Carlos Alberto de Souza: Teia de relações

Ele já passou por cinco redações e duas assessorias de imprensa e acredita que herdou do avô paterno o germe do jornalismo

No grupo de amigos com o qual convivia, as conversas giravam sempre em torno de assuntos como literatura, música, teatro e jornalismo. É aí que Carlos Alberto Machado de Souza identifica o crescimento das raízes da comunicação em sua formação. A origem destas raízes ele poderia depositar na herança do avô paterno, Astério Canuto de Souza, também jornalista, que dirigiu o Jornal da Serra, de Carazinho, nas décadas de 30 e 40. E também em seu primo, o jornalista Antonio Carlos Arbo, que contava histórias da profissão durante os almoços em família. Ele não sabe ao certo de onde veio "esta vontade de transmitir a notícia", mas afirma que não se imaginaria em outra profissão.


Carlos ainda tinha dúvidas no começo de sua trajetória universitária em 1976, quando ingressou no curso de Jornalismo. No ano seguinte mudou de faculdade e resolveu fazer Geologia. Ao identificar que aquela definitivamente não era a profissão que gostaria de seguir, o indeciso universitário voltou para o antigo curso de comunicação, onde ficou até 1982, quando se formou pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.


Construção de uma carreira


Carlos credita todo seu conhecimento à teia de relações que cultivou desde o início da carreira. Conheceu muitas pessoas, muitos nomes, e cada emprego que surgia vinha por indicação de um conhecido, ou amigo. Quando veio para Porto Alegre atrás de um curso superior, seu primeiro contato importante foi com o diretor da Famecos e dirigente da Associação Riograndense de Imprensa (ARI), Antônio González, o Antoninho, como lembra carinhosamente.


Na época, com dificuldades para arcar com os custos da faculdade, Antoninho lhe conseguiu uma bolsa de estudos através da extinta Caixa Econômica Estadual. Antes de ingressar na universidade, trabalhou no Unibanco e como pesquisador do Instituo Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A primeira prática no jornalismo foi como revisor da Zero Hora, há 30 anos, época em que seus cabelos e barba eram compridos, usava camisa branca e calça pantalona, bem ao estilo anos 70.  Para ele, sua grande escola foi ali. Entre madrugadas e fins de semana sem dormir, Carlos lembra de colegas que estavam ao seu lado na redação, como Iria Pedrazzi, Ivani Schutz, Nilson Cezar Mariano e Sérgio Endler.


Decidido a tentar uma carreira em Curitiba, encontrou na Praça da Alfândega seu ex-colega Nilson Cezar Mariano, que estava trabalhando como repórter na Folha da Tarde, e lhe alertou sobre uma vaga no jornal. Em 1982, Carlos saiu da Zero Hora para trabalhar na editoria Geral da FT, sendo chefiado por Nikão Duarte. "Lembro que na época, o secretário gráfico da Zero Hora, Norberto Silveira, comunista histórico e amigo inesquecível, tentou me convencer a ficar na RBS, que crescia enquanto a empresa Caldas Jr. ruía."


Em 1983, surgiu uma vaga de repórter na sucursal de Porto Alegre do Jornal do Brasil. Por Nikão Duarte, Carlos foi indicado para o cargo. A vaga era a realização de um sonho porque o JB era um "belo jornal com um grande projeto". Na redação seu chefe era José Mitchell, e seus colegas de reportagem Juarez Porto, Barbara Oliveira, Ângela Caporal e Guaraci Cunha. Ali viu seu trabalho ser reconhecido em todo país. "Era uma boa equipe e se tornou um belo aprendizado".


O trabalho estava indo muito bem quando, em 1986, surgiu um projeto de jornal moderno, ligado ao grupo Gazeta Mercantil. Era o Diário do Sul, destinado a ser "um jornal diferente de todos os outros". Convidado por Paulo Fogaça, mais uma vez o jornalista trocou de redação. Durante três meses, Carlos ajudou a desenvolver o projeto do jornal e, por mais três, trabalhou na editoria de Política. Saiu depois de seis meses, pois, o jornal "não vingou".


Em 1987, foi trabalhar na sucursal de Porto Alegre da Folha de S. Paulo, onde permaneceu por 15 anos. Durante o longo período, acompanhou as transformações que levaram a Folha à liderança nacional em circulação. Durante cinco anos trabalhou ao lado de Lorena Paim, depois disso, ficou outros cinco tocando sozinho a sucursal. No seu 10º ano de Folha começou a receber a companhia de colegas como Artur Pinto, Dione Kuhn, Léo Gerchmann, Sandra Hahn e Wálmaro Paz.


Carlos Alberto aprendeu muito em reuniões que participava em São Paulo e, também, na elaboração do Manual de Redação da Folha. As preocupações com a precisão e a credibilidade do jornal ajudaram muito a enriquecer sua carreira. "Estar disputando um espaço para matéria com correspondentes do Brasil inteiro, e até do mundo, funcionou para mim como um estímulo."


