Minhas credenciais

Por Flávio Dutra

Semana passada me fui para o South Summit, devidamente credenciado pela gentileza do Thiago Ribeiro, atuante CEO do evento. Em papel reciclado, a credencial é inovadora, de acordo com o perfil do encontro que movimenta a cidade neste período. Provavelmente, será uma das últimas que envergarei, eis que a aposentadoria profissional me afastou de grandes e pequenos eventos, inspiradores ou chatíssimos seminários, congressos, simpósios e quetais. 

Minha trajetória profissional e boa parte da vida pessoal poderiam ser contadas por essas credenciais. Outro dia, procurando comprovantes para enfrentar o leão do IR, encontrei uma caixa repleta delas e de crachás e tíquetes de ingressos. Confirmei, então, que é possível fazer uma linha do tempo com tantos identificadores, a começar pela carteirinha em couro de sócio atleta do Grêmio Esportivo Bagé, que defendi com muita garra como integrante do segundo quadro nos anos 1960.

As credenciais dizem muito também sobre minha formação e preferências. Por isso, a relação com o esporte, onde atuei por quase 30 anos, recheou a caixa com carteiras associativas e credenciais: da Associação de Cronistas Esportivos de Porto Alegre/Acepa (matrícula 136), que foi sucedida pela  Associação de Cronistas Esportivos Gaúchos, da entidade nacional dos Cronistas Esportivos, de membro do Conselho Regional de Desportos, mais as credenciais para as copas do México de 1986, que não fui, e a dos EUA, em 94, que fui pela Rádio Gaúcha, além de passes especiais para jogos importantes como Brasil x Argentina, em 1999, pelas Eliminatórias da Copa do Mundo (apareço como integrantes da Rede Globo), convite especial para a inauguração da Arena do Grêmio em 2012, e para as inesquecíveis partidas pela Copa 2014, a que assisti no Beira-Rio: França x Honduras e Alemanha x Argélia. Um dia esses ingressos vão virar tarefa de gincana. 

Fora do esporte, guardo credenciais do Porto Alegre em Cena, do Festival de Cinema de Gramado e de várias idas ao Porto Seco para o Carnaval de Porto Alegre. Tem participações no exterior também, como no Fórum Mundial das Cidades, em Nanjing, em 2008 e na Expo Xangai 2010, que teve a presença da Prefeitura de Porto Alegre; da NAB (a feira mundial de equipamentos para rádio e TV), em Las Vegas, em 1998, do Green Fórum, em Miami, em 2006, além de outras rodagens, sempre à trabalho e sem pretensão de me exibir.

Recolhi e também está no acervo uma identificação de posição na mesa, de um dos encontros na China, a cartela com o nome Flávio escrito em mandarim. Quero crer que a versão seja fidedigna, mas como saber. Outra preciosidade é a minha carteira do DCE da Ufrgs, de 1971, quando cursava o segundo ano de Jornalismo. Não posso deixar de referir a credencial especial que recebi - e não devolvi - para adentrar à Vênus Platinada, o prédio da Globo no Jardim Botânico, no Rio. Fosse eu um Bozó daqui, como aquele personagem do Chico Anísio, sairia por aí exibindo a peça, mas sujeito a ouvir muitos "Globolixo". 

As coberturas eleitorais e a participação em campanhas políticas também contribuíram para o acervo. Aí preciso confessar: tenho um crachá, com foto e tudo, que me identifica como prestador de serviços para a Duda Mendonça Marketing Político. Foi na campanha de 1998 para o governo do Estado, quando convivi aqui com o preposto do Duda, na época, o João Santana, que  mais tarde foi preso e condenado na Operação Lava Jato. Esclareço que sai incólume dessa relação. 

Agora, vale o questionamento: será que a Inteligência Artificial  (sempre ela!) vai alterar também o uso de credenciais e crachás, como os conhecemos hoje,  implantando chips com informações de acesso aos eventos e dispensando até aquelas pulseirinhas compulsórias? Pensei em perguntar ao ChatGPT se isso pode ocorrer e em quanto tempo até se tornar realidade. Mas fiquei receoso de que a resposta fosse afirmativa. Assim, vou continuar guardando minhas identidades para o futuro Memorial Flávio Dutra, porque cada peça tem uma história por trás. Alô, família, reservem  um generoso espaço para isso. 

Autor
Flávio Dutra, porto-alegrense desde 1950, é formado em Comunicação Social pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), com especialização em Jornalismo Empresarial e Comunicação Digital. Em mais de 40 anos de carreira, atuou nos principais jornais e veículos eletrônicos do Rio Grande do Sul e em campanhas políticas. Coordenou coberturas jornalísticas nacionais e internacionais, especialmente na área esportiva, da qual participou por mais de 25 anos. Presidiu a Fundação Cultural Piratini (TVE e FM Cultura), foi secretário de Comunicação do Governo do Estado e da Prefeitura de Porto Alegre, superintendente de Comunicação e Cultura da Assembleia Legislativa do RS e assessor no Senado. Autor dos livros 'Crônicas da Mesa ao Lado', 'A Maldição de Eros e outras histórias', 'Quando eu Fiz 69' e 'Agora Já Posso Revelar', integrou a coletânea 'DezMiolados' e 'Todos Por Um' e foi coautor com Indaiá Dillenburg de 'Dueto - a dois é sempre melhor', de 'Confraria 1523 - uma história de parceria e bom humor' e de 'G.E.Tupi - sonhos de guri e outras histórias de Petrópolis'. E-mail para contato: [email protected]

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