Porque há tantas regras: do mundo real ao mundo virtual!

As leis sugiram para proteger e organizar a sociedade e o Estado deve visar o bem comum. No Estado Democrático de Direito as leis …

As leis sugiram para proteger e organizar a sociedade e o Estado deve visar o bem comum. No Estado Democrático de Direito as leis existem para garantir que a democracia e os direitos de todos sejam respeitados e, ao obedecer às leis, contribuímos para um mundo mais justo para todos.
E como pode ocorrer proteção e organização se a maior parte das leis é de desconhecimento público?
A principal constatação como pesquisadora na coordenação do IPO - Instituto Pesquisas de Opinião é de que a ampliação do ordenamento jurídico brasileiro tem aumentado o desconhecimento da população em relação às leis, sua capacidade de aplicação e importância social. E são inúmeras as "leis que não pegam" no "mundo real" por falta de conhecimento, aplicação, fiscalização e punição. Cada "lei que não pega" aumenta a premissa do senso comum "de que não dá nada" e é um "alimento" paulatino para a cristalização do sentimento de impunidade, que começa na percepção de pequenos delitos e crimes do cotidiano até os grandes temas de corrupção da política brasileira!
Analisar este cenário de desconhecimento e de sensação de ineficiência da aplicação das leis migrando da perspectiva "do mundo real" para o "mundo virtual" confirma que o desconhecimento é ainda mais acirrado no mundo virtual.
As regras começam a ser "dribladas", em muitos casos inconscientemente, quando pais permitem que filhos menores de 13 anos tenham um perfil no Facebook. Para descumprir o regulamento norte americano que o Facebook utiliza para regular a idade mínima, os pais são obrigados a adulterar a idade de seus filhos, cometendo uma segunda infração. Este pequeno exemplo, que ocorre na "porta de entrada" do mundo virtual, é um prenúncio que indica a impercepção de que as regras e as leis do mundo real valem para o mundo virtual!
Atualmente, 60% dos gaúchos estão conectados às redes sociais, e entre adolescentes e pré-adolescentes este patamar alcança 80% dos casos. O mundo virtual "é a praia" deste segmento, sendo que estes são considerados "nativos digitais".
No mundo virtual, estes jovens "se sentem empoderados", seus perfis traduzem ou "tentam traduzir" o estilo de vida que possuem ou "gostariam de possuir" e uma "tempestade de emoções". Usam o espaço virtual para externar tudo que pensam ou sentem, desconhecendo que as leis do mundo real (como crimes de ofensa verbal ou moral, crimes raciais, discriminação e preconceito, etc) se aplicam ao mundo virtual. Sem contar as leis que tipificam os chamados delitos ou crimes informáticos, como a Lei Carolina Dieckman.
Estes jovens "empoderados" no mundo virtual, se sentem protegidos pela sensação de que não serão identificados e não se preocupam com o princípio supremo que diz que o direito de um termina quando começa o de outro. Este sentimento de "empoderamento" possui sua raiz no escasso conhecimento que seus pais detêm do funcionamento, do alcance e dos limites da internet. Literalmente, estes pais não têm noção do que os filhos fazem e dos riscos que correm!
Muitos pais acreditam que propiciar o acesso à internet aos filhos é como "presentar o filho com um "jogo de videogame", "uma forma do filho estar dentro de casa", "sob os olhos da família". Esta leitura fornece às famílias uma falsa sensação de segurança e permite a estes "nativos digitais" um certo "passe livre" para navegar na web, cometerem delitos ou ficarem vulneráveis aos mais variados tipos de situação, incluindo o cyberbullying, sexting, até acessar links que permitem o sequestro de dados ou outros crimes praticados por anônimos da deep web.
Este cenário indica a necessidade de um debate sobre as regras morais, éticas e legais que devem ser respeitadas no mundo real e no mundo virtual. E este debate precisa perpassar todas as instituições sociais, em especial, a instituição familiar e educacional. Além disso, as famílias devem orientar e acompanhar seus filhos, "se uma criança de 12 anos não deve andar desacompanhada nas ruas do mundo real, também não deve andar desacompanha ou sem orientação nas várias "ruelas" do mundo virtual".

Autor
Elis Radmann é cientista social e política. Fundou o IPO - Instituto Pesquisas de Opinião em 1996 e tem a ciência como vocação e formação. Socióloga (MTB 721), obteve o Bacharel em Ciências Sociais na Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e tem especialização em Ciência Política pela mesma instituição. Mestre em Ciência Política pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), Elis é conselheira da Associação Brasileira de Pesquisadores de Mercado, Opinião e Mídia (ASBPM) e Conselheira de Desburocratização e Empreendedorismo no Governo do Rio Grande do Sul. Coordenou a execução da pesquisa EPICOVID-19 no Estado. Tem coluna publicada semanalmente em vários portais de notícias e jornais do RS. E-mail para contato: [email protected]

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