IN FORMA

Por Marino Boeira

Não podemos esquecer o golpe de 64

O presidente Lula pediu aos seus ministros que não programem nenhum ato para lembrar o golpe de 64: "Chega de remoer o passado", disse ele, esquecendo que lembrar aquele evento é a melhor forma de evitar que ele se repita.

Segundo a Comissão Nacional da Verdade, entre mortos e desaparecidos durante o regime militar, foram documentados 434 casos. A maioria desses filhos, filhas, irmãos e irmãs de nós brasileiros eram filiados a agremiações políticas de esquerda e certamente muitos pertencentes ao PT, o partido do Presidente.

Não surpreende esse desapreço de Lula pela História. No ano passado, falando à Rádio Gaúcha, aqui em Porto Alegre, ele se referiu ao 31 de março, como a "Revolução de 64". Era como se fosse o Bolsonaro falando.

Vamos convir que quando fala de improviso, Lula se atrapalha e diz coisas das quais vai se arrepender depois. As gafes do Presidente dariam páginas de lembranças. Algumas ficaram famosas como atribuir a Napoleão uma lembrança da China, um lugar onde o imperador francês nunca esteve ou outras que contrariam o que diz serem políticas do seu governo.

O governo tem se manifestado sempre contra o racismo, mas o comentário de Lula sobre a limpeza da capital da Namíbia, na África, vai no sentido oposto: "Quem chega a Windhoek não parece que está na África. Poucas cidades no mundo são tão limpas, tão bonitas e têm um povo tão extraordinário como tem esta cidade".

Lula tem hoje um Ministro de Direitos Humanos, Silvio Almeida e uma Ministra das Mulheres, Cida Gonçalves, mas mesmo assim é capaz de fazer declarações como essas: "A polícia só bate em quem tem que bater (10/2010) e "Uma mulher não pode ser submissa ao homem por causa de um prato de comida. Tem que ser submissa porque gosta dele" (janeiro de 2010).

São escorregões verbais que podem acontecer com qualquer um, dirão seus seguidores, sempre prontos a "passar o pano", como se diz agora, sobre os erros cometidos.

Caso seja essa a questão, Lula tem até o fim do mês tempo suficiente para se redimir. Em vez de pedir silêncio para seus ministros, comande ele mesmo uma solenidade pública para lembrar o 31 de março de 1964 como fez em 8 de janeiro e aproveite para reativar a Comissão Nacional da Verdade que tem muito ainda a investigar sobre os crimes cometidos durante os 21 anos de ditadura militar.

Quando Lula, recentemente, se referiu ao genocídio praticado pelo estado sionista de Israel contra o povo palestino, foi apoiado pela maioria do povo brasileiro, porque tinha razão.

Ao tentar esquecer o golpe de 64, Lula erra e certamente não é apoiado pela maioria dos brasileiros. Pelo menos não é apoiado por aqueles brasileiros que têm consciência do que aconteceu no passado.

Autor
Formado em História pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), foi jornalista nos veículos Última Hora, Revista Manchete, Jornal do Comércio e TV Piratini. Como publicitário, atuou nas agências Standard, Marca, Módulo, MPM e Símbolo. Acumula ainda experiência como professor universitário na área de Comunicação na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS) e na Universidade do Vale do Rio do Sinos (Unisinos). É autor dos livros 'Raul', 'Crime na Madrugada', 'De Quatro', 'Tudo que Você NÃO Deve Fazer para Ganhar Dinheiro na Propaganda', 'Tudo Começou em 1964', 'Brizola e Eu' e 'Aconteceu em...', que traz crônicas de viagens, publicadas originalmente em Coletiva.net. E-mail para contato: [email protected]

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