Hora das organizações saírem do armário!

De Maurício Sodré, para Tendências - Especial Diversidade

Pela primeira vez na minha vida, e sem medo nenhum, hoje digo que sou um homem gay no meu trabalho, na minha casa e com meus amigos. Só hoje posso dizer que me permito ser plenamente eu em todos os ambientes, mas nem sempre foi assim.

Para uma pessoa LGBTQIA+, a conquista por um trabalho digno começa antes do primeiro dia de trabalho. É ouvir da sua figura paterna na infância que "prefere um filho ladrão a um filho gay", quando você nem sabe o quão "perigoso" é brincar com bonecas em vez de carros, ou quando voltando da balada na rua, escuta de homens mal encarados que "essas bichas têm que apanhar mesmo", e sua única opção é correr para se proteger de apanhar ou morrer.

Digo que superei todos esses obstáculos, mas não me orgulho disso. Na realidade, me entristeço que tenhamos que passar por essas barreiras para alcançar o  reconhecimento ou sucesso. E, mesmo depois disso tudo, conseguir uma vaga não é sinônimo de prosperidade. 

Em uma oportunidade que tive, uma pessoa que ocupava a cadeira de vice-presidente na época me cumprimentou com um forte aperto de mão e, logo após, disse: "Tem que apertar mais forte, rapaz", em  tom de desdém. Era algo que dizia, nas entrelinhas, que não era bem-vindo naquele lugar. Esse gesto foi o que me mobilizou a trazer a pauta sobre diversidade dentro dessa mesma organização e impactar mais de 500 pessoas com uma única ação no Dia Internacional Contra a Homofobia.

Uma ação pontual pode até iniciar discussões, mas não muda realidades! Empresas podem vender-se como inclusivas, mas se a diversidade está somente nas posições iniciais e não também presentes nos cargos de tomada de decisão, essa mesma empresa faz apenas o mínimo para alcançar a fachada de "empresa amiga da diversidade" e se acha no direito de levantar uma bandeira de inclusão (o que podemos considerar como tokenismo). 

Durante os últimos anos, pude me conectar com pessoas que viveram o que passei e têm o mesmo desejo que eu: "hackear" culturas organizacionais para que pessoas LGBTQIA+ não sejam só um número para estar nos relatórios de diversidade, mas que sejam indivíduos reconhecidos por serem profissionais incríveis no que fazem e sejam pagos da forma que merecem.

Mas nem tudo é ruim na minha jornada! Em minha última experiência organizacional, lembro do CEO notar como estava vestido numa festa de fim de ano (eu estava beeeem gay - aqui, uso como sinônimo de incrivelmente lindo) e comentar: "Se alguém um dia ousar fazer piada sobre sua sexualidade, me avisa que chamo os diretores para cair na porrada com essa pessoa". Desconsiderando o álcool envolvido e fazendo a análise do discurso, sabia que ele queria dizer que eu estava num ambiente seguro. Aos poucos, vamos evoluindo!

Não posso (e nem quero) que este relato se baste por si só, uma vez que represento apenas um recorte das várias letras dessa sigla. Quero que esse discurso de (r)existência se una a outras intersecções de orgulho, em que pessoas plurais, que buscam um espaço no mercado de trabalho, possam entregar seus talentos por meio dos seus trabalhos e, também, possam viver em harmonia com as pessoas com quem se conectam. Até porque, como diria RuPaul: "Se você não consegue amar a si mesmo, como diabos vai amar outra pessoa?"

 

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