O soco no estômago que derrubou até o jornalismo

Por Fernando Puhlmann, para Coletiva.net

Fernando Puhlmann - Crédito: Arquivo pessoal

Na semana passada, Manu Gavassi lançou um vídeo e mexeu com o estômago de muita gente. Em um curta, que ela chamou de "Programa de Proteção à Carreira Artística", Manu desfia as entranhas das salas de reunião, onde se discutem as estratégias dos novos fenômenos midiáticos do próximo semestre. E que entranhas.

Até aí tudo bem, ninguém que tenha o mínimo contato com essa indústria pensava algo diferente, mas o que mais me chamou a atenção foi a repercussão no meio dos "artistas" e o quanto o jornalismo não conseguiu perceber do discurso. Quando o vídeo saiu e estourou, muitos jornalistas colocaram como criticados, a indústria e os artistas, porém o que se viu, foi a classe em peso apoiar o vídeo, dizer se enxergar, reconhecer nas falas, nos gestos e, principalmente, na contrariedade da "Manu do curta", momentos que eles mesmos passaram.

E, aí, chegamos a dois pontos.

Primeiro, era importante que um vídeo assim viesse de alguém com relevância no meio. Ok, você pode até não gostar do som ou das atuações da Manu Gavassi, mas ela é relevante, um dos ícones dessa nova geração "POPMPB" que acontece no país inteiro. E porque era importante? Por que ser relevante em um segmento te dá legitimidade para falar sobre ele, ainda mais quando é para criticar. Manu falou do que ela conhece, do que viveu, do que sofreu e do que surfou também. Ser relevante hoje em dia é construir base, não simplesmente construir fãs. Ninguém duvida da Manu Gavassi nesse caso.

Segundo ponto, os artistas também sentem que muitas vezes são fakes deles mesmos. E isso é muito ruim para a cultura do país como um todo e não falo da cultura erudita, discutida por intelectuais em salas fechadas, em cafés de livrarias ou em redações pelo país, falo da cultura da rua, do que te identifica como país, como nação. Humberto Gessinger falou no Corredor 5 (canal de Youtube): "O Brasil é o Caetano e não a moeda ou a bandeira". É isso! O Brasil é Caetano Veloso, Belchior, Pedro Ortaça, Humberto Gessinger, Chitãozinho e Xororó, Claudinho e Bochecha, Jamelão e os Bois da Amazônia. Pode parecer saudosismo, talvez seja mesmo, dezembro sempre mexe conosco de alguma forma, mas é apenas o reconhecimento da importância de ser autêntico e criar identificação.

O discurso do vídeo da Manu me parece muito mais um pedido de socorro do que uma crítica aos artistas. Talvez o jornalismo demore um pouco a entender esse pedido, não estranho, os jornalistas, na sua maioria, não entenderam até hoje porque perderam seus espaços para influenciadores, mas se eles olharem para esse vídeo sobre outro foco, talvez percebam o quanto é importante incentivar e reconhecer, como predicados da carreira artística, a autenticidade e a identidade, senão a indústria continuará amassando as ideias, não só dos músicos e atores, mas de quem vive de criticá-los e classificá-los. 

Parafraseando um cara que nunca se dobrou à indústria: "O tempo não tem dó de quem disfarça a farsa das ribaltas". Obrigado Manu Gavassi, Humberto Gessinger e Nei Lisboa, a autenticidade ainda continua sendo o melhor ingrediente.

Ah, e se você não viu o vídeo, corra para ver, vale a pena.

Fernando Puhlmann é diretor de Inovação e sócio da Cuentos Y Circo ([email protected])

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