Anos 2000: novos rumos


Depois de tanto tempo na Folha de S. Paulo, o jornalista teve sua primeira experiência em assessoria de imprensa. Guaraci Cunha, ex-colega de Jornal do Brasil, convidou-o para trabalhar na Companhia de Processamento de Dados do Rio Grande do Sul (Procergs). Neste setor, seu maior aprendizado foi o contato com o software livre (programa de computador que pode ser usado, copiado, modificado e redistribuído sem nenhuma restrição), que considera um grande diferencial para o país.


Em 2003, Carlos voltou para as redações: foi trabalhar, convidado por Sérgio Lagranha, como editor do Caderno Empresas e Negócios do Jornal do Comércio. Após pouco mais de um ano, recebeu outro convidado, agora para trabalhar na assessoria de imprensa da Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul (Ajuris).


Em julho de 2008 começou a surgir a ideia de montar o próprio negócio - e crescia a vontade de trabalhar em casa, no bar ou onde estivesse com seu notebook. Carlos Alberto decidiu sair da Ajuris em novembro do ano passado, quando desenvolveu o site PoaBoa, que nasceu da proposta de ser um instrumento de prestação de serviço à comunidade, apontando problemas a serem corrigidos e destacando iniciativas públicas e privadas que aprimorem Porto Alegre.


Quase no mesmo período, o antigo chefe na Folha da Tarde, Nikão Duarte, e seu ex-colega de Jornal do Comércio, Sérgio Lagranha, começaram a conversar sobre a possibilidade de montar uma empresa de assessoria. Nasceu assim a Com Efeito - Comunicação Estratégica. "Nos unimos ao invés de partir cada um para uma carreira solo."


Uma vida tranquila


Futebol, circo e a primeira banda com instrumentos de lata da cidade são algumas das lembranças da infância do jornalista que nasceu em Cruz Alta , no dia 6 de fevereiro de 1955. Ainda hoje ele mesmo considera que leva uma vida leve, ao mesmo tempo em que diz gostar de estar bem informado sempre. No rádio, na televisão ou no notebook, diariamente, ele colhe as informações necessárias para saber o que acontece no mundo. Apesar de dificuldades no início da carreira, até mesmo financeiras, como ele mesmo diz, foi sempre muito tranquilo e certo do que queria. Nunca mirou algo difícil ou inalcançável, o que ele quer mesmo é continuar trabalhando dignamente e com saúde. "Ainda posso fazer muito mais, estou em plena atividade."


Casou-se pela primeira vez em 1982. Deste casamento, nasceu Marcel, 25 anos, administrador de empresas. Depois de oito anos, Carlos se casou pela segunda vez, casamento que trouxe a filha Mariana, de 11 anos. O pai acha que a caçula ainda é nova para pensar em carreira, mas já falou até em ser juíza, só que o jornalista acha mesmo que ela leva jeito para artes cênicas.


Atualmente, com 54 anos, Carlos é separado e namora há três anos a publicitária Graça Craidy. Com ela solta seus dotes culinários, mas só para ajudar, pois, garante, "a grande chef é Graça". Nos dias de folga gosta de caminhar. Nunca teve carro, tradição que herdou do pai Bráulio, hoje com 92 anos, ainda morador de Cruz Alta.


Seus programas favoritos são ficar em casa ou, eventualmente, ir ao cinema e ao teatro. Nas férias gosta de viajar. Nas últimas, tiradas há poucos dias, conheceu São Luiz do Maranhão, de onde trouxe o livro "Os tambores de São Luiz", que retrata a escravidão no estado.


A música certa para ele é aquela que escutava em pequenos rádios na infância. A Bossa Nova, a MPB e a Jovem Guarda lhe trazem boas lembranças, e na estante o que chama atenção é o CD do especial Roberto Carlos e Caetano Veloso cantando Tom Jobim, show que o jornalista lamenta muito por não ter visto.


Na sala da casa, um painel com muitas fotos guarda as lembranças de toda uma vida. Fotos dos avós, dos filhos, dos pais e da namorada fazem com que o jornalista recorde com carinho dos atuais e antigos tempos. Em um álbum, ainda guarda as lembranças do avô Astério.


Carlos vê a vida como uma caminhada e considera felizes as pessoas que têm uma longa estrada pela frente. Diz sentir que, atualmente, a ansiedade por bens materiais e o consumismo exagerado não fazem bem às pessoas. O que ele estima para sua vida é que ela seja contínua e sem sobressaltos. "Há momentos em que tu estás em um nível legal de bem-estar, em outros tu podes dar uma recaída, mas temos que nos manter íntegros para seguir o caminho que a vida nos propõe."

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