos brasileiros confiam em organizações do setor de tecnologia, mas apenas 53% acreditam na Inteligência Artificial (AI). Na área da saúde, 70% creem nas empresas e 56% apostam na medicina genética. Já no segmento de alimentos, a distância é ainda maior: 75% confiam nas companhias e só 31% em alimentos geneticamente modificados. Essa diferença traduz a proximidade dos brasileiros com as marcas e a insegurança com os impactos das inovações. 

Para a especialista em gestão de reputação e CEO da ANK Reputation, Anik Suzuki, o resultado do estudo é coerente. "Isso acontece porque as inovações são experimentações que ainda não se confirmaram no mercado. É natural que haja uma desconfiança maior porque os temas apresentados ainda não são totalmente conhecidos. As empresas já estabelecidas gerarão mais confiança do que suas promessas de inovação", explica. 

Somado a isso, o valor agregado de uma companhia já consolidada pode mudar a percepção e, algumas vezes, até mesmo validar alguma novidade. O gestor executivo do Tecnosinos, Silvio Bitencourt da Silva, acredita que o resultado corresponde à percepção de segurança e estabilidade, enquanto as inovações, especialmente as tecnológicas, geram incertezas. Ele transmite aos seus alunos a teoria do cientista queniano Calestous Juma que diz que as resistências às inovações estão enraizadas no medo de que os benefícios sejam restritos a poucos, enquanto os riscos sejam amplamente distribuídos. "Essa desconfiança pode ser reforçada pela falta de compreensão ou transparência sobre como elas são desenvolvidas e implementadas, além da influência de fatores culturais e históricos", complementa. 

Empresas à frente do cenário da inovação

O estudo, que levou em consideração as respostas de 32 mil pessoas, de 28 países, indicou também que os brasileiros acreditam mais nas empresas (63%) para integrar as inovações na sociedade. A missão seria seguida pelas organizações não-governamentais (ONGs) (52%) e pela mídia (50%), até chegar por último no governo (46%), por maior dificuldade de acreditar na capacidade dos órgãos públicos de regulá-las de forma efetiva. Silva esclarece que isso se deve ao rigor das operações da iniciativa privada. Afinal, para lançar um novo produto ou serviço, as organizações passam por várias etapas e só colocam na rua o que já está testado. "São processos rigorosos e estruturados para desenvolver inovações, frequentemente alinhados com normas internacionais", pontua. 


Confira abaixo quais são as etapas do processo de inovação dentro de uma empresa:

Pesquisa e Desenvolvimento (P&D): início com análises de viabilidade e geração de ideias, alinhadas aos princípios de inovação sistematizada.

Prototipagem e Testes: criação de protótipos, testes controlados e análise dos resultados para reduzir incertezas.

Engajamento de stakeholders: envolvimento de clientes e parceiros para validação das soluções, conforme recomendam as práticas de gestão colaborativa.

Iteração e Melhoria Contínua: ajustes e refinamentos com base em feedbacks.

Lançamento Controlado: introdução gradual da inovação, avaliando impactos e correções antes da comercialização em larga escala.


Anik considera que seja um padrão mundial os governos estarem pior avaliados no quesito confiança devido aos casos de corrupção. Porém reforça que a preocupação com o resultado é expressivamente maior na iniciativa privada. "Qualquer empresa, independente do tamanho e do tempo de existência, tem muito a perder. Um deslize, uma crise, um problema de reputação pode ser o fim do negócio, o que não acontece com governos, partidos ou políticos", ressalta. 

A Tramontina, marca gaúcha com 113 anos de história, ampliou sua atuação no mercado. No início, executava reparos para indústrias de Carlos Barbosa e fazia ferragem para cavalos, hoje conta com mais de 22 mil itens no seu portfólio e fideliza clientes. A diretora de Marketing Corporativo da empresa Rosane Fantinelli, explica que a companhia investe constantemente em equipamentos e produtos inovadores. Um exemplo disso, são os Centros de Inovação, Pesquisa e Desenvolvimento (CIPeD) presentes em todas as fábricas, com suas estruturas dedicadas a inovar na elaboração de tecnologias que garantam o padrão de qualidade. Também são feitos treinamentos e formações das equipes, para que contribuam com esse aspecto. "Neste ano, fomos reconhecidos como Líder na categoria Marca Gaúcha Inovadora, do Prêmio Marcas de Quem Decide, do Jornal do Comércio, o que indica que os investimentos na área, sejam em nossos produtos ou em nossos processos, estão gerando frutos", exemplifica Rosane. 

Apesar da fama dos gaúchos de serem mais conservadores e resistentes a novidades, os especialistas acreditam que esse rótulo está ficando no passado e que a tendência é que seja mudado em breve. O Atlas da Inovação, feito pela Rede de Observatórios do Sistema Indústria e o Observatório Nacional da Indústria em 2024, indicou que o Rio Grande do Sul está em segundo lugar entre os estados com maior número de iniciativas na área de ciência e inovação, atrás apenas de São Paulo. O estado do sul conta com 10% dos ativos do país -  elementos tangíveis e intangíveis que contribuem para o avanço do conhecimento científico e tecnológico, incluindo startups, laboratórios, incubadoras, patentes e centros de pesquisa -, além de 1.202 empresas (13%) com potencial inovador. 

"O Brasil - e particularmente o Rio Grande do Sul - tem demonstrado avanços significativos. A presença de ecossistemas robustos como o Tecnosinos comprova que há um ambiente propício à inovação. Eventos como hackathons e conferências e, particularmente, o South Summit, além de diversas iniciativas do Governo em nível estadual e municipal reforçam essa tendência, mostrando um compromisso com a promoção do desenvolvimento por meio da inovação", defende o gestor do parque tecnológico. No entanto, segundo ele, ainda é comum ouvir no mercado sobre desafios culturais e estruturais que devem ser superados para transformar a resistência em receptividade, como a necessidade de maior investimento em educação e a criação de políticas públicas que conectem tradição e inovação em diferentes perspectivas, além da tecnológica, como por exemplo a social. 

Uma pesquisa feita pelo Grupo RBS em 2024, intitulada 'Persona', indica que esse retrato conservador não representa mais o gaúcho de forma geral. A tradição, em maior ou menor grau, está presente, mas os entrevistados demonstraram abertura a novas ideias: 26% mostrou ter o perfil explorador e 53% conciliador, sendo apenas 21% pouco abertos às novidades. Anik acredita que depois da tragédia deste ano o Rio Grande do Sul deveria trabalhar mais essa imagem para não impedir a chegada de novos investimentos. "Gaúchos gostam de valorizar o que é produzido aqui, temos uma identidade e um orgulho fortes. Acabamos permitindo que, por muito tempo, jovens talentos e investimentos fossem embora. Quando se passa por uma grande crise se reavalia muita coisa e tenho visto uma vontade muito grande para reverter isso e incentivar mais a inovação. Acredito que teremos uma velocidade diferente a partir de 2025 nesses aspectos", prospecta. 

Desafios tradição X inovação

Equilibrar a tradição com a inovação é um desafio. Não há uma receita concreta para atingir o sucesso, mas essa balança está sendo trabalhada por organizações de diferentes setores. Porém, inovar não está relacionado apenas a criar algo inédito, pode ser também melhorar algo que já existe, seja um produto, um serviço ou até mesmo um processo. 

Segundo a diretora de Marketing Corporativo da Tramontina, o objetivo da empresa é assegurar uma constante melhoria e atender à dinâmica de um mercado sempre em transformação. Para ela, é a busca pela renovação permanente que faz com que a empresa mantenha a preferência e amplie sua credibilidade. "O desafio é preservar a contemporaneidade da marca, buscando aproximar-se cada vez mais dos jovens brasileiros, que trazem a herança da experiência com nossos produtos de suas famílias. É com eles que a Tramontina busca intensificar a conversa, sem deixar de lado aqueles que acompanharam muitos anos dessa trajetória, que é nosso público mais cativo", explica. 

Silva acredita que o principal desafio para aliar o novo com o antigo é, primeiramente, a resistência interna à mudança a partir de uma cultura organizacional que priorize a estabilidade. Além disso, há o medo de que produtos inovadores acabem por competir com soluções já existentes, o que pode afetar as receitas e estratégias de mercado. "Equilibrar a estabilidade e a experimentação é um obstáculo constante, pois é preciso manter os valores da marca enquanto se investe em inovações ousadas, ao mesmo tempo que é mais difícil, em alguns casos, acompanhar o ritmo do mercado, principalmente quando comparamos com startups, que contam com uma velocidade maior de implementação", constata o gestor. Somado a isso, ele destaca a importância de gerir bem a comunicação com todos os stakeholders, sejam eles clientes, acionistas, gestores e colaboradores, que podem ter expectativas conflitantes. 

Consolidação de marca: como atingir e manter uma reputação positiva?

Cada vez mais reputação está sendo gerenciada como artigo estratégico, compreendido em todos os níveis da organização. Afinal, com o avanço das mídias digitais, há uma exigência maior do público por transparência e qualquer ação pode interferir no resultado dos negócios, diretamente nas vendas, na recompra ou na indicação do cliente. Anik reforça ainda que esse elemento é extremamente importante para inovações de maior impacto. "Essas requerem investimentos externos e a verba pode ser concedida a quem tem uma imagem melhor no mercado. Toda a inovação começa como uma promessa e, nesse processo, é preciso que acreditem nela", explica. 

A especialista defende que a reputação é muito profunda e multifatorial, necessitando do empenho de diferentes áreas da empresa. "Não existe reputação sem comunicação, mas comunicação sozinha não garante reputação", define ela, que acredita que os gestores já estão mais cientes da relevância das temáticas, porém que ainda é preciso evoluir em processos, métricas e estratégias profissionalizadas e consistentes para gerenciar esses ativos. Afinal, até mesmo a forma como os colaboradores são tratados pode interferir no assunto. 

Esta relação, segundo Rosane, é um dos cuidados da marca originária da Serra Gaúcha. "Entusiasmo, otimismo, competência e paixão pelo negócio são a essência e é a relação com as pessoas - funcionários, comunidade, consumidores, clientes e parceiros - que mantém viva a vocação centenária da Tramontina. Essas conexões fazem com que consigamos, cada vez mais, atender às necessidades da população, com soluções que facilitem o dia a dia e proporcionem o bem-estar das pessoas, marcando a presença em todas as etapas da vida", conta a diretora. 

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